Pré-Maket: Mercado testa fôlego
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.
Os dados de emprego nos Estados Unidos (11h30) não devem alterar a postura mais suave (“dovish”) dos investidores desde a tarde de quarta-feira, diante da falta de perspectiva de alta nos juros norte-americanos em algum momento neste ano. Mas os sinais que apontam para um aumento na confiança do crescimento norte-americano não têm sido corroborados pelos indicadores econômicos do país, o que aumenta a importância do payroll.
Por enquanto, o cenário externo volta a ficar favorável aos ativos de risco, com o Brasil entre os prediletos. Ainda mais agora que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, foi conduzido à relatoria da Operação Lava Jato e Rodrigo Maia foi escolhido para seguir à frente da Câmara dos Deputados, um dia após Eunício Oliveira assumir o Senado. O ambiente em Brasília não poderia ser mais pró-mercado.
A leitura é de que qualquer um dos demais ministros da Segunda Turma – Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli ou Gilmar Mendes – tenderia para algum lado da balança na investigação, sendo mais favorável à atual oposição ou ao governo. Celso de Mello era uma incógnita, mas a escolha, por sorteio, de Fachin, recém-chegado à turma, indica que a Lava Jato seguirá seu curso, sem interferências políticas.
Já no Congresso, as vitórias de Botafogo e Índio – conforme a planilha da Odebrecht se referia ao deputado e ao senador – abre espaço para mais um período de harmonia entre o governo Temer e o Legislativo. Com a maioria nas duas Casas, a pauta de votações devem se concentrar nos temas de interesse do Palácio do Planalto, dando prioridade às reformas da Previdência e a trabalhista, tidas como essenciais ao ajuste fiscal proposto.
O novo presidente do Senado, aliás, tem como agenda prioritária tocar o projeto de terceirização da mão de obra, que já está na Comissão de Constituição e Justiça. A proposta é um dos três pilares para a reforma trabalhista, que vai tratar também da regulamentação do trabalho intermitente e da prevalência de acordos patronais sobre a legislação. os temas devem entrar na pauta já na semana que vem.
Diante desse cenário normal em Brasília, o país se destaca, em meio à perspectiva de queda dos juros e da inflação, e de retomada da atividade e dos investimentos. Ainda mais porque o presidente dos EUA, Donald Trump, não tem voltado sua artilharia verborrágica para terra brasilis, mirado em grandes competidores de manufaturados, como México e China.
Isso explica a entrada de capital estrangeiro no Brasil logo no início de 2017. Na Bovespa, houve o ingresso de mais de R$ 6 bilhões em recursos externos apenas em janeiro – o maior desde março do ano passado – enquanto o dólar está em queda livre, rumo à faixa de R$ 3,10 (ou menos). Ontem, a moeda dos EUA fechou no menor patamar desde outubro.
Mas esse fluxo de dinheiro tem tirado mais proveito dos rendimentos dos ativos financeiros nacionais do que demonstrado interesse pelo investimento produtivo no país – o que, de fato, faz a roda da economia girar. Assim, qualquer sinal de instabilidade doméstica ou de aumento da incerteza no cenário externo é capaz de reverter esse movimento.
Para que esse gatilho venha do ambiente internacional, é preciso ter maior clareza sobre a política econômica de Trump que, por enquanto tem se focado mais nas polêmicas medidas protecionistas e contra imigrantes do que no viés fiscal expansionista. Foi por causa da dúvida sobre qual rumo a ser tomado que o Federal Reserve resolveu esperar para ver.
Diante das promessas de cortes de impostos e de investimentos em infraestrutura, os investidores alimentavam a expectativa de que o Fed poderia adotar um discurso mais duro (“hawkish”), em relação ao processo de alta dos juros norte-americanos, como forma de “defesa”. Porém, após a reunião deste mês, o Banco Central dos EUA preferiu não agir nem mesmo se manifestar sobre o timing das próximas elevações.
Essa percepção esvazia um pouco a expectativa em relação ao relatório oficial do mercado de trabalho nos EUA. A previsão é de geração de 175 mil vagas no mês passado, com a taxa de desemprego seguindo em 4,7% e o ganho médio por hora subindo 0,3%.
Qualquer número mais fraco deve manter o dólar rondando o nível de R$ 3,10, o que eleva a ansiedade em relação a uma atuação do BC local, que ainda não anunciou qualquer intervenção no câmbio. Por enquanto, no exterior, o dólar ronda a estabilidade e mede forças com os rivais, sem uma direção definida ante as moedas emergentes e desenvolvidas.
Quem não esperou para ver foi o Banco Central da China. Na volta do Ano Novo Lunar, o chamado PBoC apertou a política monetária, aumentando a taxa que atua na cobrança de operações no mercado aberto e em fundos (taxa repo, ou de recompra reversa) para empréstimos de sete, 14 e 28 dias. Cada uma subiu 0,1 ponto porcentual, sendo que desde outubro de 2015 a taxa repo de sete dias era mantida em 2,25%.
A medida na China visa reduzir a alavancagem do sistema financeiro, controle os ganhos de preços e dando suporte à taxa de câmbio local. Com o fim das festividades e em reação ao anúncio, a Bolsa de Xangai caiu 0,60%, contaminando a sessão na Ásia. Apenas Tóquio oscilou em alta (+0,02%). Entre as commodities, o petróleo sobe, rumo à terceira semana de alta e ao alvo de US$ 60 o barril estimado pelo cartel da Opep.
As principais bolsas europeias ensaiam ganhos na abertura, mas são pressionadas pelos índices futuros em Nova York. Wall Street estava na linha d’água logo cedo, com os investidores ainda tentando compreender o impacto da nova liderança dos EUA sobre o crescimento econômico global e em busca de pistas sobre o fortalecimento da economia norte-americana em meio à temporada de balanços.
Ainda na agenda econômica norte-americana, saem os índices PMI e ISM de atividade no setor de serviços em janeiro, além das encomendas de bens duráveis em dezembro. Dados de atividade nos setores da indústria, do comércio e dos serviços da zona do euro serão conhecidos logo cedo.
No Brasil, o calendário está esvaziado. Merece atenção a decisão do presidente Michel Temer de criar dois novos ministérios, o da Secretária-Geral da Presidência, que dá foro privilegiado ao investigado na Lava Jato Moreira Franco (o Angorá), e o dos Direitos Humanos.
Com a medida, Temer ficou com apenas quatro ministérios a menos do que a ex-presidente Dilma Rousseff. A promessa era de cortar 10 ministérios, o que ajudaria no corte dos gastos. Mas, ao que tudo indica, a máquina pública continua inchada, dando proteção a envolvidos em esquema de corrupção