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O que esperar da nova regulação de Banking as a Service?

04 ago 2024, 11:00 - atualizado em 02 ago 2024, 12:08
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O banking as a service ajuda a promover o surgimento de novos entrantes no mercado financeiro, alavancando as inovações. (Imagem: Unsplash/Erik Mclean)

Há pouco menos de cinco anos, em novembro de 2019, Angela Strange, da empresa de venture capital Andreessen Horowitz, dizia uma das frases mais famosas — e seguidas — do mercado as a service: “toda empresa, neste momento, deveria estar pensando em se tornar uma fintech“.

As palavras de Angela pareciam finalmente acordar um mercado que ainda não enxergava o potencial do modelo de banking as a service e que ainda o encarava como algo instável, até difícil de entender e quase uma “moda”.

Coincidentemente, dois meses depois, nascia a Bankly e felizmente, quase três anos depois, os principais unicórnios brasileiros se consolidavam como provedores de banking as a service.

Em vários artigos meus, desde o início desta coluna, tenho falado das vantagens do modelo, como, por exemplo, a aceleração de tipos de negócios, a automação de fluxos de pagamento, a democratização do acesso a serviços financeiros e a maximização de jornadas já existentes, aumentando margens e gerando novas linhas de receita.

Além disso, o BaaS ajuda a promover o surgimento de novos entrantes no mercado financeiro, alavancando as inovações e soluções para nichos específicos. Essas empresas, que, através de uma instituição prestadora de serviços financeiros, conseguem acelerar o negócio e focar no core business, resolvem problemas de consumidores muitas vezes despercebidos pelos incumbentes.

Por fim, os modelos de banking as a service ajudam a diminuir riscos e custos sistêmicos, já que uma única plataforma pode ser utilizada por uma série de novas fintechs, gerando economia de escala e efeitos de rede.

Nos últimos anos, assim como em qualquer modelo novo, este mercado atraiu de tudo um pouco: aventureiros, fintechs e até grandes bancos, o que fez com o que o Banco Central se aproximasse ainda mais das suas particularidades e visse a necessidade de criar uma regulação que pudesse acompanhar seu crescimento de forma mais segura e consistente.

Lá fora, os agentes reguladores têm a mesma preocupação: este ano foi marcado pelo caso da americana Synapse (uma das principais fornecedoras de BaaS), que atuava como intermediária entre fintechs e bancos tradicionais, mas declarou falência em abril de 2024, causando impactos significativos para seus parceiros e clientes.

A empresa enfrentou disputas com seus parceiros fintech sobre saldos de clientes e teve problemas com o Evolve Bank & Trust, culminando em um déficit de US$ 85 milhões nos fundos dos clientes.

Os clientes da Synapse ficaram sem acesso a suas contas, e muitos enfrentaram dificuldades financeiras severas, pois não conseguiram acessar seu dinheiro para pagar contas ou despesas básicas. A situação revelou lacunas regulatórias significativas entre bancos e seus parceiros fintech, destacando a complexidade dos arranjos financeiros que envolvem várias camadas de intermediários.

Expectativas sobre a regulação de banking as a service

A regulação de BaaS faz parte das prioridades da agenda regulatória do Banco Central para 2024. O cronograma prevê duas etapas: uma audiência pública e, em paralelo, uma possível mudança na Lei nº 12.865/2013, que trata de arranjos de pagamento.

Acredito que podemos esperar um olhar mais apurado em relação aos parceiros que estão utilizando as empresas de banking as a service e, principalmente, maior controle sobre a qualidade dos serviços prestados aos clientes finais, desde o atendimento até segurança e prevenção a golpes e fraudes.

Para o primeiro item, o ponto é que, hoje, o Banco Central não consegue enxergar quem está plugado na instituição provedora de serviços, ou seja, a figura do chamado parceiro ou contratante dos serviços.

Talvez até existam requerimentos acerca de uma possível homologação, assim como é feito hoje com o modelo de correspondente bancário e o Participante Indireto do Pix. Isso afirma a regra de responsabilidade do Bacen, protegendo os interesses dos consumidores, promovendo a estabilidade econômica e incentivando a inovação responsável.

É esperado que esses parceiros tenham robustez suficiente para disponibilizar esses serviços sem gerar riscos ao sistema financeiro nacional, bem como mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro, e que cumpram com a LGPD, com normas de sigilo bancário e de segurança cibernética. Para o mercado, este passo seria benéfico, pois tiraria os chamados aventureiros da vez, ou aqueles que usam empresas de banking as a service de controles frágeis para praticar atividades ilícitas.

O segundo ponto, e que conversa diretamente com o primeiro, é obviamente o admirável foco no usuário, demonstrado pelo Banco Central em toda a sua agenda dos últimos anos. Além da preocupação com a qualidade dos canais de atendimento, ouvidoria e informações educativas proporcionadas ao cliente final, há o interesse de evitar fraudes e golpes no setor.

Muito do crescimento exponencial da adoção do Pix se deve à tecnologia das fintechs. Agora, o desafio é tornar a operação do produto cada vez mais segura, sem frear seu crescimento. É de praxe, no mercado financeiro, que novas fintechs virem alvos de ataques cibernéticos ou de quadrilhas de fraudes, já que se estima que elas tenham processos e controles mais frágeis no início da operação.

Uma coisa é certa: para provedores de BaaS que estão atuando no mercado de forma séria e de acordo com as normas vigentes, a regulação veio em boa hora, já que deve frear a entrada de novos participantes que não possuem a robustez e expertise necessárias para atuar. A única preocupação é que ela possa encarecer a operação de forma a indisponibilizar o modelo, já que é sabido que essas fintechs não possuem o mesmo ganho de escala e potencial de investimentos que os grandes bancos.

Apesar de ser possível um pequeno atraso no lançamento da regulação devido à troca de gestão este ano, o Banco Central demonstra, mais uma vez, estar na vanguarda da inovação do mercado. Ele é o primeiro órgão regulador do mundo a criar uma norma específica para este setor, estabelecendo um novo padrão que provavelmente se tornará um benchmarking internacional.

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Co-founder e CRO do Bankly desde 2019. Especialista em finanças e economia com bacharelado em economia na Universidade Federal de Santa Catarina (2010); intercâmbio bilateral em Ciências Econômicas e Empresariais na University of A Coruna (2010); MBA e gestão de comércio exterior e negócios internacionais pela Fundação Getulio Vargas (2012); MBA executiva de economia da ExxonMobil Business Academy (2014); Mestre em Administração de Negócios pela Coppead UFRJ (2016) e Business Dynamics da MIT Sloan School of Management. Atua desde 2014 no mercado financeiro e aborda os seguintes temas: Banking as a service, Open Banking, embedded finance, pix, moedas digitais, finanças descentralizadas, fintechs, empreendedorismo feminino, entre outros.
marilyn.hahn@moneytimes.com.br
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Co-founder e CRO do Bankly desde 2019. Especialista em finanças e economia com bacharelado em economia na Universidade Federal de Santa Catarina (2010); intercâmbio bilateral em Ciências Econômicas e Empresariais na University of A Coruna (2010); MBA e gestão de comércio exterior e negócios internacionais pela Fundação Getulio Vargas (2012); MBA executiva de economia da ExxonMobil Business Academy (2014); Mestre em Administração de Negócios pela Coppead UFRJ (2016) e Business Dynamics da MIT Sloan School of Management. Atua desde 2014 no mercado financeiro e aborda os seguintes temas: Banking as a service, Open Banking, embedded finance, pix, moedas digitais, finanças descentralizadas, fintechs, empreendedorismo feminino, entre outros.
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