Pedro Serra: ESG e seus impactos sobre as organizações
Michael Porter, criador do modelo das cinco forças, que analisa a competição entre as empresas, defendeu que a sustentabilidade era uma importante vantagem competitiva.
Afirmou que as empresas deveriam buscar métodos de operação mais eficientes, para que a sua operação trouxesse o menor impacto possível para o planeta e garantisse maior longevidade no mercado em relação aos seus concorrentes.
Dessa forma, mais do que obter retornos financeiros, os investidores têm se preocupado em destinar seus recursos para financiar companhias bem geridas e que exerçam impactos positivos sobre o meio ambiente e a sociedade.
Sabendo disso, as empresas estão percebendo a importância de adotar práticas sustentáveis e ampliarem sua agenda ESG (Environmental, Social and Corporate Governance), divulgando suas iniciativas de forma recorrente junto aos seus resultados operacionais e financeiros e criando diretorias com foco no monitoramento e desenvolvimento de soluções para esses assuntos, de forma que esse tem se tornado um dos mais importantes critérios para a tomada de decisão nas empresas.
No entanto, é importante que o investidor esteja atento ao que chamamos de greenwashing – quando uma empresa se preocupa mais em aparentar ter uma consciência ESG do que, de fato, em criar soluções agregadoras.
Apesar desses aspectos serem mais amplamente discutidos no exterior e ainda termos um longo caminho pela frente, na bolsa brasileira também temos excelentes exemplos de empresas que estão direcionando cada vez mais recursos para se tornarem mais responsáveis em sua governança, social e ambientalmente, sem impactar a sua rentabilidade.
Um desses exemplos é a Ambev (ABEV3). Além de ter estabelecido metas para a redução de impactos ambientais, a empresa já tem apresentado resultados nesse sentido.
Até 2020, a Ambev reduziu seu consumo de água em 55% em relação a 2002, e pretende aumentar ainda mais sua eficiência hídrica até 2025, utilizando dois litros de água para cada litro de cerveja – hoje são utilizados 2,5 litros.
Ademais, a empresa pretende que 100% das embalagens de seus produtos sejam retornáveis, ou feitas majoritariamente de material reciclado – atualmente, no Brasil, 38% das embalagens já são retornáveis, mas a companhia já está mais avançada na iniciativa em outros países em que atua.
Aumentando a adesão às embalagens retornáveis, a Ambev também obtém vantagens financeiras, uma vez que a rentabilidade gerada por esse tipo de embalagem é bastante superior às tradicionais latinhas de alumínio e garrafas plásticas.
No varejo de moda, o foco em sustentabilidade também tem ganhado tração. Em 2021, a Lojas Renner (LREN3) adquiriu a Repassa e a Arezzo (ARZZ3) comprou a Troc – ambas são plataformas de moda circular.
Além do mercado de revenda estar crescendo mundialmente a passos mais largos que o mercado de moda, o movimento contribui para a redução de um dos principais impactos causados pela indústria da moda: o rápido descarte de produtos e a consequente poluição do meio ambiente.
Além disso, a Reserva (uma das marcas da Arezzo) também tem reaproveitado resíduos de suas produções para a fabricação de solados.
O setor de locação de transportes também contribui com destaques nessa agenda, já que a Movida (MOVI3) é uma das companhias de locação mais engajadas na agenda ESG no Brasil.
Entre suas metas, destacamos: se tornar carbono neutro até 2030, manter 100% de suas instalações com energia fotovoltaica e garantir 50% de mulheres em cargos de liderança. Com isso, a companhia já se move para a conclusão dessas metas por meio de inúmeras iniciativas.
Para chegar a ser carbono neutro, a companhia planeja reduzir 30% de suas emissões até 2030 e formalizaram o contrato de plantio de 1 milhão de mudas até o mesmo ano.
Além disso, a empresa em 2020 aderiu às iniciativas Princípios de Empoderamento das Mulheres da ONU e chegou a bater 34% de mulheres em cargos de liderança, número acima da meta que tinham para 2020, que era de 30%.
Por fim, a companhia em 2020 fechou o contrato de locação de placas solares em fazendas construídas com essa finalidade para todas as suas lojas em Minas Gerais, o que significa um total de 17 unidades.
Todas essas iniciativas permitiram que a Movida se tornasse a segunda empresa listada no Brasil a ingressar no sistema B, selo que credencia o potencial da empresa para contribuir com o progresso social, econômico e ambiental, com práticas concretas e um propósito orientado à geração de benefícios.
Além disso, a cia. se tornou a primeira empresa do setor a compor a carteira ISEB3, principal índice sobre sustentabilidade do mercado nacional.
Outro exemplo interessante é o da Vibra (VBBR3), que se propõe a reduzir emissões de carbono no transporte de seus produtos, ampliar a utilização de energias renováveis, reduzir a geração de efluentes e do consumo d’água.
No quesito social, a companhia dispõe de atividades de engajamento comunitário, voluntariado e aumento da diversidade interna. Na governança, após a saída da Petrobras (PETR3), a companhia se tornou uma true corporation e dispõe de um conselho de administração com todos os conselheiros independentes.
Como compromisso, a companhia quer ser net zero de emissões, diretas e indiretas até 2025. Destacamos ainda que as movimentações da companhia no mercado de fusões e aquisições a colocam em outro nível no processo de transição energética da matriz brasileira.
A compra da Targus, da Comerc, Zeg Biogás, Ezvolt e Brasil Fuels mostram que a companhia quer atuar de forma ativa neste processo. Trazendo para a realidade da empresa e para a sua alocação de capital, negócios ligados à questão ESG.
Essas questões têm ganhado importância e espaço nas conversas com investidores, credores etc, além das empresas estarem, cada vez mais, divulgando e abrindo seus números e iniciativas.
Importante ressaltar que este tema não se trata de uma “moda”, e sim um tema muito sério e que, uma vez deixado de lado aspectos ambientais, sociais ou de governança com a seriedade e responsabilidade necessária, podemos obter resultados e eventos até mesmo catastróficos, sendo que diversas empresas já sofreram impactos negativos em sua reputação e, consequentemente, trouxeram prejuízo aos seus investidores. Temos alguns exemplos recentes.
A JBS (JBSS3), sofreu acusações de comprar gado cujo pasto estava associado a áreas de desmatamento na Amazônia, quando consultorias independentes conseguiram rastrear e confirmar o fato. Isso pesou na imagem da companhia, levando à queda de suas ações.
Em função disso e de outros ocorridos, a companhia tem envidado esforços para aprimorar suas práticas ambientais em favor da sustentabilidade.
Algumas medidas adotadas pela companhia recentemente incluem a elaboração de política responsável de compra de gado, com diretrizes específicas para evitar a aquisição de animais de pasto associado a áreas desmatadas, além de desenvolver e adotar uma nova política de uso sustentável de terras, com a mesma finalidade.
A companhia também passou a divulgar relatório anual de sustentabilidade, no qual faz um acompanhamento detalhado de suas metas ambientais.
Recentemente, a companhia lançou um CRA verde e um título de crédito privado sustentável, instrumentos de captação de recursos a fim de investir em projetos de aprimoramento de práticas ambientais, as duas iniciativas apoiadas por opinião de parte desinteressada, isto é, uma opinião fundamentada por especialistas independentes acerca da sustentabilidade dos projetos almejados.
A JBS também conta com site na internet exclusivamente dedicado à divulgação e ao detalhamento de práticas sustentáveis adotadas pela companhia.
No caso da JBS, então, embora a empresa já tivesse iniciativas, um evento importante que lhe causou prejuízos, foi um catalizador para uma atitude mais firme que, talvez, se tivesse sido tomada antes, poderia ter evitado o episódio.
A Vale (VALE3), talvez o exemplo mais emblemático, se viu, mais uma vez, envolvida numa tragédia de rompimento de barragem, dessa vez em Brumadinho/MG, em janeiro de 2019, deixando diversas vítimas e um impacto ambiental incalculável, para perplexidade de todos que acompanharam o evento, uma vez que essa tragédia não era inédita, pois em novembro de 2015 tivemos o caso do rompimento da barragem de Mariana, que pertencia a sua controlada, juntamente com a BHP, a Samarco.
No primeiro pregão após o episódio de Brumadinho, a companhia viu suas ações despencarem mais de 20% e, três anos depois da tragédia, ainda vemos os papeis da companhia assumindo um desconto em função do impacto desses acontecimentos. Após isso, e diferentemente do primeiro episódio, a companhia teve uma postura de enfrentar o problema e assumir os seus erros.
De lá para cá, a companhia optou por reduzir, reformular e remensurar os riscos de sua atuação. Neste contexto, estão inseridas as ações para descaracterização de barragens, o aumento da transparência ao mercado quanto às ações executadas e o estabelecimento de metas para ajudarem a companhia a ser vista de forma menos nociva pelo mercado.
Quanto às barragens, Vale espera que todas estejam descaracterizadas até 2029. Quanto às metas, foram criadas 63 metas e destas, menos de uma dezena não foram concluídas até agora.
Acreditamos que, apesar de ainda vermos um longo caminho pela frente, a companhia chamou a responsabilidade e vem entregando melhorias sensíveis ao longo dos últimos anos.
Além das tragédias, também há oportunidades reais sobre o tema, capaz de gerar valor ao acionista através da ampliação de seu valor de mercado e as empresas estão enxergando oportunidades de monetizar as questões que envolvem impactos ambientais.
Um bom exemplo disso é a Suzano (SUZB3) que tem planos de monetizar suas florestas através da captura e comercialização de créditos de carbono.
Como se trata de um mercado ainda muito no início, nada disso está sendo precificado no valor de suas ações, o que abre para um potencial ganho e geração de valor no longo prazo, se o plano da empresa for bem executado.
No final de junho, a companhia agendou uma conferência para falar sobre o tema e deverá abordar, de forma mais detalhada, este projeto.
Já a Ambipar (AMBP3), por exemplo, é focada na área e oferece uma gama completa de serviços que possibilita empresas de todos os setores a melhorarem as suas métricas ESG, conquistando mais consumidores e força no mercado.
A empresa possibilita, através da aplicação de economia circular, a redução de gases de efeito estufa, a maior eficiência energética e preservação ambiental.
Recentemente, a companhia também adentrou ao mercado de créditos de carbono de maneira mais firme a partir da aquisição da Biofílica. Em outras palavras, ESG é o negócio da Ambipar.
Assim, o acompanhamento dessas histórias demonstra os prejuízos em que as empresas podem incorrer pela falta de práticas sustentáveis, e a forma pela qual empresas se têm empenhado com a finalidade de aprimorar sua percepção em face da exigência progressiva dos investidores institucionais a favor de boas práticas de sustentabilidade.
Dessa forma, podemos entender que, em linha com o pensamento de Porter, a atenção às boas práticas ESG tem a capacidade de gerar, sobretudo a longo prazo, retornos positivos aos investidores, os expondo a menores riscos jurídicos, além de aumentarem as chances de perpetuar suas operações ao atuarem de forma sustentável.
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