Pré-Market: Mercado em busca de pistas do Fed
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.
O mercado financeiro inicia a quarta-feira em compasso de espera, com os investidores no aguardo da decisão do Banco Central dos Estados Unidos (Federal Reserve, Fed). A taxa de juros no país deve subir pela segunda vez neste ano, em 0,25 ponto, para o intervalo entre 1,75% e 2%. Mas a dúvida sobre os próximos passos deixa os investidores na defensiva.
Os índices futuros das bolsas de Nova York estão na linha d’água nesta manhã, o que deixa a direção indefinida entre as praças europeias, após uma sessão de perdas na Ásia. O dólar avança em relação às moedas de países desenvolvidos e emergentes, o que enfraquece as commodities, com o petróleo cotado no menor nível em uma semana.
Já o juro projetado pelo título norte-americano de 10 anos (T-note) se sustenta no maior patamar em uma semana, a 2,97%, fortalecido por rumores de que o Fed pretende conceder entrevista coletiva a jornalistas após todas as reuniões, tal qual acontece com o Banco Central Europeu (BCE) e ao invés dos eventos trimestrais que ocorrem atualmente. Tal interação tende a calibrar as expectativas do mercado financeiro sobre o ritmo de aperto monetário.
Ontem, os números da inflação ao consumidor nos EUA (CPI) em maio reacenderam o debate sobre o total de altas na taxa de juros norte-americana neste ano. Apesar de o aumento mensal ter ficado dentro do esperado (+0,2%), chamou atenção o avanço na velocidade mais acentuada em seis anos na comparação anual.
No período, o CPI subiu 2,8%, acelerando-se em relação à alta de 2,5% em abril, no mesmo confronto, e afastando-se ainda mais da meta de 2% perseguida pelo Fed. Excluindo-se itens voláteis, como alimentos e energia, também houve aceleração na leitura anual, para 2,2%, de +2,1% em abril.
No entanto, a medida de inflação ao consumidor preferida pelo Fed é o índice de preços de gastos com consumo (PCE), que segue abaixo da meta, mas que tende a ser pressionado pelas despesas com saúde. Números mais fortes sobre o comportamento dos preços no varejo dos EUA tendem a elevar as apostas de quatro aumentos dos juros no país em 2018.
Além do aperto já ocorrido em março e da alta esperada ao final do encontro do Fed hoje, crescem as chances de um aumento do custo do empréstimo no país em dezembro, que se somaria à elevação esperada em setembro. Ou seja, a cada final de trimestre, a taxa de juros norte-americana pode subir gradualmente, a doses de 0,25 ponto, cada.
Essa aposta ainda não faz parte do plano de voo do Fed. Por isso, ganha importância a entrevista coletiva concedida pelo presidente da autoridade monetária (15h30), Jerome Powell, após o anúncio da decisão sobre os juros nos EUA (15h). Será importante compreender se o cenário de três aumentos até o fim do ano segue como o mais provável.
Se as palavras de “Jay” confirmarem essa percepção, denotando um tom mais suave (“dovish”) no ciclo de alta dos juros, deve haver um alívio no rendimento (yield) dos títulos norte-americanos (Treasuries) e na alta do dólar, com impacto positivo nos ativos emergentes. No caso de uma postura mais dura (“hawkish”), o movimento nos mercados globais tende a ser o contrário.
Antes desses eventos envolvendo o Fed, a agenda econômica norte-americana traz a divulgação do índice de preços ao produtor (PPI) em maio (9h30) e os estoques semanais norte-americanos de petróleo bruto e derivados nos EUA (11h30). No fim do dia, as atenções se voltam para os dados de atividade na indústria e no varejo da China.
No Brasil, o desempenho do comércio varejista também é destaque (9h). As estimativas são de que as vendas do setor tenham crescido pelo segundo mês consecutivo em abril, em +0,5%, mas na comparação anual a sequência de 12 resultados positivos consecutivos deve ser quebrada, com uma queda de 0,5%.
Ainda no calendário doméstico, o Banco Central divulga os dados sobre a entrada e saída de dólares no país na primeira semana de junho (12h30), que podem corroborar (ou não) o entendimento da autoridade monetária de que a recente pressão na moeda norte-americana deve-se à demanda por proteção (hedge) e não por dinheiro em espécie para sair do país.
Aliás, a atuação do BC no mercado doméstico de câmbio tem sido uma “sombra” para os investidores, com os anúncios aleatórios na venda de contratos de swap cambial (dólar futuro) trazendo alguma incerteza aos negócios e evitando especulações. Assim, esse fator surpresa – em vez de informar previamente o tamanho da intervenção – tem sido uma abordagem mais eficiente.
Contudo, ao agir desse modo, o dólar parece estar artificialmente baixo e a tendência é de a moeda norte-americana se valorizar, indo um pouco além de R$ 3,70, assim que encerrarem as intervenções do BC em até US$ 20 bilhões, na sexta-feira. Porém, a autoridade monetária pode voltar a adotar as intervenções mais agressivas, em meio à pressão vinda das eleições.
O mercado doméstico tem mostrado nervosismo com o cenário político do país, em meio às declarações dos candidatos que estão no caminho inverso à agenda de reformas e ao compromisso com o ajuste fiscal. Ao não sustentar essas bandeiras nem pautá-las na corrida presidencial, adiciona-se pressão aos ativos locais, com os investidores cada vez mais céticos sobre o pleito em outubro.
A depender de quem vencer a disputa, o BC pode se ver obrigado a subir a taxa básica de juros (Selic) ainda em 2018, com o cenário eleitoral antecipando o ciclo de alta esperado apenas para o ano que vem. Isso porque as incertezas em relação a quem será o próximo presidente do país provocam mudanças nas expectativas sobre a inflação e o câmbio, gerando a necessidade de ajuste via juros.
Tudo isso em meio ao aumento da aversão ao risco para os países emergentes. Antes, porém, é preciso haver uma visão mais concreta em relação ao cenário de curto prazo, afetado pelas incertezas locais e externas. E o Fed pode começar a clarear esse horizonte hoje, vislumbrando juros mais elevados nos EUA à frente.