Arena do Pavini

Porto Seguro: exterior é ameaça para novo presidente

17 ago 2018, 13:27 - atualizado em 17 ago 2018, 13:27

Por Angelo Pavini, da Arena do Pavini – O cenário externo tende a piorar nos próximos anos, o que complicará a vida do presidente que será eleito em outubro, obrigando-o a acelerar os ajustes das contas públicas. O alerta é do economista-chefe da Porto Seguro Investimentos, José Pena. Para ele, o próximo presidente terá um cenário externo bem menos favorável que o dos últimos três anos, com a economia mundial crescendo menos sob o impacto da queda da confiança, do comércio global mais fraco pela guerra comercial entre EUA e China e das condições financeiras após a redução da liquidez internacional.

Os juros mais altos nos Estados Unidos e na Europa e o fim dos subsídios aos bancos dessas regiões deixarão menos recursos disponíveis para financiar déficits externos ou fiscais de países desajustados, o que aumentará a pressão sobre o novo governo brasileiro. “Se o mercado de trabalho aquecido nos EUA pressionar a inflação, podemos ter uma subida mais forte dos juros e uma crise muito maior para os emergentes”, alerta Pena. “Já se o cenário externo continuar calmo, haverá mais tempo para o futuro presidente fazer os ajustes.”

O risco externo torna ainda mais importante a eleição presidencial, diz Izak Benaderet, diretor de Investimentos da Porto. “O momento é difícil, há grandes desafios para a economia e o país precisa das reformas para seguir a rota do crescimento e do juro baixo”, diz. Hoje, porém, não há uma definição de quer ganhará a eleição, com muitas candidaturas pulverizadas e as chances de um nome com menos de 20% dos votos ir para o segundo turno é grande.

E isso cria uma insegurança muito maior entre investidores, empresários e consumidores. “Havia uma visão de que quem quer que ganhasse seria obrigado a fazer o ajuste fiscal, o que mantinha os mercados calmos”, diz Benaderet. A situação mudou com a greve dos caminhoneiros, ao mostrar o apoio da população à intervenção do Estado na economia e aos subsídios. As declarações de candidatos e políticos defendendo a saída do então presidente da Petrobras, Pedro Parente, também aumentaram o risco de vitória de um candidato populista e de um retrocesso nos ajustes.

Estratégia de investimento

Mesmo com essa indefinição do cenário local e a redução das aplicações mais arriscadas de gestores e investidores, Benaderet diz que há oportunidades em títulos de renda fixa do governo corrigidos pela inflação, as NTN-Bs, que estariam pagando juros reais elevados. “Diante das perspectivas de que venha algum ajuste das contas públicas, os papéis parecem relativamente bastante atrativos”, diz. “Achamos que há uma assimetria das taxas atuais diante dos riscos que temos pela frente”, avalia.

O prazo dos papéis, que podem chegar até 2045, vai depender da confiança do investidor no futuro do país. “Se o investidor estiver confortável com as perspectivas de reformas, pode optar por uma NTN-B mais longa, 2035”, diz. Já se o conforto não for tão grande, papéis mais curtos, para 2020, 2023 podem ser melhores, avalia Benaderet.

Apostas baixas reduzem risco da bolsa

Na bolsa, o investidor pode encontrar oportunidades mesmo com as incertezas políticas, diz Marcelo Faria, responsável pela área de renda variável da Porto Seguro Investimentos. O fato de os investidores não estarem muito otimistas é até um fator positivo para quem quer diversificar. “É preciso acompanhar também o posicionamento técnico do mercado, ver quão preparados estão os portfólios dos investidores para os cenários possíveis”, diz.

Segundo ele, seja quem for o eleito, o mercado já estará relativamente preparado. “Não vai ser uma surpresa pois estamos no ápice da incerteza”, explica. Isso significa que são menores as chances de o mercado sofrer uma forte reversão, um “cisne negro”, como o matemático Nassin Taleb define os eventos inesperados que mudam drasticamente os preços.

Capacidade ociosa alta e baixos investimentos

Ajuda a reduzir o risco também a fraqueza da economia brasileira, com capacidade ociosa alta e falta de confiança de empresários e investidores. “Ninguém está investindo muito, tanto empresas quando consumidores, e as crises de mercado vêm quando todos estão otimistas, investindo muito”, diz.

Portfólios abaixo da média

A cautela dos investidores aparece nas carteiras dos investidores em ações e gestores de recursos, que estão abaixo da média histórica depois das fortes perdas de maio e junho, diz Faria. Isso vale tanto para pessoas físicas quanto para institucionais, que respondem por mais de 40% do volume negociado da bolsa brasileira.

Os estrangeiros, que representam metade dos negócios da bolsa, também estão investindo menos. Faria estima que os investimentos estrangeiros em países emergentes estão 2% abaixo da média histórica, de US$ 18 trilhões, o que representaria US$ 360 bilhões a menos. “E pelo que tenho mapeado, o investimento no Brasil também está abaixo da média histórica”, diz.

Relação preço e lucro abaixo do histórico

O valor das empresas em relação ao seu potencial de ganhos também está abaixo da média histórica, avalia Faria. Segundo ele, o preço das ações do Índice Bovespa equivale hoje a 10 vezes o lucro projetado para este ano, para uma média histórica de 11 vezes. Ou seja, em 10 anos, a empresa ganharia em lucros o valor pago pela ação. “E a previsão é de um crescimento de 50% no lucro das empresas este ano em relação ao ano passado, com mais crescimento previsto para o ano que vem também”, diz.

Bolsa no nível mais saudável da história

O lucro é reflexo dos ajustes que as empresas brasileiras fizeram durante a pior recessão da história, observa Faria. “Elas cortaram custos, melhoraram processos, mudaram produtos, buscaram mercados, ajudaram suas dívidas”, diz. “Quem possuía dívida alta já foi para recuperação judicial”, afirma. Para ele, a bolsa brasileira está no nível mais saudável da história. “Também o Índice Bovespa mudou e sua fórmula e reflete empresas de melhor qualidade, ao escolher não só as companhias mais negociadas, mas também as de maior valor de mercado”, explica.

O que falta para as empresas, afirma Faria, é receita. “Falta o consumidor voltar a comprar, o que aumentaria as vendas e o lucro exponencialmente”, diz.

Assim, sem um cenário de excesso de otimismo que poderia provocar uma surpresa negativa muito grande, com as empresas ajustadas, e ainda com um juro básico baixo, é possível montar uma carteira de ações com bons balanços e potencial e menor risco, afirma Faria.

As empresas mais seguras ou com maior potencial

Entre os tipos de empresas com maior potencial, Faria cita as que têm alguma ligação com a taxa de juros longa, que estaria muito alta e que, ao cair, beneficiará o setor. É o caso dos shopping centers, que ganhariam com juros mais baixos para o crédito. Os bancos também são um setor que consegue se sair bem mesmo durante crises. E há empresas líderes de mercado, que têm poder de barganha com fornecedores e consumidores e podem se proteger de um aumento da inflação.

O setor de construção voltado para a baixa renda também deve continuar crescendo. “Mas estamos fugindo de setores ligados à atividade econômica em geral e buscando temas específicos”, diz. Ele dá o exemplo do setor de transportes, que se beneficiará do bom desempenho do agronegócio, que costuma ir bem mesmo quando os demais setores vão mal.

Outro tema específico é o da demografia, do envelhecimento da população, que deve aumentar a procura por exames e diagnósticos. “Mesmo com toda a incerteza da eleição, os riscos, ter uma carteira de ações de qualidade faz sentido”, diz.

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