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Orlando Cintra: Sim, toda empresa precisa de um bom Conselho

08 out 2020, 15:03 - atualizado em 08 out 2020, 19:12
Conselho-Empresas
“A pandemia colocou à prova os conselhos e líderes das organizações e mostrou que se deram melhor aquelas empresas que estavam mais preparadas para enfrentar a crise”, afirma o colunista (Imagem: Pixabay)

Muita gente pensa que é fácil a vida de um conselheiro. Que basta ficar no conforto de seu notório saber e dar palpites na vida corporativa dos outros. Mas não é nada disso.

Seja ocupando uma cadeira no Conselho Consultivo ou Administrativo, um profissional nesta posição carrega enormes responsabilidades e, se assumir uma postura ativa junto à organização, pode desempenhar um papel decisivo nas tomadas de decisões mais estratégicas e na mitigação de riscos.

Há, claro, conselheiros mais figurativos e que não necessariamente contribuem para manter o negócio nos trilhos, situação em que é melhor substituir por alguém disposto a efetivamente colaborar.

Este é um ponto que, muitas vezes, não é levado em consideração – o Conselho (ou a falta dele) pode ser fatal para levar seu negócio ao status desejado.

Por isso, se você é sócio, fundador ou Presidente do Conselho na sua organização é essencial pensar e convidar nomes que possam te apoiar em sua jornada.

Eles poderão ser decisivos tanto em agregar capital intelectual quanto em abrir portas e chancelar sua empresa junto a seus stakeholders – 2 excelentes razões para não abrir mão de um time respeitado de conselheiros.

A pandemia colocou à prova os conselhos e líderes das organizações e mostrou que se deram melhor aquelas empresas que estavam mais preparadas para enfrentar a crise.

Mas em muitas delas ainda há um longo caminho a percorrer, conforme aponta a pesquisa “COVID-19 (Coronavírus), Gerenciamento de Crises e o Papel dos Administradores nas Organizações, realizada pelo IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa)”.

Segundo o estudo, 48,3% dos respondentes disseram que suas empresas “não possuem políticas e procedimentos formais, aprovados pela diretoria e/ou conselho de administração, que visem direcionar a atuação da organização durante períodos de crise”.

Outro dado que reflete esta preocupante realidade: apenas 12% apontaram o “estabelecimento de parâmetros e indicadores visando à atualização frequente do conselho de administração” sobre quais aspectos o Conselho demandou ações dos executivos no enfrentamento da crise, deixando evidente a pouca importância dada ao acompanhamento de números que demonstrem a real situação e o impacto da crise nos negócios.

“Os novos desafios trazidos pela pandemia exigem que as grandes empresas implementam uma cultura agile como a das startups”, observa (Imagem: Reuters/Manuel Silvestri)

Bruno Serapião, Presidente do Conselho da Hidrovias do Brasil (HBSA3) e Companhia Brasileira de Offshore (CBO), não deixa dúvidas sobre o papel indispensável do Conselho, especialmente em períodos de cenários adversos:

“Os Conselhos são importantes para sinalizar ao time de gestão quais são os potenciais riscos e impactos no negócio de forma sistêmica, uma contribuição essencial para garantir alinhamento na estratégia ao atravessar tempos difíceis”.

Compartilho aqui sete dicas (ou conselhos, como preferir, para estruturar um Conselho capaz de fazer a diferença na sua empresa.

1 – Leve em conta a diversidade de experiências. Lembre-se que precisará de ajuda em diversas frentes – levantamento de capital, gestão financeira, marketing, recursos humanos, jurídico; não são poucos os desafios para tocar um negócio com solidez, então forme um Conselho heterogêneo.

É bom observar também que o atual cenário pós-Covid e a aceleração da transformação digital criou uma nova demanda para os Conselhos. Com a inovação na pauta do dia, as empresas estão em busca de nomes com bagagem não somente em grandes corporações, mas também, e especialmente, no ecossistema de startups.

Os novos desafios trazidos pela pandemia exigem que as grandes empresas implementam uma cultura agile como a das startups, criando um ambiente fértil à inovação. Por isso, torna-se essencial escutar conselheiros que tenham visão sobre o presente e, acima de tudo, o futuro.

2 – Não permita que um conselheiro atue como uma ‘sombra’. Deixe muito claro quais os papéis de cada um na organização. Ao conselheiro cabe oferecer mentoria e agregar sua visão ao negócio, mas não é sua função assumir a operação, o que pode gerar conflitos internos e passar um recado errado de que seu time não reúne talentos preparados e suficientes para tocar o dia a dia da empresa.

3 – Esteja pronto para ouvir as verdades. O bom conselheiro é aquele que diz o que tem que ser dito, doa a quem doer. Ele deve apontar quais são suas fragilidades e onde você precisa de ajuda para não deixar seu negócio em risco. Por isso, é recomendável que não convide amigos e familiares para compor seu Conselho, já que eles podem incorrer no grave erro de passar a mão na sua cabeça.

4 – Remunere adequadamente e valorize seus conselheiros. Tome cuidado para não cair na máxima “o barato sai caro”. É melhor investir em quem possa te apoiar efetivamente em decisões de alto risco a trazer alguém apenas para enfeitar cadeira no Conselho. Um palpite errado pode te custar muito, talvez milhões. Você não se submeteria a uma cirurgia no coração com um médico baratinho, não é mesmo? Da mesma forma, não arrisque a saúde da sua empresa com conselheiros sem credenciais para te orientar.

5 – Fique atento à governança e ESG. Não esqueça também de analisar nomes que possam contribuir para estabelecer e fortalecer suas políticas de governança e suas práticas ESG, cada vez mais relevantes aos olhos de investidores e consumidores.

“Você, dono de uma empresa, acionista ou mesmo Presidente do Conselho, não está construindo uma empresa apenas para satisfazer seu ego”, disse (Imagem: Divulgação/Amur Capital)

Carlos Leal Villa, Presidente do Conselho da Solvi Participações, sublinha este ponto: “Através de seus conselheiros, o Conselho deve propiciar a profissionalização da empresa pautada numa excelente governança, permitindo assim sua perenidade e sustentabilidade (ambiental, econômica e social) ao mesmo tempo em que gera riquezas para a sociedade e seus acionistas”.

6 – Implemente (de fato) os bons conselhos. Se você montou um Conselho apenas para divulgar na mídia e não está disposto a escutar suas sugestões, não perca seu tempo e nem o deles. É no mínimo um baita desperdício (e falta de respeito) jogar no lixo ideias de gente talentosa que se dispôs a te ajudar.

Você, dono de uma empresa, acionista ou mesmo Presidente do Conselho, não está construindo uma empresa apenas para satisfazer seu ego. Lembre-se que a organização não é construída para ser sua, mas sim de toda sociedade. E bons conselhos podem te levar a lugares que nunca sequer imaginou.

7 – Seu Conselho não precisa ser uma Constelação. Ter um time de popstars no seu Conselho pode te trazer alguma visibilidade, claro, mas se estiverem lá apenas para sair na foto e enfeitar seu website, a imagem que poderá construir é de quem faz muito oba-oba e não coloca as mãos na massa ao lado de gente que transforma e realiza.

Nada contra trazer para mesa estrelas que são unanimidades no mundo dos negócios, mas não terão nenhuma serventia se não agirem efetivamente como bons conselheiros. Melhor mesmo é trabalhar com quem você tem química, que firme um compromisso de longo prazo e demonstre tanta paixão e crença por seu negócio quanto você mesmo.

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Em um ano tão desafiador quanto 2020, estar aberto a escutar profissionais que já quebraram muita pedra é, no mínimo, demonstração de humildade e cautela. Isso não quer dizer que você deve deixar de ouvir a própria voz da razão. Não esqueça que o boleto não virá no nome do seu conselheiro, mas no seu próprio.

Como bem pontuou Shakespeare, “aceita o conselho dos outros, mas nunca desistas da tua própria opinião”.

Orlando Cintra é Founder & CEO do BR Angels, grupo de investimento anjo formado por CEOs e empreendedores.