Política

PF aponta crime de Bolsonaro em vazar conteúdo de inquérito sigiloso

02 fev 2022, 11:23 - atualizado em 02 fev 2022, 12:25
Jair Bolsonaro
A delegada da PF responsável pelo inquérito, deixou de promover o indiciamento de Bolsonaro ao justificar que a corte tem entendimento de que pessoas com foro privilegiado só podem ser indicadas mediante prévia autorização do Congresso (Imagem: Reuters/Adriano Machado)

A Polícia Federal apontou que o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de violação de sigilo funcional ao divulgar o conteúdo de um inquérito sigiloso a respeito do ataque hacker aos sistemas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em uma live realizada por ele em agosto do ano passado, para tentar desacreditar o sistema de votação em urna eletrônica.

“Considerando os elementos de interesse coligidos, que apontam a autoria, a materialidade e as circunstâncias da divulgação, de conteúdo de inquérito policial por funcionários públicos (presidente da República, ajudante de ordem e deputado federal), na live do dia 4 de agosto de 2021 e sua publicização por diversos meios, com o nítido desvio de finalidade e com o propósito de utilizá-lo como lastro para difusão de informações sabidamente falsas, com repercussões danosas para a administração pública, dá-se por encerrado o trabalho da Polícia Judiciária da União”, disse a PF em manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A delegada da PF responsável pelo inquérito, Denisse Ribeiro, deixou de promover o indiciamento de Bolsonaro e do deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), que participou da live ao lado do presidente, sob justificativa de que a corte tem entendimento de que pessoas com foro privilegiado –como o presidente e o parlamentar– só podem ser indicadas mediante prévia autorização do Congresso Nacional.

Procurada, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou que a manifestação dos órgãos jurídicos de representação da instituição ocorrerá, se e quando cabível, nos autos do processo.

A defesa de Bolsonaro afirmou anteriormente que não houve quebra de sigilo do inquérito. Pelo Twitter, Barros também já disse que não havia sigilo no inquérito sobre o ataque ao sistema do TSE.

A conclusão do inquérito deverá ser encaminhada para a Procuradoria-Geral da República (PGR) a quem caberá decidir se oferece denúncia contra os envolvidos, promove novas diligências ou pede o arquivamento do caso por falta de elementos para se fazer uma acusação criminal.

A PGR não está vinculada ao entendimento da PF sobre o caso.

Depoimento

A delegada finalizou a instrução do inquérito na segunda-feira e encaminhou ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, na manhã desta quarta. Essa conclusão da PF ocorreu depois que o próprio Bolsonaro não compareceu ao depoimento marcado na sexta-feira da semana passada.

Desde novembro passado, a PF havia pedido para tomar o depoimento do presidente no inquérito, mas a defesa de Bolsonaro pediu sucessivos adiamentos. Moraes teve de marcar a ida do presidente após ele não ter informado quando iria depor.

Para a delegada do caso, entretanto, a ausência de Bolsonaro não comprometeu a investigação.

“Decorrido o prazo estabelecido, não houve atendimento à ordem judicial mencionada, inviabilizando-se a realização do ato e a consequente obtenção da perspectiva do senhor Jair Messias Bolsonaro a respeito dos fatos. Essa situação, entretanto, não teve o condão de impedir a correta compreensão e o esclarecimento do evento”, disse.

A delegada entendeu que o deputado federal Filipe Barros –que foi relator da PEC do voto impresso em urnas eletrônicas– fez uma requisição formal do inquérito sobre hackers do TSE para subsidiar a discussão da proposta. Entretanto, segundo ela, o parlamentar entregou a documentação a Bolsonaro para ele usar o material na “narrativa de vulnerabilidade do sistema eleitoral brasileiro”.

Em 4 de agosto do ano passado, o presidente e Filipe Barros fizeram uma live para apresentar o documento para supostamente provar a fragilidade das urnas eletrônicas.

O inquérito sobre a suposta tentativa de invasão ao sistema do TSE em 2018 jamais concluiu por qualquer fraude ou vulnerabilidade das urnas eletrônicas, ao contrário da impressão que Bolsonaro procurou passar.

Segundo a PF, Bolsonaro contou com a ajuda do tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid, atual ajudante-de-ordens dele.

O militar, conforme a polícia apurou, “também teve acesso à documentação em razão de seu cargo e disponibilizou o conteúdo da investigação, via conta pessoal do presidente da República (por determinação deste), com auxílio de seu irmão”.

O tenente coronel, que não tem foro privilegiado, foi indiciado pelo crime de violação de sigilo funcional cometido por funcionário público.

Milícias digitais

Na noite de terça, o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse que Bolsonaro vazou dados sigilosos desse inquérito da PF sobre o sistema eleitoral que ajudam “milícias digitais” e criminosos que tentam realizar ataques cibernéticos ao sistema eleitoral brasileiro.

“Informações sigilosas que foram oferecidas à Polícia Federal para auxiliar uma investigação foram vazadas pelo próprio presidente da República em redes sociais, divulgando dados que auxiliam milícias digitais e hackers de todo o mundo que queiram tentar invadir nossos equipamentos”, afirmou Barroso em discurso na abertura do ano da Justiça Eleitoral.

“O presidente da República vazou a estrutura interna de TI do Tribunal Superior Eleitoral. Tivemos que tomar uma série de providências de reforço da segurança cibernética dos nossos sistemas para nos protegermos”, acrescentou o ministro, que é alvo constante de ataques de Bolsonaro e de apoiadores do presidente.

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