Opinião

Por que não somos ricos? Complexidade Econômica para entender a Riqueza e Pobreza das Nações de forma simples

30 mar 2019, 11:02 - atualizado em 29 mar 2019, 19:03

Paulo Gala é economista e diretor geral da Fator Administração de Recursos – Veja o seu Blog

O processo de desenvolvimento sempre intrigou os economistas. Pensadores do passado – como o italiano Antonio Serra, de Nápoles, no início do século XVII; John Cary, de Bristol, no final do século XVII; ou Duarte Ribeiro de Macedo, de Portugal, na mesma época – indagavam sobre o que fazer para acelerar o progresso do reino e alcançar riqueza para todos.

Muito antes de Adam Smith ter escrito o livro que se tornou clássico, esses economistas já observavam a questão da riqueza e da pobreza das nações, que perdura até hoje e continua inflamando corações e mentes. Desde os clássicos da economia, como David Ricardo, Karl Marx e Adam Smith, passando pelos antigos economistas do desenvolvimento da tradição  anglo-saxã, como Ragnar Nurkse, Gunnar Myrdal e Rosestein-Rodan, ou da tradição latino-americana, como Raúl Prebisch e Celso Furtado, ou ainda pelo pensamento mais recente de economistas institucionalistas, como Douglass North, e de economistas mais neoclássicos, como Dani Rodrik e Daron Acemoglu – o que, afinal explica a pobreza e a riqueza das nações? O que explica o desenvolvimento econômico?

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Meu livro “Complexidade econômica” procura responder essa questão a partir de duas perspectivas: (i) a antiga tradição estruturalista em economia, para a qual a chave para a riqueza das nações estava na especialização produtiva em atividades econômicas com retornos crescentes de escala e (ii) a moderna concepção da complexidade econômica, que parte de um enfoque parecido com o dos estruturalistas, mas usa muito a abordagem empírica, analisando enormes bancos de dados de Big Data e redes para o comércio internacional.

A primeira perspectiva conta com grandes nomes na história do pensamento econômico, como L. C. Bresser-Pereira no Brasil. Seus trabalhos mais recentes, sobre a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, combinam de forma inovadora antigos conceitos estruturalistas e uma nova análise macroeconômica aplicada a questões de longo prazo. Na abordagem da complexidade, os dois nomes que influenciam este livro são o físico Cesar Hidalgo e o economista Ricardo Hausmann, criadores do Atlas da complexidade econômica a partir de bancos de dados de Big Data.

O tema da complexidade ganhou destaque em economia com os trabalhos de Brian Arthur na liderança do Instituto Santa Fé, no Novo México, no final da década de 1980. Com aplicações diversas, a perspectiva de sistemas dinâmicos complexos tem sido levada a diversas áreas de pesquisa em economia e outras ciências, como teoria dos jogos, ciência politica, biologia e física.

Em economia, as primeiras aplicações foram modelagens de funcionamento de mercados financeiros, regras de tomada de decisão de agentes individuais em variados contextos e estudos sobre path dependence e dinâmicas que dependem de sua trajetória inicial, graças à presença de retornos crescentes, como veremos adiante. O mais recente Atlas da complexidade econômica, de 2011, combina avanços dessa discussão de complexidade com a tecnologia de Big Data para criar um dos mais modernos e relevantes banco de dados da atualidade em economia.

O termo Big Data vem sendo usado em diversos contextos para descrever a crescente explosão de dados disponíveis no universo digital. O Big Data, em sua raiz, trata grande volume de dados com grande velocidade. Em economia, talvez o primeiro e mais relevante banco de dados de Big Data tenha sido o Atlas da complexidade econômica (Hausmann e Hidalgo, et al., 2011). A tecnologia desenvolvida em conjunto pelo MIT Media Lab e a Kennedy School, de Harvard, a partir técnicas de ciência da computação, redes e complexidade, permite o rápido acesso a milhares de dados do comércio internacional desde a década de 1960. Se levarmos em conta as relações bilaterais entre países para qualquer ano e qualquer produto desde 1963, o volume de  informações potencialmente disponível chega ao impressionante número de 2 bilhões. Trata-se da “população total” do comércio mundial, com mais de 4 mil produtos e 120 países ao longo de cinquenta anos.

Nesse banco de dados podemos ver rapidamente, por exemplo, que em 1962 o café correspondia a 48,63% das exportações brasileiras. Ou ainda que, em 1975, 12,47% de nossas exportações eram minério de ferro e concentrados. Na Coreia do Sul de 1970, 3,17% das exportações eram peixes. Em 2012, 8,37% das exportações coreanas eram automóveis, e 12,11%, microcircuitos eletrônicos. E assim por diante. Podemos observar detalhes de qualquer país em qualquer ano, rapidamente. Será que esses dados dizem algo sobre a trajetória de crescimento e desenvolvimento desses países?

O livro usa esses dados de comércio internacional para investigar as causas do desenvolvimento econômico ou da riqueza das nações. Ele se divide em quatro partes. O primeiro bloco percorre um caminho que parte do insight original de Adam Smith, de que a divisão do trabalho está na origem da riqueza das nações, passa pelas contribuições seminais dos antigos economistas do desenvolvimento sobre o tema e desemboca na atual contribuição de R. Hausmann e C. Hidalgo, que trabalham com a complexidade econômica.

Essa primeira parte trata principalmente de questões teóricas e de definições envolvidas nos debates sobre desenvolvimento, atividades com retornos crescentes de escala e complexidade econômica. A segunda parte traz experiências de desenvolvimento em países hoje considerados ricos, com destaque para a Europa e os Estados Unidos. A terceira parte trata do mundo emergente, enfatizando casos do Leste Asiático e da América Latina. Os estudos de caso de países e regiões ilustram o potencial da abordagem que apresentamos, sem pretender, obviamente, esgotar a discussão sobre a história dos (des)caminhos que levaram esses países ao sucesso ou ao fracasso.

A quarta parte do livro destaca possíveis caminhos para se construir complexidade, a fim de atingir o desenvolvimento econômico. Trata, portanto, da questão da política econômica em mais detalhes. Todos os países hoje ricos são complexos do ponto de vista econômico. Em algum momento de sua história foram capazes de dar o salto de produtos simples para produtos complexos, como veremos ao longo do texto. Não existe uma receita pronta que indique ações para se construir complexidade e atingir o desenvolvimento. Essa última parte do livro se concentra nas perspectivas relevantes para se prosseguir nessa análise, perspectivas que são abordadas de maneira menos estruturada ao longo do texto.

O livro se dirige a iniciantes em estudos de economia, leigos e também economistas que se interessam pelo assunto. O texto tem um tom informal, para incentivar o leitor a pesquisar mais sobre os temas tratados, estimular o debate e tornar a leitura mais interessante. As análises e discussões são simples, diretas e atuais, mas com forte embasamento teórico e empírico, além de trazerem recomendações de leitura adicional. O objetivo é motivar o leitor a seguir explorando os conceitos e ideais apresentados a partir da discussão de temas do dia a dia. Além de tratar de debates correntes da economia brasileira e mundial, o livro aborda temas teóricos de maneira aplicada, buscando sempre a conexão entre teoria e prática.

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