Brasil

Pandemia e busca por apoio político jogou protagonismo e verbas no colo do Congresso durante gestão Bolsonaro

26 jun 2022, 17:00 - atualizado em 24 jun 2022, 20:27
Lira
Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados (Imagem: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)

Jair Bolsonaro (PL) se elegeu como presidente da República em 2018 clamando ser um candidato anti-sistema, contra “tudo o que estava aí”.

Tendo sido deputado federal pelo Rio de Janeiro durante 28 anos, o agora presidente deu início a seu mandato afirmando que iria governar de forma independente a figurões da política. Alegava que não cairia nas graças dos partidos tradicionalmente apelidados de “centrão” e estava chegando para acabar com privilégios e regalias de Brasília.

Quase quatro anos depois, com as próximas eleições presidenciais cada vez mais próximas, seria o cenário da relação entre Bolsonaro e o Congresso Nacional o mesmo?

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Mais MPs e mais aliados depois da pandemia

Para Vitor Oliveira, cientista político e diretor da consultoria Pulso Público, Bolsonaro chegou a poder com resistência a fazer articulações com o poder legislativo.

Durante o decorrer de seu mandato, do ponto de vista de encaminhamento de decisões, a relação entre o executivo e o legislativo acabou ganhou agilidade, com a virada acontecendo durante a pandemia — mas isso não quer dizer que a relação ficou melhor.

Um dos principais sintomas da dificuldade inicial nas relações entre os poderes era o baixo número de Medidas Provisórias encaminhadas por Bolsonaro, em comparação com outros presidentes, ao Congresso.

As MPs, medidas de iniciativa do Executivo, precisam de aprovação do Congresso para adquirirem caráter permanente.

Assim, quando um governo opta por utilizá-las para legislar, é um sinal de que Executivo e Congresso andam lado a lado no encaminhamento e sanção de propostas — o que não era o caso de Bolsonaro, ao menos até antes da chegada da Covid-19 ao Brasil.

Bolsonaro enviou 101 Medidas Provisórias ao Congresso em 2020 (Imagem: Flickr/Isac Nóbrega/PR)

“Antes da pandemia, o presidente tinha medo do Congresso. Mas, a partir de então, a maioria das medidas que Bolsonaro passou a editar eram medidas de dar mais abertura ao orçamento e distribuir recursos, e então o tamanho de sua coalizou aumentou, pois Bolsonaro atraiu mais partidos para participarem do governo”, diz.

Durante 2020, o governo bateu recorde ao encaminhar 101 MPs ao Congresso, enquanto em 2021 foram 66.

Deste conjunto, muitas propostas faziam parte de uma série de repasses e flexibilizações de regras fiscais  para financiar o setor da saúde e subsidiar partes da economia afetadas pela crise.

Durante o primeiro ano da crise de saúde, o governo liberou via MPs crédito para a manutenção de empregos (935/2020), redução de jornada de trabalho e salários (936/2020), recursos extras para estados e municípios (938/2020), entre outros.

Além disso, o governo sancionou a lei que instituiu pagamento do Auxílio Emergencial, programa de transferência de renda aos que perderam sua fonte de sustento durante a pandemia — em 2021, a extensão do programa, que causou aos cofres públicos um custo de aproximadamente R$ 350 bilhões, se deu via MP.

O Auxílio Emergencial foi um programa de transferência de renda aos que perderam fonte de sustento durante a pandemia (Imagem: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil)

Congresso abocanhou protagonismo…

Com mais partidos sob seu guarda-chuva graças a uma abertura nas contas públicas, Bolsonaro viabilizou, no início de 2021, a eleição de Arthur Lira (Progressistas) à presidência da Câmara dos Deputados, um de seus principais aliados.

A partir de então, segundo Oliveira, o Congresso tomou a frente da agenda de implementação de políticas públicas no país.

“A eleição do Lira pacificou o arranjo em que o Executivo, ficando de tabela, terceirou a formulação de políticas públicas para o Legislativo. Este arranjo, que levou Lira ao poder, está atualmente no controle das políticas públicas, e não o presidente”, afirma.

… e cifras

Em maio de 2021, uma série de reportagens do Estadão revelou que o governo se utilizava das chamadas “emendas do relator” para promover repasses de difícil rastreamento a parlamentares e conseguir apoio de partidos do Centrão no Congresso, no que foi chamado de “orçamento secreto”.

À época, o jornal noticiou que o próprio presidente, em outro momento, já havia vetado o esquema por “contrariar o interesse público” e estimular o “personalismo”, mas, com a necessidade de apoio político se tornando mais forte, voltou atrás.

As emendas em questão não tinham detalhes disponibilizados publicamente e o esquema de distribuição seguia a critérios estritamente políticos — só ganhava quem tinha algo a oferecer para o governo.

Para Oliveira, da Pulso Público, o resultado de tamanha apoderação do orçamento por parte do Congresso é uma transparência ainda menor para cidadãos sobre a influência de acordos políticos na execução de políticas públicas.

“E a única coisa que o executivo pede em troca é a sustentação do governo. Hoje, quem lidera é o Lira. E não o Bolsonaro”, conclui.

 

 

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