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O tarifaço de Donald Trump e a adição de ‘outro patamar’ de volatilidade ao agronegócio

14 abr 2025, 12:09 - atualizado em 14 abr 2025, 16:14
donald trump tarifaço
(Foto: Reuters/Leah Millis)

Há exatos 80 anos, nos idos em 1945, o bombardeiro norte-americano, chamado “Enola Gay” alçava um voo que entrou para a história, já que lançou bombas atômicas sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, para provocar uma hecatombe nuclear no então inimigo norte-americano, selando o fim da Segunda Guerra Mundial e, de quebra, avisando ao mundo que ele tinha novo “dono”, os Estados Unidos da América

No último dia 2 de abril, um “canetaço” ou “tarifaço” do presidente dos EUA, Donald Trump apelidado pelo próprio como “O Dia da Liberdade”, teve, em sentido figurado, claro; o mesmo impacto do artefato nuclear utilizado no final da Segunda Guerra Mundial.

Porém, o alvo principal dessa vez – além da tentativa de avisar ao mundo que o “dono” dele continua por aí – era mandar pelos ares todo o sistema internacional sobre os quais as trocas financeiras e, portanto, a economia global, via de regra, se apoia desde o final da Segunda Guerra Mundial, e que fora engendrado pelos próprios norte-americanos a partir de Bretton Woods.

O tarifaço de Donald Trump e a economia global

Em linhas gerais, o tarifaço compreendeu a estipulação de tarifas de imposto de importação pelos EUA na aquisição, por importadores norte-americanos, de produtos oriundos dos mais diversos rincões do planeta terra.

Essa tarifa adicional, variou de 10%– alíquota mínima, aplicada aos produtos oriundos do Brasil, por exemplo – até o valor de tarifas adicionais de que totalizaram quase 50% – no caso de Camboja e Vietnã, por exemplo – do valor dos produtos importados pelos EUA.

Passando pela União Europeia, que recebeu tarifas de cerca de 20% e indo até a China na alíquota de 34%, não faltou retórica, nem tarifa para ninguém na investida “Trumpista” contra o sistema de comércio e produção globais estabelecidos desde o pós-guerra.

Claro que, o primeiro efeito dessa ação, além da perplexidade, retaliações e confusão geral – já que a incerteza nos preços com acréscimo abrupto de custos fiscais redunda em “choque de oferta” e, portanto, aumento de preços na avaliação da maioria dos economistas – é o seu potencial impacto nos índices de inflação da maioria das economias do globo terrestre.

Conforme renomados economistas, isso deve redundar em ineficiência das políticas monetárias praticadas prelos bancos centrais ao redor do mundo diante de generalizado aumento de preços de matérias-primas e produtos acabados, repercutindo em pressões inflacionárias de toda ordem.

No segundo momento, possivelmente deve resultar em algum nível de negociação, como parece querer o presidente norte-americano no seu afã de ser reconhecido o “libertador” da economia norte-americana dos grilhões do globalismo etc., mas com impacto brutal nos valores dos ativos financeiros e não-financeiros, níveis de atividade, oferta de crédito e na volatilidade das economias em nível internacional.

Começo do fim da “globalização” ou do chamado “padrão dólar”?

Diante do fato criado, esse colunista teve de parar, pesquisar, estudar e refletir, para trazer para essa coluna algumas “tintas” e nuances dessa nova “hecatombe” para tentar ajudar em algum nível na compreensão por parte do nosso leitor, de alguns impactos da canetada do Trump, principalmente no agronegócio brasileiro que já vinha sofrendo por vários outros fatores sobre os quais temos nos debruçado ultimamente nessa coluna.

Sinceramente, nem se esse colunista tivesse bola de cristal nas mãos conseguiria avaliar todos os cenários possíveis a partir de então, mas é certo que o incremento da volatilidade e dos riscos de negócios em geral, também afetará o agronegócio brasileiro já que exportamos nossos principais produtos da pauta de exportações do agro, não só para os EUA – com a tarifa adicional de 10% agora – mas para o mundo todo, razão pela qual um choque de oferta dessa magnitude pode impactar, claro, ainda mais os preços de insumos e produtos agropecuários, como de fato tem ocorrido desde então.

Afora isso, a modificação abrupta nos parâmetros de custos de produção nas cadeias globais, além das promessas de retaliação impactarão nos parâmetros de negociações que, a partir da cartada final do presidente norte-americano – mais parecido com um “tiro no pé”, na singela avaliação desse colunista –, sem falar na substituição, no futuro próximo, do “Padrão Dólar” nas referências de trocas internacionais por algo que sequer podemos imaginar o que pode ser adiante.

Volatilidade 4.0 na economia e no agronegócio

A única coisa que podemos dizer por agora e os mercados internacionais já sentem desde o último dia 3 de abril esses efeitos perversos que esse ato unilateral adiciona. Um grau de volatilidade inimaginado nos mercados, até mesmo para quem, como esse colunista, já trabalhava com algum “Trumpismo” no radar.

O ponto é que agora a volatilidade foi para “outro patamar”, como diria um famoso atacante de futebol de um grande clube brasileiro, criando-se uma espécie de “Volatilidade 4.0” aos negócios e preços de ativos, adicionando insegurança institucional e, portanto, gerando mais insegurança jurídica às relações de comércio internacional – além das inferências de crédito e afrouxamento de política monetária local – para contrapor ao choque de oferta, em um “estilingue” que somente aprofunda os potenciais impactos negativos nas cadeias globais de produção e comércio de produtos, inclusive os agropecuários.

Nesse cenário extremo, se considerarmos uma economia brasileira que se baseia em superávits de balança comercial de exportação do agronegócio para administração de preços e de atividade econômica interna, como eventual base de um ajuste fiscal que insiste em ser propalado mas, na prática, não tem sido praticado pelo Governo Federal, como temos dito daqui dessa coluna, podemos ter efeitos nocivos de oscilação de câmbio – com exportação menor e com menor entrada de divisas para a balança comercial do país -, redundando em diminuição de atividade econômica interna e mais situações de quebras de contrato e retração de investimentos no agronegócio.

Super safra ainda é alento apesar do tarifaço

Dito tudo isso, mesmo adicionando-se incertezas em um cenário em que irrompem renegociações – forçadas por pedidos de RJ ou não – ultimamente no agronegócio e em que as taxas de juros estão em patamares altíssimos, com Selic de 14,25% ao ano, comprimindo o orçamento federal na equalização do Plano Safra 2025/2026 e dificultando-se a disponibilização de mais recursos para o financiamento do agronegócio brasileiro, o alento continua a vir do campo.

A colheita da nova safra recorde de cerca de 325 milhões de toneladas, já colhida em boa parte do país, continua a confirmar as expectativas e os preços, apesar da volatilidade e alta, já que ainda recuperam parte da margem do produtor para alguns dos principais produtos agropecuários de nossa pauta de exportação.

Daqui para frente, devemos ficar ainda mais atentos aos reflexos dessas questões e desdobramentos desse tarifaço no mercado, já que pelo visto, o preço da “liberdade” de Donald Trump, pode requerer ainda mais vigilância e gestão ao produtor rural em relação às questões que deve tratar no dia a dia da gestão dos seus negócios no campo

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André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
andre.passos@moneytimes.com.br
André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
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