Coluna do João Gabriel Batista

Planos de saúde: Como o reflexo dos dados do Censo 2022 pode elitizar o consumo

11 jul 2023, 14:16 - atualizado em 11 jul 2023, 14:16
Planos de Saúde
O diagnóstico é claro: estão nascendo menos pessoas e as pessoas têm vivido mais. Mas como isso impacta os planos de saúde? (Imagem: Tãnia Rêgo/Agência Brasil)

A divulgação dos dados do Censo Demográfico de 2022, realizada pelo IBGE no final de junho, permite uma leitura com ampla acuracidade do retrato da população brasileira – como nenhum outro documento permite – e gera também alertas de iminentes movimentos no consumo, sobretudo acerca dos planos de saúde.

Com uma população de pouco mais de 203 milhões de habitantes, cerca de 10 milhões a menos do que a previsão feita pelo IBGE em 2021, a taxa de crescimento foi de apenas 0,52% por ano tomando como base o Censo de 2010.

Em paralelo ao baixo crescimento da população, há também o avanço da parcela idosa da população, ou seja, as pessoas de 60 anos ou mais. Dados divulgados pelo IBGE em 2022 apontam que 15,1% da população brasileira se enquadra como idosa ante 11,3% de 2012.

O diagnóstico é claro: estão nascendo menos pessoas e as pessoas têm vivido mais. Mas como isso impacta os planos de saúde?

Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) apontam que em dezembro de 2022 existiam cerca de 50,4 milhões de usuários de planos de saúde – 25% da população.

Desse montante, 83% possuem convênios médicos por meio de planos corporativos – cujos custos para o usuário final são mais baixos ou totalmente isentos dependendo da empresa.

O modelo de negócio de um plano de saúde pode variar de diversas formas, mas a premissa da maioria deles é similar: os usuários mais jovens pagam e não usam (e quando usam, demandam de um atendimento mais barato), enquanto os idosos pagam e usam com grande frequência – inclusive com procedimentos que são mais caros, os quais requerem um aporte maior para os hospitais e clínicas conveniadas.

Estudo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS) publicado no Estadão indica que um beneficiário de 60 anos custa seis vezes mais que o de um usuário de 0 a 18 anos.

Para que o preço do plano não se torne tão caro, é natural que os mais novos subsidiem os mais velhos. Para evitar que os planos elevem os valores das mensalidades para idosos a um valor impraticável, como forma de penalizá-los ou para simplesmente não atendê-los e ter na carteira apenas a parte rentável do bolo, a ANS proíbe que a mensalidade da última faixa etária (59 anos ou mais) supere em seis vezes o valor da primeira (de 0 a 18 anos).

Se a base de usuários que pagam e pouco usam vem encolhendo e a expectativa de vida segue crescendo, os planos de saúde tendem a repassar essa conta para o consumidor – seja a empresa ou usuário final, o que pode tornar o acesso a um serviço de qualidade ainda mais elitizado.

É extremamente claro que o problema não está na base de usuários – os 50,4 milhões alcançados no final do ano passado representam o maior número em oito anos.

A sociedade enxerga valor em pagar um plano de saúde, ainda que de cobertura limitada, para não ter que recorrer às filas do Sistema Único de Saúde, que é o maior sistema público de saúde do mundo, mas que não tem a infraestrutura necessária para absorver a demanda. O ponto em questão é o valor pago em si e a cobertura correspondente.

Como forma de contenção de gastos, usuários e famílias vêm trocando planos mais robustos por outros de coberturas mais simples. As empresas não só já fazem isso como também cada vez mais recorrem ao modelo de coparticipação como forma de não arcar com a conta total.

Esse fenômeno, que hoje ocorre por questões econômicas, pode se tornar regra devido ao envelhecimento da população e à baixa taxa de natalidade. Isso se desdobra em atendimento em hospitais de ponta, bem localizados e com corpo clínico de alta qualidade mais restritos à camada mais favorecida da população.

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O que fazer?

O poder público tem papel essencial para orquestrar os interesses da sociedade. Ao mesmo tempo, uma inviabilização do modelo de negócio dos planos de saúde levaria ao fim deles, o que empurraria um contingente imenso de beneficiários ao combalido SUS.

O orçamento do Ministério da Saúde para 2023 é estimado em R$ 180 bilhões e certamente precisaria ser reajustado caso tivesse que atender mais 50 milhões de brasileiros.

O conceito de Atenção Primária à Saúde, que representa um conjunto de ações de prevenção, diagnóstico e reabilitação, somado a iniciativas como campanhas de conscientização ou até mesmo medidas adotadas em conjunto com outras pastas – como ampliação da rede de saneamento básico e a melhor estrutura de habitação, também contribuem para evitar diversas doenças.

Por consequência, o sistema de saúde (seja ele público ou privado) é menos onerado, reduzindo custos e garantindo melhor qualidade e preço a quem realmente precisa da assistência hospitalar.

Toda e qualquer política pública adotada em âmbito nacional é cercada de complexidades devido à extensão territorial e à população de mais de 200 milhões de habitantes. No entanto, a estruturação de planos de mitigação se faz necessária para evitar um colapso ainda maior em uma estrutura que hoje já pede atenção