Por que a Argentina enfrenta uma constante crise da dívida
Julian Díaz estava prestes a expandir sua rede de restaurantes em Buenos Aires, com planos de abrir duas unidades além das três já apreciadas por comensais gourmet sob seu comando.
No entanto, uma recessão – mais uma – interrompeu seu projeto. O empresário de 37 anos teve de despedir funcionários e colocou seus planos na geladeira até o fim do ano.
“A parte mais difícil é não saber o que vem a seguir, não ser capaz de pensar em como você vai se desenvolver”, diz Díaz. “No nível comercial, atinge seus resultados. Mas, no nível pessoal, apenas dá náuseas.”
É um território já conhecido dos argentinos: crise econômica desencadeada por crescentes déficits e dívidas, além de instabilidade política com fortes oscilações entre governos de direita e de esquerda.
Nesse clima, como Díaz afirma, é difícil prever o futuro – um motivo pelo qual o país tem uma baixa pontuação no índice de investimentos da Bloomberg como impulsionador do desenvolvimento.
O presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, assume o comando em 10 de dezembro e promete ressuscitar a economia. Ainda assim, Fernández enfrenta demandas da extrema esquerda de sua ampla coalizão para aumentar os gastos sociais, enquanto investidores querem que o novo presidente priorize as negociações da dívida.
Há uma ampla preocupação no mercado de que Fernández e sua vice, a ex-presidente Cristina Kirchner, reverterão a postura pró-mercado de Macri.
A atual recessão começou no ano passado. Embora uma forte seca e baixas nos mercados emergentes tenham contribuído, a causa principal foi um déficit orçamentário que os investidores hesitaram em financiar, enquanto o governo do presidente Mauricio Macri perdia credibilidade.
A segunda maior economia da América do Sul deverá encolher pelo segundo ano em 2019 e também em 2020. A inflação está acima de 50%, e o peso a caminho de registrar o pior desempenho dos mercados emergentes pelo quarto ano consecutivo.
Os problemas econômicos da Argentina começaram muito antes de Macri chegar ao poder. Desde 1950, a Argentina passou 33% do período em recessão, só perdendo para a República Democrática do Congo, segundo o Banco Mundial.
Foi desenvolvido um ciclo no qual os líderes gastam mais do que o governo arrecada em receita tributária, forçando-os a emitir títulos de dívida que os investidores acabam vendendo. Esse efeito dominó geralmente termina com inflação alta, recessão e, às vezes, uma crise da dívida.
Em 2001, a Argentina deixou de pagar US$ 95 bilhões em títulos soberanos, um recorde na época. Os mercados de títulos parecem esperar outra crise em breve.
Politicamente, o país oscilou entre governos pró-mercado e os mais populistas. Isso trouxe reversões de políticas que tornam muito difícil o investimento a longo prazo. As leis tributárias foram modificadas 80 vezes desde 1988, enquanto as regras fiscais foram alteradas 14 vezes. Houve 61 presidentes de bancos centrais nos 84 anos da instituição.
O resultado é uma economia que não corresponde ao país, com vastos recursos naturais e população com alto nível de escolaridade. Macri é apenas o mais recente líder a naufragar, depois de prometer resgatar a Argentina. Agora, Fernández enfrenta o mesmo assustador desafio.