O que trava a assinatura do acordo União Europeia-Mercosul? ‘Não há embasamento para críticas ao Brasil’
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou na última quarta-feira (27) que espera que o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia seja assinado até o fim deste ano. Ainda assim, o tema encontra muita resistência por parte do lado europeu.
Recentemente, o Brasil coleciona conflitos com empresas da França, como Danone, Carrefour (CRFB3) e Tereos.
Na semana passada, o CEO da Tereos, Olivier Leducq, havia criticado o acordo e questionou a concorrência desleal com os produtores agrícolas europeus. Apesar de recuar sobre a fala, Leducq mantém sua visão de que o acordo é prejudicial aos agricultores da Europa.
Já o CEO Global do Carrefour, Alexandre Bompard, disse que não iria comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul. A fala levou frigoríficos como a Minerva Foods (BEEF3), JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3) e Masterboi a interromper seu fornecimento de carne ao Carrefour. O boicote levou o grupo a recuar na sua postura, lamentar ter “colocado em dúvida sua parceria com a agricultura brasileira”
E no final de outubro, foi divulgada uma nota da Danone e de outras empresas do setor europeu que optaram por interromper a aquisição de soja do Brasil. A medida foi vista como desproporcional pelo Ministério da Agricultura e gerou atrito dentro do setor produtivo.
O que impede o acordo entre Mercosul e União Europeia?
De acordo com pesquisador da FGV, Leonardo Munhoz, o que impede o acordo entre Mercosul e UE de avançar fica por conta do setor rural europeu, principalmente da França.
“Desde 1999, os parlamentares franceses fazem pressão para o acordo não se concretizar, isso porque o agro europeu, em especial da França, sempre foi muito protegido por subsídios e nunca foi muito competitivo com um ambiente de livre-comércio. O acordo representaria uma maior competição externa, o que causa insegurança para o setor na Europa”, diz.
Segundo Munhoz, as declarações de empresas francesas sobre o setor no Brasil não contam com embasamento técnico. Para ele, dizer que falta sanidade ambiental e sanitária ao Brasil é apenas uma desculpa para tentar cimentar barreiras protecionistas.
“Caso o acordo seja aprovado, o agro brasileiro vai ganhar com isso, enquanto as empresas que produzem insumos na Europa vão ganhar com o agro do Brasil, já que não produzimos insumos aqui. Tudo isso somado, para o futuro, precisamos melhorar questões como combate a desmatamento legal, implementação do Código Florestal e a rastreabilidade dos produtos”.
A legislação ambiental brasileira
Leandro Gilio, professor e pesquisador especializado em agronegócio no Centro de Agronegócio Global do Insper, reforça que o agro brasileiro atende os mais altos padrões de exigência e excelência internacional em sanidade e qualidade, exportando para 200 países.
“Com relação à área ambiental, ainda temos vários pontos a melhorar – isso é notório -, mas a maior parte do agro brasileiro, notadamente o agro exportador, segue o Código Florestal Brasileiro – um dos mais restritivos do mundo -, e não necessita abrir áreas florestais para se expandir”.
Daniel Vargas, professor da escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, explica que a sustentabilidade é uma corrida por qualidade e em sua visão, não podemos perder a perspectiva da realidade.
Ele recorda que o Brasil conta com 81% de sua matriz energética renovável, enquanto a Europa tem 17% (se incluirmos o gás natural, 41%).
“O Brasil possui 66% do território em vegetação nativa, 1/3 disso dentro da propriedade, e a Europa, 4% (se incluirmos replantio, em torno de 40%). Lá, o produtor preserva 4% da propriedade, mediante pagamento. Aqui, o produtor protege de 20% a 80%, sob o seu risco exclusivo. Temos nossos defeitos e precisamos combatê-los, mas somos muito mais exemplo do que problema”, explica.