Operador suíço pode ser elo entre fraudes em dois continentes
Um misterioso operador do mercado financeiro da Suíça pode ser o elo entre acusações de abuso de informação privilegiada nos EUA reveladas no mês passado e investigações aparentemente não relacionadas no Reino Unido e na França.
Os casos em Nova York envolviam um profissional do Goldman Sachs Group, um grego dono de restaurante e um operador do mercado financeiro que também joga pôquer. Contudo, várias acusações mencionavam um operador suíço de identidade não revelada. Foram usados codinomes diferentes e não está claro se as referências são ao mesmo indivíduo, mas o trader é descrito em termos semelhantes.
Um operador chamado Marc Demane-Debih, residente em Genebra, foi apreendido no ano passado na Sérvia com um mandado de prisão dos EUA por supostas fraudes com valores mobiliários e extraditado para Nova York em maio, segundo a porta-voz de um tribunal de Belgrado.
O nome dele não aparece em nenhuma das acusações, nem em qualquer registro público ou lista penitenciária, o que indica que pode estar cooperando com as autoridades. Um porta-voz da Promotoria de Nova York se recusou a comentar o pedido de extradição ou a identidade do operador suíço citado nas acusações.
As tentativas de contato com Demane-Debih não deram resultado. No entanto, entrevistas com pessoas familiarizadas com Demane-Debih fizeram a conexão entre ele e os casos dos EUA e com alguns integrantes de uma suposta rede de informações privilegiadas na França. Pelo menos uma pessoa acusada na França estava em contato com Walid Choucair, declarado culpado em Londres em junho de negociar informações privilegiadas.
Choucair, por sua vez, é um dos vários operadores de Londres que participam dos mesmos círculos sociais que Joseph El-Khouri, o operador e jogador de pôquer indiciado em Nova York, de acordo com fontes com conhecimento do assunto.
Rede de insiders
As acusações fornecem pistas sobre a atuação de uma rede de operadores em dois continentes que cultivavam laços com banqueiros, supostamente faziam apostas com base em informações obtidas junto aos mesmos e compartilhavam dicas em reuniões presenciais ou aplicativos criptografados como Signal ou WhatsApp.
Os integrantes da rede frequentemente passavam informações a jornalistas, na esperança de causar movimentos súbitos nos preços de ações.
Os grupos eram formados com base em afinidades ou localização. Muitos dos operadores europeus curtem a noite em estabelecimentos caros no bairro de Mayfair, em Londres, ou festas de verão em iates ancorados em Mônaco, segundo alguns deles.
“Esse tipo de rede de informações privilegiadas, que todos suspeitamos que exista, é extremamente difícil de descobrir”, afirmou o advogado Jean-Philippe Pons-Henry, que já trabalhou na comissão reguladora de valores mobiliários da França. “É preciso envolvimento de autoridades criminais para atividades como escutas telefônicas e agências de supervisão do mercado financeiro com poderosas ferramentas de análise de transações. É preciso combinar esse conhecimento em várias jurisdições para chegar a uma rede de insiders.”
Demane-Debih foi conectado a pelo menos dois outros traders de Genebra suspeitos de negociação com base em informação privilegiada.
Documentos judiciais no Reino Unido fazem ligação entre ele e Lucien Selce e Alexis Kuperfis, de acordo com uma pessoa familiarizada com o assunto. Selce e Kuperfis estão entre os sete indivíduos acusados na França de negociar papéis com informações privilegiadas sobre a aquisição da empresa química americana Airgas pela francesa Air Liquide, em 2015.
Eles contestam as acusações e nenhum julgamento foi solicitado. Advogados de ambos se recusaram a comentar.
Além de conhecer Selce e Kuperfis, Demane-Debih também conhece o operador londrino Eaitisham Ahmed, de acordo com documentos em um processo no Reino Unido. Ahmed, apelidado Shami, foi multado por abuso de informação privilegiada na França no ano passado em um processo civil sem relação com a investigação em torno da Airgas. A reportagem não conseguiu contato com ele.