Opinião

Os efeitos positivos da “bolha” do Bitcoin – Parte 1

15 set 2018, 9:00 - atualizado em 12 set 2018, 19:33

Por Bernardo Faria. sócio da Foxbit

Quando a renomada revista The Economist publicou, em outubro de 2011, um artigo que alertava sobre “o estouro da bolha do Bitcoin”, o principal argumento utilizado pela publicação britânica era de que o preço do ativo digital havia despencado de um pico de US$33 por unidade para cerca de US$2,50. Chamou-se a atenção para o fato de poucos comerciantes no mundo aceitarem a criptomoeda como forma de pagamento e para uma plausível hipótese de que a forte valorização na cotação era decorrente de uma bolha especulativa.

Desde então, o Bitcoin e o ecossistema de criptoativos em geral experimentaram um punhado de ciclos de valorizações e correções pelo mercado. No final de novembro de 2013, por exemplo, a cotação do Bitcoin atingiu cerca de US$1.150 e quatro meses depois o ativo era negociado em torno de US$380. Em 2017, o Bitcoin iniciou um forte período de valorização em maio, quando valia em torno de US$1.300, e chegou a beirar os US$20.000 em dezembro do mesmo ano. Em fevereiro de 2018, o preço despencou para cerca de US$6.000, ensaiou retomar fôlego quando bateu quase US$12.000 no mesmo mês e depois voltou a cair. No momento que escrevo este artigo, ele vem experimentando uma retomada e é cotado ao redor dos US$8.000.

É inegável que muitas pessoas tiraram proveito da enorme assimetria de informação inerente a qualquer nova indústria e que novatos ansiosos pelo enriquecimento rápido saíram machucados destes períodos que envolveram excitação e esmorecimento.

Para além da questão do sobe e desce do preço dos ativos, alguns aspectos positivos gerados por estes movimentos especulativos costumam ganhar menos destaque em detrimento de manchetes e análises pessimistas e catastróficas.

A cada ciclo de geração de riqueza no segmento cripto, é perceptível que parte do valor capturado é reinvestido no próprio setor na criação de novos negócios criativos e inovadores, serviços, produtos e até mesmo tecnologias. Tal dinâmica também é visível nos negócios que surgem no Vale do Silício. Juntas, essas soluções do universo cripto fortalecem o ecossistema, trazendo investimentos e profissionais qualificados de outras áreas.

Como exemplos, cito o surgimento do Ethereum, a proliferação das plataformas de negociação on-line de ativos digitais, como a Coinbase, a Binance e a brasileira Foxbit, a oferta de serviços de custódia, desenvolvimento de software e aplicações a até mesmo as carteiras físicas de armazenamento de criptoativos, como a Ledger e a Trezor, que já ultrapassaram um milhão de unidades vendidas.

As supostas bolhas especulativas também ajudam a disseminar conhecimento e a difundir a tecnologia entre aqueles que nunca ouviram falar dela ou que possuíam conhecimento raso sobre o assunto. Para se ter ideia de como o “vírus” se espalhou em 2017, a página sobre Bitcoin na Wikipedia foi a 9ª mais lida em língua inglesa no ano passado.

Nestes períodos de exuberância irracional dos preços dos criptoativos, também explodem o número de reportagens na mídia e os blogs especializados sobre o assunto. De certa forma, estes ajudam a traduzir as complexidades do mundo cripto em explicações mais simples que buscam atingir um público não muito familiarizado com tecnologia e economia.

A partir do momento que as pessoas começam a ler e estudar sobre os protocolos criptográficos descentralizados, emerge um sem-número de temas que antes não eram discutidos pela sociedade. Dentre estes, talvez o mais importante seja o debate sobre o que é dinheiro e o papel dos governos e bancos centrais na definição das diretrizes de emissão e controle do dinheiro fiduciário.

Os aspectos relativos aos direitos dos cidadãos e cidadãs à privacidade e anonimidade também entram em pauta. Os criptoativos, notadamente o Bitcoin, oferecem alternativas diametralmente opostas e mais coerentes àquelas que a sociedade está acostumada.

E o que dizer sobre a discussão do papel dos intermediários na economia? O setor cripto coloca um novo desafio para a indústria financeira, que precisará repensar a sua função como prestadora de serviços. No final das contas, o Bitcoin, a tecnologia Blockchain e os diferentes criptoativos que vêm surgindo irão agregar mais fluxo para as instituições financeiras e serão a infraestrutura desse novo mundo. Novas possibilidades de serviços e produtos que ainda sequer conseguimos imaginar irão certamente emergir.

Os ciclos dos criptoativos estão criando um novo tipo de evento, que talvez poderíamos chamar de “micro bolhas”. Elas surgem, valorizam os projetos, trazem investimentos, claramente amadurecem o ecossistema como um todo, mas depois estouram, dando início ao uma nova fase de desenvolvimento.

É evidente que muitos projetos com menor tração tecnológica deixaram de existir ao longo dos últimos anos, mas as tecnologias mais sólidas, como o Bitcoin, continuam prosperando e aumentando o seu efeito de rede.

O final dos anos 90 e início dos anos 2000 nos mostraram que a famigerada bolha das empresas da era internet acabou gerando negócios que são extremamente importantes atualmente. O caso mais tangível talvez seja a Amazon. Em dezembro de 1999, a ação da empresa de Jeff Bezos era negociada por cerca de US$100. Em setembro de 2001, ela valia meros US$7. Hoje, ela vale mais de US$1.700.

A Amazon, que surgiu com a proposta de vender livros pela internet, passou a atuar nos mais diversos segmentos e, inclusive, entrega na porta da minha casa produtos alimentícios frescos. Quem poderia imaginar que uma empresa que viveu o período da bolha das “dotcom” ofereceria serviços e produtos tão diversos e seria uma das maiores corporações do mundo?

O desenvolvimento tecnológico, ainda mais quando se trata de algo tão disruptivo como é o caso dos ativos digitais, não é um passeio tranquilo à beira-mar. Ondas gigantes e até mesmo tsunamis fazem parte do horizonte. Estes eventos, contudo, levam as pessoas a expandirem o conhecimento e preparem suas embarcações para a travessia em direção a novos oceanos.

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