Por que as ações brasileiras estão ‘baratas’; entenda
Circula nas mesas de operação do mercado financeiro um e-mail enviado a clientes por um gestor de um tradicional banco estrangeiro que busca “provar por A mais B” porque as ações brasileiras estão baratas. Apesar do sigilo da fonte seguir em anonimato, o conteúdo da mensagem não o é e foi obtido pelo Money Times.
Inicialmente, o diretor-gerente confessa ser uma “voz em contrário” sobre o mercado de ações local. “Uma mistura de sentimento puro, mas também apoiado por alguns dados”, explica.
Para ele, a maior parte, “senão todo o mau desempenho da bolsa brasileira”, deve-se à extrema volatilidade da política monetária. Portanto, o fim das perdas em renda fixa e o início do ciclo de cortes da taxa Selic será definitivamente positivo para a renda variável.
Renda fixa X renda variável
Inicialmente, houve a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de empurrar as taxas de juros reais para níveis profundamente negativos. Isso ocorreu quando o juro básico brasileiro atingiu o piso histórico de 2%, em 2020, e seguiu nesse nível até o início de 2021.
Com isso, o desespero para reagir à “repressão financeira” em meio aos crescentes sinais de piora fiscal e institucional, ainda durante a gestão Bolsonaro, levou os investidores a correrem riscos desnecessários. E isso inflacionou o preço das ações.
Para o gestor, os investidores elevaram artificialmente o valor das ações. “A consequência disso foi uma entrada massiva para investir em fundos de ações e uma avaliação insana sobre algumas empresas com um modelo de negócios fraco”, explica.
Depois, ao empurrar as taxas de juros reais de volta ao nível mais alto em duas décadas, ou seja, aos atuais 13,75% – vindo do nível mais baixo em três décadas – a política monetária simplesmente “implodiu” o mercado acionário. Na ocasião, as ações já vinham experimentando uma fuga maciça de recursos e contaminando bons nomes.
“Ou seja, o resgate e o rodízio de ações para renda fixa tem impactado negativamente bons negócios devido ao ‘impacto de carteira e venda forçada’”, avalia. Portanto, as taxas de juros reais, em torno de 6% atualmente, são um desequilíbrio temporário explicado principalmente por essas vendas forçadas.
Para ele, se o Brasil melhorar, as taxas reais cairão para 4%-5%. Porém, se o Brasil piorar muito – quer dizer, entrar em colapso – as taxas reais devem ser profundamente negativas – como na Argentina.
Quais são as ações baratas?
Ainda segundo o diretor-gerente desse banco estrangeiro, a melhor definição do valor de uma ação é seu fluxo de caixa futuro descontado por uma taxa livre de risco. No Brasil, os títulos públicos indexados à inflação (NTN-Bs) mais longos são normalmente a melhor taxa para definir o valor presente (PV) de uma ação.
“No entanto, as NTN-Bs superaram em excelência o desempenho (outperformed) de forma massiva, principalmente os vencimentos mais longos, enquanto o Ibovespa (IBOV), não”.
Segundo o profissional, isso se dá porque cerca de 90% do desempenho negativo do Ibovespa no acumulado do ano deve-se ao impacto dos preços do minério de ferro e do petróleo nas ações da Vale (VALE3), as siderúrgicas e petrolíferas.
“Eu diria que ambas as commodities possivelmente atingiram o fundo do poço”, diz. Já o segundo setor de maior peso no Ibovespa – dos bancos – vem se recuperando rapidamente.
“O setor reportou números melhores, com alguns indicadores antecedentes apontando para uma recuperação. Os novos empréstimos de crédito têm melhor qualidade e o início do ciclo de flexibilização dos juros básicos será positivo aos bancos”, avalia.
Além disso, o restante da bolsa contempla “bons negócios e bons nomes” que estão contaminados por alguns “rivais tóxicos” e pelo ambiente macroeconômico que, aliás, “está claramente se estabilizando”. É por isso, então, que não são só as ações que estão baratas, mas a bolsa brasileira como um todo.