Petrobras (PETR4): Faz sentido privatizar a companhia?
“O Petróleo é nosso!” foi o conhecido slogan dos anos 50, símbolo da campanha pelo monopólio estatal na exploração de petróleo, inspirado em uma declaração de Getúlio Vargas em 1939, quando foi descoberto o primeiro poço de petróleo no país. Do outro lado, havia na época defensores de aumentar a competição no setor, permitindo a participação estrangeira, liderados pelos economistas Roberto Campos e Eugenio Gudin.
Não é de hoje, portanto, o embate entre as visões sobre o papel do Estado no setor. À época, vitória dos nacionalistas, que resultou na criação da Petrobras (PETR4) em 1953.
Agora, o elevado preço da gasolina, que já representa quase 7% do orçamento do brasileiro médio, coloca o debate novamente na mesa, em meio a outras ideias para se reduzir os preços dos combustíveis. Já discuti em outro artigo o porquê não se deve reduzir impostos sobre os combustíveis. Mas será que, a despeito da imensa barreira política para tal, a privatização da Petrobras não seria uma opção?
Embora não haja um monopólio instituído por lei desde 1997, a produção nacional de combustíveis é virtualmente monopolizada pela Petrobras. Contudo, a produção local ainda não consegue suprir a demanda do país.
Por isso, cerca de 20% dos derivados de petróleo ainda são importados. Neste caso, fazer com que a Petrobras venda combustível com preço abaixo do mercado internacional desincentivaria as importações e elevaria o risco de desabastecimento.
Uma alternativa, como alguns argumentam, seria a Petrobras aumentar o investimento em refinarias com o objetivo de atender 100% da demanda nacional de combustíveis, e assim poder operar com preços defasados da referência internacional. Mas essa não seria a melhor decisão para a empresa.
O melhor direcionamento para os investimentos são as atividades que proporcionarão os maiores retornos. O que não é o caso da atividade de refino, com margens menores que a extração, por exemplo.
Com recursos limitados e elevado endividamento, a decisão é lógica. Além disso, uma menor participação no refino reduz a pressão política para controle de preços da estatal. Por esse motivo, a empresa já iniciou a venda da maior parte de suas refinarias.
Mas por que não interferir diretamente na empresa, forçando o investimento em refinarias e operando com preços mais baixos que o mercado internacional? A primeira parte da resposta é mais clara. A decisão seria muito ruim para a empresa, que perderia grande parte do seu valor atual.
O governo (ou a sociedade), como principal acionista, veria destruído parte do seu capital. As recentes tentativas de expansão de refinarias, por exemplo, levaram a obras superfaturadas.
Petrobras com boa gestão gera mais valor à sociedade
A segunda parte é menos evidente. Para muitos, o benefício social de ter um combustível mais barato superaria as perdas com o valor da empresa. Esta percepção, no entanto, é enganosa. Com bons resultados operacionais, a companhia deve pagar aos governos federal e estaduais este ano, somando dividendos, royalties e impostos, cerca de R$ 390 bilhões de reais.
Esse montante representa mais de quatro vezes o orçamento do Auxílio Brasil, de R$90 bilhões. Acima também do total de arrecadação de ICMS dos estados com combustíveis no ano passado, de R$ 112 bilhões.
Ou seja, a Petrobras transfere mais valor à sociedade sendo uma empresa com boa gestão e sem interferências políticas do que o contrário. Mas privatizá-la faria com que o preço caísse? No curto prazo provavelmente não, já que a empresa continuaria acompanhando a paridade internacional do petróleo.
A privatização também precisaria se traduzir em aumento da concorrência, provavelmente dividindo a empresa, e não apenas transferir um monopólio público para um privado.
Ao longo dos anos, no entanto, o fim do monopólio atrairia mais investimentos para o setor, mais empregos e elevaria a competição, possivelmente se traduzindo em preços melhores.
Igualmente importante, a empresa deixaria de ser um potencial alvo de ingerência e de tomar espaço relevante no debate público, com temas tão importantes sendo preteridos.
Uma das funções do Estado na economia deve ser a de garantir um ambiente competitivo, de livre concorrência, sem abrir mão de aspectos importantes de regulação e fiscalização.
A privatização pode ser um bom caminho para isso, ainda que não seja uma solução imediata para os preços elevados, mas que faz sentido em prazos mais longos se acompanhada do fim do monopólio.
Sim, o “Petróleo é nosso!”, e por isso deve ser explorado da forma mais eficiente e benéfica para o país, que não é através do monopólio estatal. Precisamos nos livrar do “fetiche do produto físico”, como dizia Roberto Campos, e focar nas questões que realmente importam para o país.
Carlos Lopes é economista no banco BV desde 2013 e já passou por instituições financeiras como Itaú BBA, Banco Fibra e WestLB. É formado pela Universidade de São Paulo e tem mestrado no Insper.
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