Comprar ou vender?

“Olhar o Ibovespa é tentar prever o futuro. Eu compro empresas”, diz gestor da Trópico

29 nov 2017, 7:15 - atualizado em 29 nov 2017, 9:42

Investir em empresas com o objetivo de ganhar valor ao longo do tempo com melhores decisões estratégicas e uma participação mais ativa na administração não pode ser comparado com a referência tradicional do mercado, o Ibovespa. Esta é a avaliação do gestor da Trópico Investimentos, Fernando Camargo, como explica em uma entrevista concedida ao Money Times.

Defensor da filosofia value investing, ele lembra que muitas vezes as small caps ou até micro caps têm uma dinâmica própria, de baixa liquidez, e cujo valor a ser destravado não segue o mesmo ritmo do benchmark. “O Ibovespa é quase um dólar, que vê fluxos internacionais, e isso é mais loteria do que investimento. O que eu gosto de fazer é comprar uma empresa”, afirma.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Por que o Ibovespa não é referência?

Para começar, ele é montado em cima de premissas que têm a ver com fluxo e não valor. Pode-se dizer que é o oposto do valor e ao que você deveria fazer quando tem dinheiro. A ideia deveria ser a de buscar empresas boas para se ter segurança em relação ao valor futuro e saber se existe potencial de valorização ou não.

Se você investe em um fundo de valor, como um nosso, referenciar com o Ibovespa não tem nada a ver. Você compraria as empresas X, por exemplo? Pois é… todas elas faziam parte do Ibovespa? Por que então eu preciso comparar com isso? O Ibovespa, em 10 anos, não bate os fundos de valor.

O Ibovespa é como se todo mundo comprasse o mesmo peso do IPCA para ter a mesma inflação, mas as necessidades das pessoas são diferentes. Do meu orçamento, por exemplo, o tomate tem um peso menor e a gasolina muito maior do que o mesmo peso do índice. Quando você investe no Ibovespa é a mesma coisa.

Qual então seria uma boa referência?

Quando você faz um investimento no tempo a sua referência deveria ser a comparação com o quanto você ganharia ao ficar em casa sem fazer nada. Isso hoje seria algo em torno de 85% a 90% do CDI, no máximo. O incremental de ganho deveria ser a opcionalidade e o risco que se assume ao decidir não ficar em casa vendo TV.

A CVM, inclusive, diz que os fundos de investimentos para não-qualificados precisam ter um índice de benchmark de acordo com o fundo e muitos fundos de ações têm o IBX como referência. Para mim, é o mesmo do que comparar banana com quiabo. O válido seria por ao lado de um ativo sem risco mais um prêmio para assumir risco. O mais próximo a isso seria como ter a inflação mais algum valor, o CDI mais algum valor. Isso faz muito mais sentido.

O Ibovespa é quase um dólar, que vê fluxos internacionais, e isso é mais loteria do que investimento. O que eu gosto de fazer é comprar uma empresa. Ou seja, não me preocupa o fluxo que vem para o Brasil. Isso não é investir. Ibovespa é tentar adivinhar o futuro. Investir é participar da empresa.

Como precisa ser o perfil de um investidor que busca valor?

É um jogo que ganha mais na cabeça do que no mercado. Não precisa ter pressa para comprar, mas pode ter para sair. Comprar bem é fundamental. Se você comprar uma ação cara esperando que ela dê retorno no futuro, isso aumenta muito o risco do investimento.

Outro ponto que é importante ser destacado é que volatilidade não é risco. Risco era comprar uma empresa do Eike Batista sem receitas e que valia R$ 1 bilhão. Preço é o que você compra, valor é o que você leva, como disse Warren Buffett.

O modelo de portfólio do Markowitz e o CAPM (Capital Asset Pricing Model) fala muito sobre reduzir o risco com a volatilidade, mas tem algumas premissas nesta visão que não servem para o mercado brasileiro. A volatilidade constante ao longo do tempo, por exemplo, só é possível ser vista em papéis líquidos e que são mais caros.

Além disso tudo, investir em empresas é um processo de paciência. Ou seja, você procura ser um acionista e não ver para onde vai o mercado. Para isso é preciso ter caixa livre. Desta forma, quando por algum motivo exógeno a empresa que você está olhando despenca, você precisa ter liquidez para entrar na hora certa. Isso é fundamental.

Fundos importantes nos EUA têm, normalmente, muito caixa. Ele sabe que ganha dinheiro quando o mercado cai. Lá fora, caixa remunera muito pior do que aqui no Brasil. Com isso, deveria ser prioritário o fundo aqui ter caixa.

Quanto você mantém em caixa?

Nunca estou totalmente alocado. O nível confortável que busco está entre 15% e 20%, mas isso pode mudar ao longo dos anos. Isso tem menos a ver com a gestão de portfólio, porém mais com experiência. Olhando para trás, faria diferença ter tido mais caixa no passado. As pessoas compram a ação esperando que ela suba e aí alocam todo o caixa. Quando ela cai, não têm dinheiro para comprar. Eu demoro meses para montar uma posição. O que eu posso prever é estimar o quanto ela vale e a que preço eu posso comprar.

Quantas empresas você está alocado agora? 

Temos cerca de 9 empresas diferentes em nossos fundos. São empresas com bons resultados e boas perspectivas. Não estou comprando coisa cara. Não acho que a diversificação dilui risco, por exemplo. Há um limite. Se você comprar mais empresas do que consegue acompanhar, aí sim você aumenta o risco. O Buffett tem uma frase ótima: A diversificação só serve para quem não sabe o que está fazendo. Claro que existe um grande nível de incerteza, mas das empresas que eu invisto tenho um nível de conforto adequado para onde elas estão indo.

Fundador do Money Times | Editor
Fundador do Money Times. Antes, foi repórter de O Financista, Editor e colunista de Exame.com, repórter do Brasil Econômico, Invest News e InfoMoney.
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