Setor Elétrico

Por Covid-19, consulta a índios sobre linhão em Roraima isolará tradutor por 14 dias

24 set 2020, 16:46 - atualizado em 24 set 2020, 16:46
Energia Transmissão Elétrica
A tradução será feita pelos próprios índios com apoio de dois professores que já atuaram antes com o idioma (Imagem: Reuters/Amr Abdallah Dalsh)

Para retomar o licenciamento ambiental de um importante linhão de transmissão de energia em Roraima, o governo do presidente Jair Bolsonaro comprometeu-se junto aos índios Waimiri-Atroari a seguir orientações de prevenção contra o novo coronavírus sugeridas pela etnia, que terá parte de suas terras cruzadas pelo empreendimento.

Entre essas medidas preventivas, devido à grande preocupação dos indígenas com a pandemia, está a exigência de isolamento prévio e testagem dos profissionais que adentrarão o território dos nativos, disse à Reuters a Fundação Nacional do Índio (Funai).

Licitada ainda em 2011, a linha de transmissão está sob responsabilidade de um consórcio entre a estatal Eletronorte, da Eletrobras (ELET3), e a privada Alupar (ALUP3), mas as empresas até hoje não obtiveram a licença de instalação, necessária para iniciar as obras.

No momento, a emissão da licença aguarda a conclusão do chamado “componente indígena”, a cargo da Funai, etapa que envolve consulta aos nativos sobre o projeto e ficou paralisada por meses devido à disseminação da Covid-19, uma vez que os índios optaram por se isolar totalmente como forma de proteção.

Agora, houve acordo para retomada a partir do próximo mês, o que envolverá o envio pela Funai de profissionais ao território dos Waimiri-Atroari com o objetivo de traduzir para o idioma deles documentos sobre o empreendimento de energia.

A tradução será feita pelos próprios índios com apoio de dois professores que já atuaram antes com o idioma, segundo o órgão estatal.

“Os professores irão seguir o protocolo Waimiri-Atroari, conforme solicitado pela etnia, o que inclui quarentena de 14 dias e testagem antes da entrada em Terra Indígena”, afirmou a Funai em nota à Reuters.

“Dessa forma, pode se garantir que os trabalhos de tradução sejam realizados com toda segurança, respeitando as medidas de saúde necessárias”, acrescentou.

A aceitação pela Funai das exigências dos índios vem após uma carta deste mês dos Waimiri-Atroari em que eles mostraram temer o vírus e disseram que contatos anteriores entre nativos e o “desenvolvimento” não geraram os benefícios a eles prometidos.

“Somos extremamente vulneráveis às doenças dos Kaminja”, afirmam, em referência aos não-índios. “TEMOS MUITA PREOCUPAÇÃO!”

Os nativos disseram ainda que nenhum deles contraiu a Covid-19 até o momento e rejeitaram oferta da Funai de uma “carona” de helicóptero para o deslocamento dos indígenas que participarão da tradução.

Esses nativos deverão se encontrar com os profissionais da Funai para os trabalhos no chamado Núcleo de Apoio Waimiri-Atroari (NAWA), às margens da BR-174, onde os tradutores se isolarão e farão os tesdes de Covid-19.

“Decidimos fazer o deslocamento desses tradutores indígenas por meios próprios, inteiramente por dentro dos caminhos tradicionais da terra indígena, sem passagem ou aproximação aos municípios de Kaminja que ficam próximos à terra indígena e sem qualquer contato com militares e pilotos que, com certeza, não poderão se submeter às condições de quarentena indicadas”, afirmaram.

Eles defenderam ainda que “todas medidas de segurança sejam rigorosamente seguidas sem exceção ou flexibilização” e destacaram que a consulta deve acontecer antes de uma decisão tomada sobre a construção do linhão.

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“Não Abrimos Mão Disso!”, alertaram.

O linhão de transmissão, que conectará Roraima ao Amazonas, terá cerca de 750 quilômetros de extensão, dos quais cerca de 120 km passariam pelas terras dos Waimiri-Atroari.

O empreendimento é importante para cessar a dependência de Roraima de caras termelétricas locais e de importações de energia da Venezuela, suspensas há tempos devido à crise no país vizinho.

O presidente Jair Bolsonaro declarou o linhão como projeto prioritário e estratégico no ano passado, em tentativa de acelerá-lo, mas não adiantou.

Mais recentemente, em meio às dificuldades para avançar, Bolsonaro chegou a afirmar que o governo sofreria “achaque” de índios e organizações não-governamentais nas negociações sobre o projeto.