Otimismo com reabertura da economia pode desaparecer rapidamente com Delta
Por Martha Beck, Gabriela Mestre e Marisa Wanzeller
Estados e cidades no Brasil se preparam para suspender a maioria das restrições para empresas e reuniões diante da queda de casos e mortes por Covid-19 para o nível mais baixo dos últimos meses e do ritmo mais rápido de vacinação.
Em São Paulo, muitas escolas reabriram com ocupação total para aulas presenciais esta semana, e o estado planeja encerrar restrições de horário e capacidade para a maioria das empresas a partir de 17 de agosto. O Rio de Janeiro também tem planos para relaxar as regras a partir de 2 de setembro, inclusive sobre o uso de máscaras. A reabertura incluirá quatro dias de comemoração, disse o prefeito Eduardo Paes, acrescentando que as festas de fim de ano serão as maiores da história da cidade.
A rapidez para suspender as restrições, que estão em vigor há mais de 15 meses embora com aplicação irregular e regras muitas vezes contraditórias que as tornam menos eficazes, surge em meio a uma trégua na pandemia.
Embora o coronavírus ainda mate quase 1.000 pessoas por dia, o número diminuiu em relação ao pico de mais de 4.200. A média móvel caiu abaixo de 1.000 pela primeira vez desde janeiro. Hospitais também estão menos sobrecarregados, com o nível de ocupação em unidades de terapia intensiva em cerca de 60% a 65% em relação a mais de 95% no início do ano.
Todo o otimismo pode desaparecer rapidamente se a variante delta, que provoca um ressurgimento do coronavírus na Europa e nos Estados Unidos, se espalhar pelo Brasil. Embora especialistas digam que ainda é muito cedo para dizer se a cepa causará uma terceira onda no país, a pressão para eliminar as restrições aumenta o risco.
“Meu medo é que a população esteja muito animada com a queda dos números da Covid”, disse Pedro Hallal, epidemiologista e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas. “A delta pode ‘fazer uma festa’ e infectar muitas pessoas.”
A delta é a variante do coronavírus mais preocupante até agora, já presente em mais de 100 países desde que foi identificada pela primeira vez na Índia em outubro passado. A cepa, que se estima ser quase duas vezes mais contagiosa que o vírus original do início de 2020, tornou-se dominante em muitos países, incluindo no Reino Unido e EUA. Seu impacto é maior onde menos da metade da população adulta foi totalmente imunizada.
No Brasil, por enquanto o impacto da delta tem sido moderado. Dados mais recentes do Ministério da Saúde mostram que o país identificou cerca de 250 casos da variante em relação a 170 há uma semana. Mas o número provavelmente não reflete o verdadeiro efeito da cepa, já que o país não testa o suficiente, disse Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).
A delta também enfrenta a concorrência da variante gama, inicialmente identificada em Manaus que, segundo especialistas, é muito mais contagiosa do que a cepa original.
“A gama é tão preocupante quanto a delta e continua predominando no Brasil”, disse Marcelo Paiva, professor da Universidade Federal de Pernambuco e pesquisador da Fiocruz, que conduz estudos para rastrear o coronavírus. “A introdução de uma nova variante como a delta só vai ressaltar que nós estamos diante de um país que está se imunizando lentamente.”
Fernando Spilki, pesquisador da Covid do Ministério da Ciência e Tecnologia, disse que o Brasil deveria se concentrar em encurtar o período entre as doses para imunizar totalmente o maior número possível de pessoas e evitar que a variante delta se propague. Autoridades anunciaram recentemente que avaliam reduzir o período entre as doses da Pfizer para 21 dias, mas somente depois que toda a população com mais de 18 anos receber a primeira dose.
Por enquanto, especialistas recomendam cautela. A delta foi identificada em todo o país, como nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Ceará. Embora a mobilidade não tenha voltado aos níveis pré-pandemia, restaurantes das grandes cidades estão sempre lotados e, por exaustão ou tédio, os brasileiros estão se arriscando e viajando, o que também impulsiona a inflação de serviços.
“Mesmo com a queda dos casos e mortes, o vírus ainda está circulando amplamente”, disse Spilki. “Ainda existe o risco de vermos um pico se as pessoas não se protegerem.”