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Sua startup sabe contratar?

19 ago 2021, 16:32 - atualizado em 20 ago 2021, 12:02
Startup
Em nossas conversas de mentoria com os empreendedores das startups, a pauta mais comum relativa aos desafios de gestão é, adivinhem, a contratação e retenção de talentos (Imagem: Agência Câmara dos Deputados/Ilustração)

Temos aqui no BR Angels mais de 150 executivos de alto escalão associados ao nosso grupo de investimento-anjo com vivências e experiências em diferentes áreas de negócio, o que forma um ecossistema fértil para oferecer muito mais do que investimento financeiro, trazendo para mesa o cobiçado smart capital.

Em nossas conversas de mentoria com os empreendedores das startups, a pauta mais comum relativa aos desafios de gestão é, adivinhem, a contratação e retenção de talentos.

Só quem está no comando de uma empresa disruptiva conhece a dor e a delícia de empreender. Visto de fora, pode parecer que quando uma startup recebe investimento seus problemas acabaram e agora o empreendedor tem disponível tudo que precisa para escalar, ou seja, dinheiro em caixa. Ledo engano. Quando o aporte baixa na conta corrente as dores estão, sentimos informar, apenas começando.

Um levantamento feito pela plataforma de mentoria online nos EUA MicroMentor descobriu que as startups que passaram pelo processo aumentaram o faturamento em 83% contra 16% das demais e apresentaram uma taxa de sobrevivência mais alta – 83% a 74%.

Uma pesquisa realizada pela Gama Academy, escola focada em profissões do futuro, nos Estados Unidos, levantou a causa mortis de 46 empresas.

O estudo, batizado sugestivamente de Cemitério de Startups, apontou que o principal motivo de fracasso foi a formação do time, seguido pelo modelo de negócios.

Como pontua Fernando Medina, CEO da Luandre RH e também membro associado do BR Angels, se há algo em comum na vida de quem empreende é a luta para recrutar corretamente.

“Os problemas são parecidos, como a dificuldade de estruturar uma política de cargos e salários e não saber priorizar quais recursos humanos são mais urgentes e essenciais pro negócio”.

Medina tem toda razão. Montar o time certo, que vai agregar valor à empresa e permitir que ela cresça e obtenha sucesso, é um perrengue que não faz distinção a qualquer empreendedor. E quando se trata de atrair profissionais gabaritados para atuar na cultura de uma startup o desafio é infinitamente maior.

Mas então, por onde começar?

Em primeiro lugar, esqueça aquele perfil típico dos filmes de cowboy, o lobo solitário, que resolve tudo sozinho à la John Wayne e Clint Eastwood.

Para liderar uma startup de sucesso, é preciso, no mínimo, um tripé bem sólido: o empreendedor idealizador, que tem o sonho e as ideias; uma pessoa forte na área de tecnologia, já que a maioria das startups são criadas em cima de uma solução tecnológica; e alguém que saiba vender bem na linha de frente.

Imagine o desenho de um triângulo com vértices para administração/finanças, outro para tecnologia, outro comercial e o visionário empreendedor ao centro.

Este é o time de alicerce de uma startup.

A batalha por talentos é ainda mais sangrenta quando é preciso contratar profissionais para a área de tecnologia. Não é segredo para ninguém que há grande escassez de mão de obra qualificada. O déficit de profissionais de TI para vagas abertas no Brasil deve chegar a 408 mil até 2022. As estimativas são da Softex, organização social voltada ao fomento da área de TI.

A tarefa de encontrar mão de obra qualificada no setor já era dura antes da pandemia. Agora, com a aceleração da digitalização das empresas, tornou-se uma missão quase impossível.

Segundo o Banco Nacional de Empregos, o número de vagas em TI em janeiro de 2021 era 110% superior ao período do ano anterior. Levantamento da Catho é ainda mais assustador: as ofertas em São Paulo cresceram 600% no ano passado.

Em tempos de alta demanda, as empresas precisam se tornar cada vez mais atraentes. Os salários subiram quase 20% em média.

Como, em geral, startups não costumam nadar em dinheiro, fica complicado entrar em “leilões” baseados em salários altos, competindo com os cofres de multinacionais ou os unicórnios do momento.

A difícil equação, no entanto, não significa que o empreendedor tenha de contratar “o primeiro profissional” que entrar pela porta (ou, nos dias atuais, pela tela).

Pelo contrário. Em uma corporação de grande porte, contratações erradas têm valor relativo muito menor se comparado a uma empresa que esteja no início de sua trajetória, podendo custar sua sobrevivência.

É mandatório investir tempo e energia em processos seletivos melhor estruturados que tragam para dentro pessoas comprometidas com o objetivo, com o propósito, e que também sejam capazes de se apaixonar pela missão do negócio.

Cuidar muito bem da porta de entrada de uma startup garante uma equipe motivada a contribuir para o crescimento.

Se não tem bolsos fundos, o empreendedor precisa conquistar os candidatos com planos concretos, mostrando que a empresa resolve uma demanda real do mercado e, com um trabalho bem feito, criará condições para um crescimento acelerado e um futuro promissor.

É por isso que faz sentido dispor de um Stock Option Pool, ou seja, um estoque de 15% a 25% de opções reservadas aos colaboradores.

Caso a empresa consiga atingir suas metas e lá na frente abrir capital, os funcionários terão direito a ações. Uma forma justa de engajar as pessoas no sonho do empreendedor, sabendo que, lá na frente, elas também serão recompensadas financeiramente, além da satisfação de fazer parte de um projeto vencedor.

Vale aqui uma ressalva. Um grande erro comum é trazer alguém muito experiente do mercado, por um salário que a empresa não pode arcar e, por isso, oferecer uma sociedade.

Se der errado, como demitir um sócio? É feito aquele time mediano que de repente contrata um medalhão do futebol internacional cheio de regalias. Como isso afeta o moral do elenco?

E, pior, será que produz resultado efetivo no desempenho?
Então, qual seria esse perfil?

A busca deve se concentrar nos “startupeiros”, aquele profissional disposto a meter a mão na massa, com flexibilidade e capacidade de se adaptar às necessidades da startup.

Nem sempre a estrutura da empresa terá as condições ideais para que o colaborador faça somente a especialidade dele. Na escassez de recursos, há que se saber improvisar na resolução de problemas, ainda mais se estivermos falando de uma proposta disruptiva para a qual não há manual.

Outro ponto a ser considerado é a capacidade de realização – e isso vale tanto para o colaborador como para o próprio fundador.

O estilo Professor Pardal, cheio de ideias geniais, não basta. É necessário sair da garagem, colocar as ideias em prática e ter boa comunicação para falar com clientes e investidores. É cabeça nas nuvens e pés no chão!

Os estudos de consultorias debruçadas sobre como será o futuro do trabalho têm indicado a crescente valorização dos soft skills.

Nas mentorias, dizemos sempre que a parte técnica dá para ensinar, mas desenvolver inteligência emocional é um processo de longo prazo normalmente incompatível com o dinamismo de uma startup. É sempre bom lembrar a velha frase: “as empresas contratam pelo currículo e demitem pelo comportamento”.

Por isso é tão importante selecionar talentos alinhados à cultura da startup e evitar os vaidosos em excesso que não aceitam perder uma discussão. Tanto o colaborador como o empreendedor têm de saber pivotar.

Uma startup é, em essência, um laboratório de ideias, de constante experimentação, em que o erro faz parte da equação. Insistir em algo que não está funcionando pode, no final das contas, inviabilizar a empresa.

Mentorias para formação do time devem ser sempre consideradas estratégicas no processo de crescimento das startups, como ocorre nas investidas pelo BR Angels.

Como já sublinhamos no início do artigo, não aportamos só capital financeiro na empresa. O principal é o capital intelectual, a transmissão de conhecimento e experiência para os empreendedores.

Dizemos sempre que quem ganha as corridas são os jóqueis e não os cavalos. É melhor um bom jóquei com um cavalo mais ou menos do que um bom cavalo com um jóquei despreparado. Os carros da Fórmula 1 são praticamente iguais. O que ganha a corrida é o piloto.

Artigo escrito por Orlando Cintra e César Souza, CEO do Grupo Empreenda, consultor e associado BR Angels