Opinião

O Tucano, o Médico e o Monstro

20 jan 2018, 11:48 - atualizado em 20 jan 2018, 11:48

Por Terraço Econômico

O clássico do escritor escocês Robert Louis Stevenson, lançado no Brasil sob o título “O Médico e o Monstro”, explora de maneira inédita e soberba a dualidade da alma humana, com suas partes boa e má. Na trama, Dr. Henry Jekyll é um médico obcecado pela possibilidade de isolar o quinhão bom que existe em cada pessoa, libertando-o de sua contraparte ruim. Seus experimentos acabam por despertar seu alter ego, Mr. Edward Hyde, um monstruoso assassino.

A temática da bipolaridade voltou a ser tratada diversas vezes na ficção. Na triste realidade da política brasileira, personagens com vícios e virtudes acentuadas, do tipo que “rouba, mas faz”, também não são raros. Mas poderia um partido político ser dotado de duas personalidades altamente antagônicas?

O PSDB nasceu no final dos anos oitenta, com viés ideológico social-democrata e traços de liberalismo econômico. Além de contar com nomes proeminentes no cenário político, como Mário Covas e Franco Montoro, o partido se notabilizou por possuir os melhores quadros técnicos em diversos campos, incluindo economia.

Essa combinação permitiu que, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, fosse implementado o Plano Real, que livrou o Brasil de mais de uma década de inflação fora de controle. Além disso, foi estabelecido o chamado tripé macroeconômico, com câmbio flutuante, regime de metas de inflação e superávits primários, que possibilitou ao Brasil aproveitar os bons ventos internacionais da primeira década dos anos 2000, atingindo um crescimento médio do PIB superior a 3% ao ano. Não é exagero dizer que o PSDB foi o médico que curou o Brasil de suas mais severas mazelas econômicas à época.

Suas virtudes diferenciam os tucanos dos seus pares no pódio das grandes legendas nacionais, PT e PMDB. Seus vícios, porém, são absolutamente ordinários. A Operação Lava-Jato jogou luz sobre o modus operandi, digamos, pouco republicano de algumas das mais relevantes figuras do partido na atualidade e, principalmente, do seu presidente, Aécio Neves. Diante das fortes evidências, o PSDB contentou-se com o seu licenciamento da presidência (revogado à sua conveniência) e apoiou-o na votação do Senado que suspendeu a decisão do Supremo Tribunal Federal de afastá-lo do mandato e impor-lhe recolhimento noturno.

Concomitantemente, o partido claudicou em relação ao desembarque do (mais que suspeito) governo Temer. Se ainda restava alguma dúvida sobre sua leniência com relação a desvios de conduta, os tucanos escolheram o delatado Geraldo Alckmin como seu presidente, tornando-o pule de dez para representá-los nas eleições presidenciais do ano que vem. O PSDB é um dos monstros da chamada “Velha Política”.

No enredo da ficção, diante da incapacidade de controlar as aparições de sua personalidade maligna, Dr. Jekyll comete suicídio. Na vida real e de viés, ou os tucanos realizam a ambição do médico e isolam sua porção nociva, ou serão mortos por ela.

 João Marco Cunha – Mestre em economia pela FGV-Rio e Doutor em Engenharia Elétrica pela PUC-Rio.

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