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Plano Safra 23/24: Com recursos insuficientes, devemos ter um ‘programa possível’, diz analista

26 abr 2023, 11:09 - atualizado em 26 abr 2023, 11:09
Na visão do pesquisador da FGV Agro, Felippe Serigati, o novo Plano Safra é bastante desafiador em função do cenário econômico atual (Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino)

Estamos a pouco mais de um mês do anúncio do Plano Safra 2023/2024, programa do Governo Federal que permite o financiamento da atividade agrícola no Brasil.

Em pronunciamento que marcou os 100 primeiros dias do seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que o novo Plano Safra será lançado ainda em maio, um mês antes do período tradicional do anúncio, que costuma acontecer em junho.

Sobre o Plano Safra 2023/2024, o Agro Times conversou com o Felippe Cauê Serigati, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP) e pesquisador do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro).

Agro Times: Como você avalia o Plano Safra 2022/2023 lançado no ano passado? 

Felippe Serigati: Foi um Plano Safra bastante desafiador. Ele é lançado num momento em que já estávamos operando com custos de financiamento mais elevados, dentro de ambiente de restrição fiscal, ou seja, com espaço limitado para subvenções e subsídios.

Mais do que isso, o último plano foi lançado em um momento onde os custos de produção do setor estavam operando em patamares muito elevados por conta da guerra na Ucrânia, importante fornecedor de fertilizantes, o que fez os preços subirem em todo o mundo.

Quando os produtores se prepararam para o ciclo atual (22/23), os custos de produção operavam em patamares muito elevados. Diante disso, para o novo Plano Safra, nós seguimos com uma restrição orçamentária, com espaço limitado no orçamento do Tesouro Nacional para realizarmos grandes financiamentos.

Além disso, os custos de financiamentos continuam elevados e nós estamos operando com uma taxa Selic alta na comparação com o nosso passado recente. A boa notícia fica para os custos de produção do setor que estão operando em patamares menores na comparação com o mesmo período de 2022, ou seja, se por um lado o setor terá de encarar custos de financiamento mais elevados, por outro lado o custo de produção é menor.

Estamos encarando um desafio com a colheita de uma safra recorde de grãos em 312 milhões de toneladas, e quanto mais você produz, maior sua necessidade de financiamento.

Agro Times: O que você espera para o seguro rural no novo Plano Safra?

Na minha visão, o seguro rural foi uma das melhores marcas da última gestão do Ministério da Agricultura, apesar de toda a turbulência da gestão anterior do Mapa. A gestão da ministra Tereza Cristina defendeu valores robustos para o seguro rural, sempre na casa de R$ 1 bilhão, apesar da perda de fôlego em 2022.

Essa é uma grande dúvida no atual Plano Safra, como será o seguro rural nesse novo ciclo? Nós passamos por uma série de fatores adversos, com quebra de safra no Rio Grande do Sul inclusive, o que faz com que o valor do seguro fique ainda mais caro.

De forma geral, eu espero que esse novo Plano Safra conte com o mesmo volume do anterior, em termos reais, acredito que isso já será uma vitória. No entanto, em termos de financiamento, será insuficiente, dado que os custos ficaram maiores.

A grande dúvida que fica é: Qual será o valor da subvenção do seguro rural?

Agro Times: Como o produtor pode driblar este cenário de juros altos?

Felippe Serigati: O produtor não muito para onde fugir, já que a única opção dele é produzir. Se a situação toda estivesse complicada, o ideal, que recomendamos, é tentar produzir em um área menor, mas com uma tecnologia mais resistente a efeitos adversos.

No entanto, cada produtor tem uma estratégia e cada região tem a sua especificidade. O lado bom é que o acesso a tecnologia está mais barato neste ciclo, seja dos insumos, defensivos ou fertilizantes. Ainda assim, o que demandar aporte via crédito, estará mais caro.

Agro Times: Quais linhas de investimentos precisam de um maior volume neste novo plano? 

Felippe Serigati: Essa é uma questão difícil de responder. Eu acredito que se seguirmos as linhas observadas no ano passado, seria um bom desenho.

A política pública atua onde as falhas de mercado são maiores, e na minha visão, deveriam entrar mais em recursos para investimentos ao invés de custeio e comercialização, não porque custeio e comercialização sejam fáceis para o produtor, mas é que os investimentos com essa taxa de juros atual ficam ainda mais difíceis.

O governo precisa atuar não apenas nessas linhas, mas naquelas que geram maior externalidade, como as linhas de agricultura de baixo carbono, linhas sustentáveis. Essas linhas geram externalidades para sociedade e melhoram a imagem do setor, essas linhas já estão operando com taxas mais atraentes, mas o volume de recursos é limitado.

Agro Times: O Ministro da Agricultura Carlos Fávaro comentou recentemente que o novo Plano Safra será focado na agricultura de baixo carbono. Como isso pode ser feito? Quais são os incentivos aos produtores?

Felippe Serigati: Esses incentivos podem ser feitos a partir do fornecimento de uma taxa de juros menor aos produtores que adotarem essa medida sustentável. No entanto, para acessar essa linha (baixo carbono), ela é mais custosa em termos operacionais, com isso o produtor precisa entregar um volume grande de documentação, há uma maior burocracia.

Dessa forma, se esse diferencial não for relevante, ele vai optar por utilizar uma linha convencional. O lado ruim fica pela perda do incentivo na produção ainda mais sustentável no Brasil, e que gera uma externalidade positiva para sociedade.

Agro Times: No ano passado, alguns analistas comentaram que o Plano Safra 22/23 havia sido feito para o médio produtor. O que dá para esperar neste ano?

Felippe Serigati: Eu não acredito que o novo Plano Safra seguirá nesta linha, até mesmo porque o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) perdeu espaço e se dividiu entre: Mapa, Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA).

Além disso, o Mapa “perdeu” a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que agora faz parte do MDA, com isso, eu acredito que o Governo voltará suas atenções ao pequeno produtor, e em termos de volume subsidiados, a maior parte é destinada ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e se virmos um aumento para linhas do Pronaf, não acho que será uma surpresa

Agro Times: Qual a sua expectativa para o novo programa?

Felippe Serigati: Acredito que será lançado o Plano Safra “possível”. O ministro Carlos Fávaro vai atrás do que pode ser feito. Ele sabe que o seu raio de ação no Ministério da Agricultura, a partir do desmembramento do Mapa, ficou menor do que era na gestão da Tereza Cristina, ainda assim, ele é um parlamentar que conhece muito bem o setor, é produtor rural também, então ele entende muito bem o que acontece dentro da porteira, com isso, ele deve entregar o que for possível dentro da conjuntura econômica atual.