Gasolina

Pré-Market: Apagando incêndio com gasolina

24 maio 2018, 8:00 - atualizado em 24 maio 2018, 11:00

Gasolina

Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado

Os protestos de caminhoneiros entram no quarto dia e o anúncio da Petrobras, ontem à noite, de cortar o preço do diesel em 10% por 15 dias – de modo a dar uma “contribuição para a construção de um ambiente de trégua” – não deve ser suficiente para interromper a paralisação. Da mesma forma, a aprovação na Câmara do projeto que zera o PIS/Cofins sobre o combustível até o fim do ano tampouco deve ser o bastante.

Isso porque o recado de um dos líderes grevistas é claro: não adianta baixar (o preço) agora e aumentar de novo mais à frente. Por isso, a manifestação, que começou na segunda-feira, não tem data para acabar. Duas reuniões de negociação com o governo estão marcadas para hoje, mas as expectativas são reduzidas, mesmo após algum avanço na pauta de reivindicação. Para os caminhoneiros, criou-se um “caos desnecessário no país”.

Com isso, as principais rodovias do país seguem bloqueadas e crescem os problemas de abastecimento. Aeroportos e centro de distribuição já ameaçam paralisar os serviços, diante da falta de combustível (QAV) e de alimentos, ao mesmo tempo em que uma corrida de veículos aos postos esvazia as bombas. A circulação de ônibus também foi afetada e em cinco capitais, incluindo São Paulo, houve redução da frota à disposição dos passageiros, gerando longas filas nos pontos e atrasando a viagem.

Em outro front, os deputados aprovaram ontem à noite, em votação simbólica, o projeto que reonera a folha de pagamentos das empresas de 28 setores da economia, incluindo na proposta o fim de um dos tributos que incidem no diesel até dezembro de 2018, em uma tentativa de conter os protestos de caminhoneiros. A proposta ainda precisa ser analisada pelo Senado para, depois, seguir à sanção presidencial. Por ora, nada se tem falado em relação à gasolina…

O mercado financeiro até que poderia passar ao largo de toda essa nova crise nacional, mas os negócios locais devem abrir pressionados pela decisão independente da Petrobras de abrir mão de uma receita de R$ 350 milhões, ao reduzir, em média, o litro do diesel em R$ 0,23 durante uma quinzena. A petrolífera não pretende prorrogar o prazo.

Segundo o presidente Pedro Parente, o caráter excepcional da decisão, unânime, visa dar espaço ao governo e aos representantes dos caminhoneiros para encontrar uma solução que tenha impacto definitivo nos preços do diesel no Brasil. Para a Petrobras, tal acordo passa, necessariamente, pela discussão da redução da carga tributária incidente sobre o produto – e não tem nada a ver com a política de reajuste diário da companhia nos preços dos combustíveis.

Ontem, nas negociações pós-mercado (after market), as ações ordinárias (ON) da Petrobras negociadas em Nova York caíram quase 10%. No Ibovespa, antes do anúncio, os papéis preferenciais (PN) da companhia tiveram o maior recuo em cerca de uma semana, de quase 6%. E a pressão sobre os ativos da petrolífera tende a continuar hoje, colocando em risco a faixa dos 80 mil pontos da Bolsa brasileira.

Esse mal humor pode ter a contribuição do ambiente externo, onde os índices futuros das bolsas de Nova York exibem ligeiras perdas, impactados pela quedas nas bolsas de Tóquio (-1,1%) e de Xangai (-0,5%). Na Europa, as principais bolsas tentam se sustentar em alta, mas são prejudicadas pela queda das ações de montadoras, após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ordenar uma investigação sobre a importação de veículos ao país.

As preocupações com a questão comercial seguem como pano de fundo nos negócios, juntamente com a situação frágil na Turquia, a incerteza sobre o governo da Itália e as tensões geopolíticas no Oriente Médio e na Ásia. Por ora, o alento vem da estabilização do juro projetado pelo título norte-americano de 10 anos (T-note) em 3%, o que também abre espaço para uma recuperação das moedas em relação ao dólar. Já o petróleo ensaia perdas, mas segue acima da faixa de US$ 70.

O investidor também digere a opção do Federal Reserve de ficar em cima do muro ao final da reunião de maio. A ata do encontro mostrou que a autoridade monetária evitou traçar o plano de voo para o horizonte à frente, esquivando-se em confirmar (ou negar) o cenário de três (ou quatro) altas na taxa de juros norte-americana neste ano.

Ou seja, no embate entre pombos (“doves”) e falcões (“hawks”), o Fed mostrou-se um legítimo tucano. Ao mesmo tempo em que apresentou um tom menos suave (“dovish”), ao confirmar a previsão de que o custo do empréstimo nos EUA subirá mais uma vez, em junho, a autoridade monetária evitou adotar um viés duro (“hawkish”), ao observar que a inflação não deve ficar acima da meta por muito tempo.

A maioria dos integrantes acha que é “prematuro” afirmar que os preços ao consumidor seguirão acima de 2% por muito tempo, após alcançarem esse patamar em março pela primeira vez em um ano. Já “alguns” membros estão cada vez mais convencidos de que a autoridade monetária pode ficar atrás da curva da inflação.

Com isso, o Fed resolveu deixar em aberto os próximos passos até dezembro. O que ficou faltando no documento foi alguma clareza tanto em relação ao aquecimento da atividade econômica, em meio às condições de pleno emprego nos EUA, quanto ao nível de tolerância dos preços se a inflação permanecer acima da faixa de 2%.

Para o investidor, foi o suficiente para reforçar a aposta de apenas mais um aumento em 2018, além da alta já contratada no mês que vem. O problema é que a Casa Branca está renegociando acordos comerciais em busca de vantagens competitivas, o que tende a diminuir o déficit da balança, estimulando a produção interna e encarecendo produtos importados.

Isso sem falar na elevação dos gastos públicos e no corte de impostos, promovido pelo governo Trump desde o fim do ano passado. Talvez até por isso, o Fed tenha se esquivado em dizer o que fará no segundo semestre, à espera de mais evidências para, então, confirmar o total de altas em 2018, uma vez que o nível neutro dos juros parece cada vez mais próximo. Mas essa questão só deve entrar na pauta após as férias de verão (no Hemisfério Norte).

A agenda econômica desta quinta-feira está carregada, porém sem grandes destaques. No Brasil, saem dados regionais da inflação ao consumidor (IPC-S) na prévia deste mês e a confiança do setor de comércio  em maio, ambos às 8h, além da nota do Banco Central sobre o setor externo (10h30), com números sobre o investimento estrangeiro no país, entre outros.

No exterior, o calendário norte-americano traz os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos nos EUA (9h30) e as vendas de imóveis residenciais usados em abril (11h). Na zona do euro, destaque para a ata da reunião de maio do Banco Central Europeu (BCE), às 8h30, fechando a semana de publicações oficiais dos BCs sobre as decisões de juros neste mês.

Editora-chefe
Olívia Bulla é editora-chefe do Money Times, jornalista especializada em Economia e Mercado Financeiro, com mais de 15 anos de experiência. Tem passagem pelos principais veículos nacionais de cobertura de notícias em tempo real, como Agência Estado e Valor Econômico. Mestre em Comunicação e doutoranda em Economia Política Mundial, com fluência em inglês, espanhol e conhecimento avançado em mandarim.
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Olívia Bulla é editora-chefe do Money Times, jornalista especializada em Economia e Mercado Financeiro, com mais de 15 anos de experiência. Tem passagem pelos principais veículos nacionais de cobertura de notícias em tempo real, como Agência Estado e Valor Econômico. Mestre em Comunicação e doutoranda em Economia Política Mundial, com fluência em inglês, espanhol e conhecimento avançado em mandarim.
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