Pré-market: Contagem regressiva
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.
O mercado financeiro tende a seguir vulnerável enquanto aguarda pela reunião do Federal Reserve, que começa hoje e termina amanhã. Os investidores esperam por um ritmo mais suave (“dovish”) na estratégia de alta da taxa de juros nos Estados Unidos em 2019, após o último aperto monetário neste ano, mas já temem por uma desaceleração econômica global.
O foco continua nos dados fracos de atividade ao redor do mundo e na inversão da curva de juros norte-americana, com o rendimento (yield) pago pelos títulos mais curtos sendo superior ao retorno dos bônus de mais longo prazo. As tensões comerciais entre EUA e China ainda persistem, enquanto a Europa vivencia um grande imbróglio que deve continuar em 2019.
Com isso, as bolsas de Nova York amargaram duras perdas ontem, ampliando o pior início de dezembro desde 1980, em meio aos temores de que o Fed esteja apressado demais na subida dos juros, enquanto os fundamentos econômicos se deterioram. Esse receio fez o índice Dow Jones ceder mais de 1 mil pontos em apenas dois dias, enquanto o S&P 500 caiu à mínima em 14 meses, minando as esperanças de um rali de Natal e sendo negociados como se já estivessem em um mercado de baixa (bear market).
O desempenho em Nova York ontem contaminou a sessão na Ásia hoje, após certa frustração com o discurso do presidente chinês, Xi Jiping, na comemoração dos 40 anos da reforma e abertura na China. Xangai caiu pouco menos de 1%, Hong Kong cedeu pouco mais que isso e Tóquio recuou quase 2%.
A atenção em Pequim se volta agora para a reunião anual dos líderes políticos no fim deste semana, que irá definir as metas para o próximo ano – entre elas a de crescimento econômico. Nesta manhã, porém, os índices futuros em Wall Street estão no campo positivo, ensaiando uma tímida e pontual recuperação, o que pode atenuar a abertura negativa do pregão europeu.
Nos demais mercados, o barril do petróleo tipo WTI está abaixo de US$ 50, pela primeira vez em mais de um ano, em meio às incertezas quanto à eficácia no corte de produção da commodity promovido pelo cartel de países produtores (Opep). Entre as moedas, o dólar mede forças em relação aos rivais, com um desempenho lateral.
Nesta terça-feira, o destaque fica com a ata da reunião deste mês do Comitê de Política Monetária (Copom), às 8h. No último encontro de 2018, o Banco Central manteve a taxa básica de juros em 6,50% pela sexta vez seguida e a expectativa é de que o documento a ser conhecido hoje confirme a manutenção da Selic neste nível por um período prolongado.
Ainda assim, os investidores esperam encontrar na ata que sai hoje e no relatório trimestral de inflação (RTI), na quinta-feira, pistas do BC sobre em qual momento o juro básico deve voltar a subir. Com base no cenário atual de inflação comportada e atividade fraca, é crescente a previsão do mercado financeiro de manutenção da Selic até o fim de 2019.
No mesmo horário, a FGV divulga dados regionais da inflação ao consumidor (IPC-S) e a última prévia deste mês do IGP-M. Também na agenda doméstica, saem indicadores sobre o mercado de trabalho e a confiança do consumidor (11h). No exterior, serão conhecidos dados do setor imobiliário nos EUA em novembro (11h30) e a confiança do empresário alemão.
No front político, a possibilidade de uma paralisação (shutdown) do governo Trump torna-se cada vez mais real, caso o Congresso norte-americano não apoie o Orçamento para o ano que vem, em especial a verba para a construção de um muro na fronteira com o México. O presidente dos EUA disse que fará o que for necessário para cumprir mais essa promessa de campanha – mesmo que isso signifique em uma pausa temporária das atividades do governo.
Além desse debate, o mercado financeiro também acompanha as mudanças na equipe de governo na Casa Branca, com ex-assessores e advogados enfrentando a Justiça. Tal noticiário tende a enfraquecer Trump, colocando obstáculos para novas medidas econômicas estruturais, como uma reforma tributária.
O que se percebe é que desde as eleições legislativas nos EUA (mid-term elections), no início do mês passado, houve alguma perda de poder por parte do governo Trump e do Partido Republicano, o que pode dificultar a segunda metade do mandato – com vistas à reeleição. Mais ruídos e menos medidas tendem a elevar os riscos para o cenário econômico global.
Esse prognóstico também pode contaminar o desempenho dos ativos de risco, afetando o humor global do mercado financeiro. Por aqui, também estão no radar dos investidores as negociações no Congresso em torno do Orçamento de 2019, cuja votação nesta semana ainda é incerta.
As dificuldades de articulação envolvendo a verba disponível para o próximo governo mostram os desafios que a equipe econômica de Paulo Guedes terá para implementar a agenda de reformas. É bom lembrar que apesar da renovação na Câmara e no Senado ser a maior em décadas, apenas 30% dos eleitos em outubro são “caras novas” no Congresso.
Sem cargos no primeiro escalão do governo, os aliados do Centrão cobram do presidente eleito, Jair Bolsonaro, explicações sobre a movimentação financeira suspeita na conta de um ex-assessor. Fabrício José de Queiroz trabalhou para o senador eleito Flávio Bolsonaro e deve ser ouvido pela Justiça amanhã. Mas desde a acusação, não se sabe onde Queiroz está….