Opinião

Petróleo dura 10 anos: maior IPO do mundo ofusca opinião de especialista renomado

22 nov 2019, 14:13 - atualizado em 22 nov 2019, 14:25
Os investidores voltaram a fazer o petróleo subir nesta semana, dando pouca importância à experiência de Andy Hall, ex-alto executivo da BP e do Citigroup (Imagem: Steven St. John/ Bloomberg)

Por Barani Krishnan/Investing.com

Quando um dos mais respeitados “touros” do petróleo se mostra surpreendentemente pessimista com o mercado nos próximos anos, o que você faz?

Bem, os investidores voltaram a fazer o petróleo subir nesta semana, dando pouca importância à experiência de Andy Hall, ex-alto executivo da BP e do Citigroup, onde recebeu um bônus de US$ 100 milhões, além de ter sido um gestor bilionário do antigo fundo Astenbeck.

A opinião de alguém tão respeitado como Andy Hall pode ter grande repercussão no mercado de petróleo, mas nenhum trader é digno desse nome se não tomar suas próprias decisões ao operar.

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Hall dá ao petróleo 10 anos; investidores apostam em 30 anos de Aramco

O veredito feito por Andy Hall na semana passada, de que o crescimento da demanda petrolífera acabará em cerca de 10 anos, foi ofuscado por rumores em torno da oferta inicial de ações da Saudi Aramco, petrolífera estatal da Arábia Saudita, cujo domínio do mercado de petróleo deve durar, ironicamente, mais 30 anos, na opinião dos investidores.

O repique se apoiou na cena criada pela Opep, cartel liderado pela Arábia Saudita, para impulsionar o mercado antes do IPO da Aramco (Imagem: Reuters/Maxim Shemetov)

Provando que às vezes pode haver uma desconexão entre os fundamentos e os preços do petróleo, tanto o West Texas Intermediate quanto o Brent saltaram 5% nos últimos dois dias, recuperando tudo o que perderam nos dois pregões anteriores, por causa de temores com a demanda. O repique se apoiou na cena criada pela Opep, cartel liderado pela Arábia Saudita, para impulsionar o mercado antes do IPO da Aramco, que deve se tornar a empresa de capital aberto mais valiosa do mundo.

WTI Semanal

Deixando de lado o atual estado do mercado, que um fã inveterado de preços altos do petróleo como Hall consegue prever, a destruição de demanda que ameaça o petróleo mostra que ainda há forças disruptivas no mercado atualmente.

Muitos, senão todos os que já foram um dia devotos de Hall, ficariam chocados com sua mudança de posição.

Eu sem dúvida fiquei.

Hall sempre foi um defensor do petróleo

Todos os meses, a partir dos escritórios da Astenbeck em Westport, Connecticut, Andy Hall escrevia cartas de 10 a 12 páginas aos investidores do fundo, tentando arrumar argumentos contra um mercado que muitas vezes vinha contra ele, principalmente depois da sua primeira perda no mercado em 2012, quando já contabilizava mais de uma década de lucros turbinados.

Ainda me lembro da observação feita por um editor com quem eu compartilhei uma de suas cartas. “Só tem história aqui – uma apresentação explicando por que os preços do petróleo devem continuar subindo sem parar”, afirmou o editor.

A realidade era que o mercado estava bastante confortável com o barril abaixo de US$ 40 (Imagem: REUTERS/Brendan McDermid)

Mas Hall insistia em ser um “touro permanente”, alcunha dada por detratores da sua visão constantemente altista para o petróleo. Seus investidores, em sua maioria fundos de pensão e outras instituições com dezenas de milhões de dólares cada uma investidos na Astenbeck, de certa forma continuaram com a empresa depois dos prejuízos que sofreram quando ele insistiu que o barril de petróleo voltaria a custar entre US$ 80 e US$ 100.

A realidade era que o mercado estava bastante confortável com o barril abaixo de US$ 40, chegando inclusive a bater perto de US$ 25 certa vez, por causa da sobreoferta criada pelo shale. Quando se aposentou no verão de 2017, a Astenbeck valia menos do que um décimo dos US$ 5 bilhões que um dia chegou a administrar.

Na semana passada, Andy Hall falou sobre a dinâmica do mercado de petróleo nos dias atuais, durante um evento de energia em Nova York, organizado pela Orbital Insight, empresa californiana de tecnologia que agora faz consultoria com ele.

Hall agora fala de carros elétricos e energia renovável

Até 2030, o mundo verá uma estagnação ou um declínio no consumo global de petróleo por causa da tecnologia e dos carros elétricos, segundo ele. E, sim, as fontes de energia renovável serão os novos combustíveis fósseis, afirmou.

Como se estivesse tentando se defender das suas apostas passadas ao responder às perguntas do público, Hall declarou que suas decisões se basearam na ideia de que “o consumo de petróleo aumentaria até a eternidade, salvo se logicamente conseguíssemos prever que isso não poderia acontecer”.

Isso nos leva ao ponto principal deste artigo: o IPO da Aramco e a forma como a empresa planeja interagir com o mercado de petróleo do futuro também precisa de uma explicação lógica.

Clyde Russel, colunista de commodities da Reuters, afirmou em um artigo na semana passada que a complacência do mercado de petróleo com a abertura de capital da Aramco parecia equivocada.

A Aramco se comprometeu a distribuir um dividendo anual de pelo menos US$ 75 bilhões pelos próximos cinco anos. Isso significa que a empresa será pressionada a manter sua forte lucratividade atual. Uma forma de conseguir isso é otimizando suas atividades de produção, refino e remessa de petróleo.

A Arábia Saudita precisa cortar; a Aramco pode ter que produzir mais

O único problema é que, enquanto nação, a Arábia Saudita precisa cortar a produção de petróleo se quiser evitar que os preços do produto despenquem.

Como líder da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, Riad participa de um pacto de restrição de oferta com aliados como a Rússia no âmbito da chamada Opep+.

A principal razão para o salto de 2% nos preços do petróleo na quinta-feira foi uma reportagem da Reuters sugerindo que os cortes da Opep+ continuarão até junho. Estou inclinado a apostar que esses cortes continuarão por um bom tempo, para não dizer para sempre.

A Arábia Saudita precisa cortar a produção de petróleo se quiser evitar que os preços do produto despenquem (Imagem: REUTERS/Ahmed Jadallah)

Mesmo com a Aramco sendo a produtora de menor custo por barril, não tenho certeza de que os sauditas conseguirão conciliar tranquilamente o duplo objetivo de cortar a produção em favor de preços mais altos e garantir que sua empresa listada avance a todo vapor para impulsionar a receita.

Russell inclusive postula o seguinte: E se a oferta do shale oil norte-americano continuar crescendo como nos últimos anos, assim como a produção fora do acordo da Opep+?

Será que a Aramco continuará defendendo cortes por parte da Opep e seus aliados? Ou será que tentará focar no volume, e não no valor, em vista da sua vantagem inerente como principal produtora de petróleo a baixo custo?

petróleo é maior que a Aramco, e não o contrário

Minha outra surpresa é a histeria gerada em Wall Street e que o mercado de petróleo acabou comprando: os preços do petróleo precisam subir antes da abertura de capital da Aramco e devem continuar altos para mostrar os sucesso do float.

A decisão do governo saudita de abrir o capital da empresa na bolsa local, em vez de escolher Nova York ou Londres, indica o nível de transparência que deseja para a futura empresa pública e como pretende “gerenciar” qualquer reação adversa proveniente da listagem. A decepção com o fato de que a avaliação de mercado da Aramco será menor do que os US$ 2 trilhões almejados já está desagradando o reino aparentemente.

O que precisa ser enfatizado em todo o setor é que o mercado petrolífero sempre será maior que a Aramco.

Na condição de commodity, a precificação do petróleo se dá sobretudo com base na sua relação de oferta e demanda, disponibilidade e outras variáveis relacionadas.

A Aramco, na condição de empresa pública, será julgada por seus investidores com base em seu desempenho e saúde financeira.

É preciso não confundir as duas coisas, sejam quais forem as motivações de Wall Street.