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Pré-Market: Mercado mira economia e vê país desgovernado

25 maio 2018, 8:30 - atualizado em 25 maio 2018, 8:32

Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado

Governo e Petrobras vêm sofrendo pressão dos caminhoneiros para cortar os impostos sobre o diesel e o preço do combustível. A petrolífera já cedeu, congelando o litro 10% mais barato nas refinarias agora por 30 dias, ao passo que as trapalhadas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, no cálculo do impacto nas contas públicas da isenção de um dos tributos adiou para hoje a votação do projeto no Senado, por meio de uma tramitação especial.

Com isso, a paralisação organizada por motoristas autônomos e engrossada por caminhoneiros de frota pode ser suspensa por 15 dias, após um acordo firmado depois de mais de 6 horas de reunião. Mas os quatro dias de protestos instauraram o caos no país, provocando desabastecimento e afetando diversos setores econômicos, além da segurança pública.

Afinal, em um país que depende fortemente de rodovias para transportar bens e produtos, é muito fácil parar o Brasil. Essa fragilidade fica evidente diante da estratégia adotada pelos grevistas. Ao longo dos últimos dias, foram feitos bloqueios em pontos vitais, como a saída de refinarias da Petrobras e a entrada do porto de Santos, dificultando o escoamento de mercadorias.

Tal articulação leva a crer que a paralisação foi determinada por empresas transportadoras, que viram na organização das manifestações a possibilidade de atacar em três frentes: corte de impostos, mudança na política de preços da Petrobras e a intenção de truncar o processo eleitoral.

Há quem diga, com isso, que não se trata de uma greve, mas de um locaute. O termo tem origem em um vocábulo da língua inglesa (“lockout”) e se refere a uma  paralisação de empresas promovida pelos próprios patrões. Trata-se de algo proibido pela legislação brasileira.

Conforme palavras do ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, o movimento dos caminhoneiros “é capitaneado por grandes empresas distribuidoras que querem manter suas margens [de lucro]”. Para ele, sem essas empresas, a então greve não teria tomado as proporções que tomou, em termos de participação, apoio e comando.

O Palácio do Planalto foi avisado sobre a possibilidade de uma paralisação, mas subestimou os efeitos, esquecendo-se que Salvador Allende, no Chile, foi golpeado em 1973 após uma greve de caminhoneiros financiada pela CIA. Também não veio à memória o fato de que quatro dos cinco últimos presidentes brasileiros tentaram o diálogo toda vez que houve ameaça de parar os caminhões.

O problema é que o presidente Michel Temer (e as empresas distribuidoras) sabe(m) que não há força no governo para enfrentar de maneira altiva cerca de 1 milhão de caminhões parados. No Congresso, a base aliada está tentando capitalizar o assunto em ano eleitoral, buscando a adoção de medidas populistas – o que agrava o quadro fiscal já bastante delicado.

E o mercado financeiro está atento a isso. Ainda que o governo consiga cumprir a meta de déficit primário de 2018 – usando, inclusive, recursos do Fundo Soberano para cobrir o rombo – a isenção de impostos sugere a vulnerabilidade a diferentes grupos de interesse, podendo criar mais buracos nas contas públicas neste ano. A promessa de transferir R$ 4,9 bilhões à Petrobras em troca da ampliação do prazo de congelamento do diesel em 15 dias é mais o mais novo, pois o governo não indicou de onde sairá o dinheiro.

Assim, o investidor está cético de que um acordo entre governo e Congresso em reduzir o imposto sobre combustíveis será compensado integralmente com mais receitas via reoneração da folha de pagamentos de empresas, sendo que o setor de transporte de cargas fica de fora. Ao mesmo tempo, a decisão da Petrobras de cortar o preço do diesel reacende a discussão sobre ingerência política.

Do ponto de vista do investidor, a decisão política é difícil, em meio ao impacto da paralisação dos caminhões à sociedade e ao caos social instalado no país. Da mesma forma, a decisão da petrolífera é danosa à imagem da empresa, que abriu mão de um precedente importante, sugerindo que a política de preços pode ser abandonada.

A prática de reajustar diariamente desde julho do ano passado os valores cobrados pela companhia às refinarias, baseada no preço internacional do petróleo e no comportamento do dólar em relação ao real, tem impactado duramente a variação do litro da gasolina e do diesel nas bombas, com o preço vindo mais salgado dos distribuidores.

Não se trata, portanto, apenas do que é recolhido pelos Estados e pela União. É fato que a carga de impostos representa cerca de 45% do preço do gasolina, enquanto no diesel esse porcentual é menor, beirando os 30%. O problema foi o fim do monopólio da Petrobras no setor combinado com o aumento da demanda por combustíveis no país.

A abertura da exploração de petróleo no Brasil às empresas estrangeiras ao mesmo tempo em que a Petrobras vende bilhões em ativos, reduzindo a atividade em áreas estratégicas, fez com que a produção de petróleo da companhia não suprisse o consumo interno. Diante da livre concorrência, a estatal resolveu, então, fixar o preço de seus produtos às oscilações do mercado internacional, de modo a melhorar a “saúde” financeira, o que permitiu reduzir a dívida da companhia – que já foi a maior do mundo.

Tal política de preços só é possível porque a Petrobras ainda detém quase 40% da capacidade de refino do país. Isso significa que a petrolífera concentra nas refinarias a produção de quase todos os combustíveis distribuídos nos postos de venda – o que, aliás, engessa a entrada de novos fornecedores de gasolina e diesel ao longo dos anos, tornando-se um desafio a ser enfrentado, a depender de como a situação atual se desenrolar.

Ou seja, até que se saiba o impacto da paralisação dos caminhoneiros na atividade econômica, que já vem em frangalhos, e nas contas públicas, com um buraco cada vez mais fundo, o mercado doméstico tende a ficar cauteloso. Ainda mais com a proximidade das eleições presidenciais e um quadro bastante incerto, sendo que a situação vivida nos últimos dias mostra como o próximo governo terá um cenário desafiador.

Por ora, os candidatos mais competitivos nas pesquisas de intenção de voto não demonstram apego pelo ajuste fiscal nem convicção pelas reformas. Assim, é natural o mercado pedir mais prêmio de risco nos ativos locais nesta fase inicial do ciclo eleitoral. Ainda mais, em um momento em que os investidores se preparam para o período de férias no Hemisfério Norte.

Este mês é marcado por um dos mais tradicionais jargões do mercado financeiro, que diz para vender em maio e ir embora (“Sell in May and go away”), enxugando a liquidez até o fim do verão. Tal redução de volume começa a ser percebida a partir da próxima segunda-feira, feriado nos Estados Unidos (Memorial Day), indo até o Dia do Trabalho (Labor Day), em setembro.

A proximidade desse período tende a redobrar a postura defensiva nos negócios globais, ainda mais após o presidente norte-americano, Donald Trump, demonstrar sinais de que a guerra comercial não está vencida nem os conflitos geopolíticos na Ásia e no Oriente Médio. Resta saber a percepção do Federal Reserve sobre o impacto desses temas na economia dos EUA.

O presidente do Fed, Jerome Powell, discursa hoje (10h20) em uma conferência na Suécia, onde falará sobre estabilidade financeira. Espera-se que ele dê pistas sobre os próximos passos da taxa de juros norte-americana, após a ata da reunião de maio se mostrar inconclusiva, não confirmando nem negando um total de três (ou quatro) apertos neste ano.

Já agenda de indicadores econômicos do dia segue carregada, porém novamente sem grandes destaques. Por aqui, saem dados sobre a atividade e a confiança no setor de construção civil (às 8h e às 11h). Lá fora, serão conhecidos os pedidos de bens duráveis nos EUA em abril (9h30) e o índice de confiança do consumidor norte-americano em maio (11h).

À espera desses eventos, os índices futuros das bolsas de Nova York oscilam em alta, o que traz um viés positivo às bolsas europeias, após uma sessão mista na Ásia, com a relação entre Coreia do Norte e EUA de volta à pauta, ao mesmo tempo em que as tensões comerciais com a China persistem. O juro projetado pelo título norte-americano de 10 anos (T-note) cai abaixo de 3%, aliviando a pressão nos bônus europeus.

Entre as moedas, o euro é pressionado por preocupações política na Itália e na Espanha, enquanto a libra esterlina sofre com a rejeição da União Europeia (UE) a vários planos de relacionamento do Reino Unido com o bloco após o Brexit. Já a lira turca caminha para a maior perda semanal desde a crise de 2008, com uma desvalorização de quase 40% no ano.

Nas commodities, o barril do petróleo tipo WTI se aproxima da faixa de US$ 70 e do Brent se afasta do nível de US$ 80, com o cartel de países exportadores (Opep) avaliando reduzir as restrições de produção. Os metais básicos ensaiam ganhos, enquanto os preciosos recuam.

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