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O que 2021 aguarda para o bitcoin?

31 dez 2020, 11:02 - atualizado em 24 dez 2020, 18:55
Confira, em excerto das “Criptoteses para 2021” da Messari, por Ryan Selkis, a segunda parte das dez principais tendências sobre o bitcoin para 2021 (Imagem: Freepik)

Parte 1

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6) Fungibilidade e supervisão

O bitcoin saiu do porão da casa da mãe e foi para o palco mundial. Essa é a boa notícia.

A má notícia é que, agora, uma porcentagem significativa de bitcoin está com grandes instituições centralizadas em todo o mundo.

Entre custodiantes (Anchorage, BitGo e Fidelity), corretoras (Coinbase, Binance e Huobi) e gestoras de ativos (Grayscale e CoinShares), você pode começar a rastrear quanto bitcoin é detido por terceiros centralizados e reguláveis.

Esse é um risco e, quanto mais bitcoin for acumulado nesses centros de poder, maior será a probabilidade da moeda perder sua fungibilidade quando instituições forem forçadas a monitorar “irregularidades” e cumprir com a extensa “regra de viagem” do Grupo de Ação Financeira Internacional (FAFT).

Segundo Jake Chervinsky, conselheiro geral do protocolo Compound, ainda estamos na fase da lua de mel: grande o suficiente para ser relevante, mas não tão grande para ameaçar a situação atual.

Fungibilidade se refere à capacidade de substituir algo por outro bitcoin, ether e basicamente todos os criptoativos são fungíveis e substituíveis (Imagem: Freepik)

Em 2019, fomos sortudos porque a equipe do Facebook e da Libra foram o alvo. Em 2021, pode não haver um bicho-papão para distrair as autoridades.

Se os desenvolvedores principais do Bitcoin apresentarem melhorias de privacidade boas demais, poderemos terminar com outra bifurcação (ainda mais danosa): uma que preserva a capacidade de empresas de análise em blockchain realizarem investigações forenses (e que empresas financeiras regulamentadas supervisionem as transações de seus clientes) e uma bifurcação direcionada pelo anarquismo que mistura moedas nativamente.

Reinando na supervisão inspirada pela “regra de viagem” estará o maior desafio regulatório da indústria até hoje: a batalha para preservar a autocustódia e transações privadas precisa ser vencida a qualquer custo.

7) Taproot e Schnorr

Falando em Bitcoin, o que tem no roteiro técnico de desenvolvimento desse blockchain?

A graça do Bitcoin é essa: você não precisa se preocupar com as alterações pendentes porque é um sistema que funciona basicamente no piloto automático.

Taproot promete aumentar a fungibilidade do Bitcoin, melhorar a funcionalidade dos contratos inteligentes e impulsionar a privacidade ao fazer com que todas as transações fiquem parecidas aos observadores externos do blockchain (Imagem: Freepik)

É assim que a narrativa geral funciona, mas a verdade não é tão simples e é ruim passar a perna nos desenvolvedores que estão impulsionando o protocolo (a indústria inteira) há anos, geralmente com muito pouco retorno, ao ignorar suas contribuições e atualizações.

Existe algo com o que se empolgar em 2021, começando com “Taproot”. A bifurcação proposta agrega as três principais Propostas de Melhoria ao Bitcoin (BIPs) — 340, 341 e 342 — para melhorar a privacidade do Bitcoin por meio de assinaturas de Schnorr.

Schnorr é uma palavra engraçada e também fornece uma maior privacidade (e eficiência) das transações transmitidas ao agrupar assinaturas para que transações de múltiplas assinaturas (multisig) e de assinatura única sejam impossíveis de distinguir.

O grande caso de uso aqui é a união de assinaturas para transações que passam por mixers como CoinJoin. Schnorr torna bem mais difícil, mas não impossível, que empresas de análise em blockchain façam o seu trabalho.

Também incluída na bifurcação proposta está “Tapscript”, uma atualização à linguagem de programação do Bitcoin que apresenta novos operadores de protocolo e permite que desenvolvedores usem scripts mais complexos no sistema.

Com certeza veremos a bifurcação Taproot no início de 2021, pois 82% dos mineradores estão demonstrando seu apoio à atualização e, agora, só estão decidindo qual será o “método de ativação” e a data.

Atualizações da rede também podem ajudar mineradores a operar a rede de uma forma mais eficaz (Imagem: Pixabay/QuinceCreative)

Em relação à mineração/segurança, grande parte das atualizações foram relacionadas à descentralização do processamento de transações: mineradores migraram para Stratum V.2, um protocolo que ajuda a reduzir a latência da rede e exige que decisões de suporte a transações sejam feitas (sobre quais transações podem entrar no bloco) para donos de hardware vs. operadores de pools.

A versão 0.21.0 do Bitcoin Core, que será lançada em breve, inclui suporte para a terceira versão de endereços Tor que ajudam os nós Tor da rede a “fofocarem” entre si.

Dandelion++ irá misturar a origem das transações para que adversários tenham mais dificuldade e identificar a verdadeira fonte da transação.

É um trabalho interno no foguete. Não faça perguntas. Só escolha o seu assento.

8) Lightning e sidechains

O desenvolvimento da Lightning e de sidechains (blockchains paralelos) está estagnado? Ainda é cedo para dizer, pois as previsões de 2019 e 2020 de que a Lightning teria muito sucesso estavam erradas. Mas que se dane. Vamos lá.

Houve algumas melhorias importantes na experiência de usuário (para liquidez e privacidade) na Lightning mas, sinceramente, parece que o projeto ficou para trás por conta de aplicações de pagamentos com stablecoins na Ethereum. Me avise quando algo mudar.

A Lightning Network foi criada para solucionar algumas limitações técnicas do blockchain Bitcoin, mas que também podem ser implementadas em outros blockchains  (Imagem: Crypto Times)

Em relação aos sidechains, parece que serão interessantes principalmente para transações com wrapped bitcoin (WBTC), Liquid (a rede própria da Blockstream) e Transações Confidenciais (CTs), que parecem não ter chance de serem incorporadas ao blockchain principal devido a questões regulatórias.

Pode ser um líquido positivo para todos os envolvidos, pois transações confidenciais em sidechains asseguram que o fornecimento completo de bitcoins possa ser continuamente auditado ao longo do tempo (o que pode ser uma grande limitação para o Zcash).

9) Diversificação e previsibilidade para mineradores

Governos liberais em todo o mundo ainda podem sucumbir à narrativa de que o bitcoin é apenas uma grande cortina de fumaça digital, inútil e massacrante, cujos padrões de consumo de energia irão destruir o planeta.

Verdade seja dita: é difícil argumentar que a mineração proof-of-work (PoW) não seja um monopólio energético. É, sim. Porém, ainda temos que permitir a possibilidade de que, um dia, a mineração PoW poderá reduzir totalmente a emissão de gás carbônico.

Para entender por quê, você precisa entender o que é a “curva do pato” e o papel de sistemas modernos de resposta à demanda por redes energéticas.

Texas virou o novo “point” de mineração cripto no ocidente e pode dar vida à economia local estagnada ao criar empregos e fornecer treinamento e programas educacionais para a população (Imagem: Pixabay/CarOscar)

Considere a matriz do Texas, por exemplo. Os mercados desregulados do estado resultaram em um aumento na geração de energia, principalmente de renováveis, em que, agora, o Texas é uma das maiores produtoras de energia eólica e solar do mundo.

Mas a variação na produção energética intradiária e nos padrões de consumo de energia resulta em desperdício energético ou, até mesmo, preços negativos de consumo de energia quando a rede está operando em capacidade máxima.

Excesso de energia tende a ser canalizada de redes sobrecarregadas de energia para algumas fontes externas. E se fazendas de mineração de bitcoin pudessem servir como niveladores de sobrecarga de energia limpa?

A curva do pato (Imagem: Green Tech Media)

Com certeza, o papel do bitcoin como um acelerador da mudança climática ignora o potencial que a indústria pode melhorar bastante no armazenamento do poder de hashing do bitcoin (sem mencionar o monopólio de fabricação de chips ASICs) por trás do Great Firewall (GFW) da China.

Porém, as unidades de mineração no Ocidente pelo menos apresentam a tão necessária transparência à parte obscura do mercado.

Operadoras americanas como Layer1, Foundry (DCG) e Galaxy Digital Mining podem fornecer uma ideia mais clara das cadeiras de fornecimento de mineração, algo que antes nunca tivemos.

Por enquanto, tudo o que sabemos é que os estoques das chinesas MicroBT e Bitmain estão ESGOTADOS até o terceiro de 2021, apesar de empresas ocidentais ainda tentarem comprá-los.

Texas é uma região pequena, porém propensa para a mineração de bitcoin (Imagem: CoinShares, Messari)

A mineração ainda é altamente competitiva, mas existem motivos para sermos otimistas de que poderá se espalhar ao longo do tempo.

Para início de conversa, a liquidez do mercados de derivativos de bitcoin e a semelhança das negociações locais de contrato de energia facilitam a gestão da unidade econômica de um negócio de mineração se você tiver uma cadeia de suprimento forte e escalável o suficiente.

Em segundo lugar, as gigantes empresas que podem entrar para o setor, como Fidelity, DCG ou outras grandes instituições ocidentais, podem estar de acordo com a mineração como (pequenas) líderes, agora que sua desvantagem parece estar mais coberta, e essas operações podem se tornar, no pior contexto, um pequeno imposto que as ajudam a demonstrar que levam o risco geopolítico a sério.

10) Litecoin, bifurcações do Bitcoin e o lixo radioativo (XRP/XLM)

E vamos à parte polêmica.

Em 2020, pelo menos teve um lado positivo. Bifurcações (“forks”) do bitcoin, como bitcoin cash (BCH), bitcoin satoshi vision (BSV), bitcoin gold (BTG) etc. são inúteis.

Bitcoin Cash não para de brigar e se dividir, apresentando uma novela com algumas das pessoas (antigamente) mais importantes da indústria cripto. BCH teve sua chance em 2017, mas jogou tudo para o alto e agora não significa nada. Você perdeu. Tenha um bom dia.

XRP e stellar lumens (XLM) dispararam em meados de novembro por serem criptomoedas antigas nas quais investidores ainda insistem, por acreditarem que esses ativos tenham “poder de permanência” e seus baixos preços nominais irão atrair novatos estúpidos o suficiente para comprá-los.

Kain Warwick, fundador da Synthetix, compartilha dessa visão ao comparar o ganho de dinheiro em uma negociação de XRP a “derreter órfãos em querosene para acender lampiões ou algo do tipo”. É claro, pode adquiri-las, mas você merece mais.

São ativos tóxicos impulsionados pela captura regulatória e eles vão contra tudo o que atrai novatos ao setor cripto.

Assim como o bitcoin é chamado de “ouro digital” por conta de sua escassez, litecoin foi apelidado de “prata digital” (Imagem: Facebook/Litecoin)

E isso nos leva ao Litecoin (LTC) que é, basicamente, uma rede de testes de produção para o bitcoin. Litecoin adotou e testou SegWit (“testemunha segregada”), Lightning e sidechains bem antes desses recursos serem ativados na rede Bitcoin.

Então, Litecoin pelo menos serviu como uma espécie de pool de falhas para que hackers pudessem pôr à prova as atualizações do Bitcoin.

Ataque a rede Litecoin e roube os fundos se puder. LTC ainda é chamado, de forma não irônica, de “prata digital” mas, diferente dos ativos listados acima, sua forte ligação com o bitcoin o torna pelo menos interessante. Caramba… é o produto mínimo viável (MVP) da tendência Grayscale.

Agora pode não haver um perfil de risco/retorno em todo o mercado cripto do que na negociação do Litecoin Trust da Grayscale (LTCN). LTCN está sendo negociado a um prêmio seis vezes maior do que o ativo implícito quando suas vendas se tornaram irrestritas.

Evidentemente, você assume o risco principal do LTC durante um bloqueio de 12 meses — algo que você pode não gostar muito.

É provável que o prêmio da Grayscale diminuia bastante conforme investidores negociem o LTCN nos próximos meses, mas ETHE é um bom indicador de quanto tempo e a qual magnitude esses prêmios irão durar (dica: um bom tempo).

Se LTCN seguir GBTC e ETHE como produtos regulados com a SEC, melhor ainda: o período de retenção pode ser reduzido para seis meses.

É um bom jogo de risco/retorno aqui e um que podemos até considerar. A desvantagem? Quando você negocia dessa forma, você está atrapalhando o comprador de varejo do outro lado do bloqueio de 12 meses.

A aversão pela SEC e sua incapacidade de aprovar um ETF de bitcoin é a responsável por isso. Hora de derreter alguns órfãos e ter a SEC como cúmplice.

Os fundos de investimento cripto da Grayscale atingiram diversos recordes em 2020 e ajudaram a  atrair muitos investidores institucionais à indústria cripto (Imagem: Crypto Times)

Os fundos Bitcoin Cash (BCHG) e Ethereum Classic (ETCG) apresentam oportunidades parecidas na Grayscale, mas você assume um risco bem maior dado o seu histórico de bifurcações e ataques de 51%.

Em algum momento, os produtos XRPFUND e XLMFUND também se tornarão negociáveis em bolsa, mas essa não é uma conclusão definitiva. Até agora, a Grayscale só listou em bolsa as moedas PoW.

Assim, só resta mais um produto de investimento de criptomoda PoW à Grayscale.

11) Zcash: cavalos de troia, hipermodelos e privacidade verdadeira

Relembrando: o bitcoin não é realmente privado, o que cria alguns riscos e desafios de escalabilidade sobre sua fungibilidade.

Existem diversas criptomoedas com foco em privacidade que podem complementar o bitcoin nesse quesito e ir ainda mais além.

É importante mencionar monero (XMR), dash (DASH) e outras moedas menores, como horizen (ZEN) e decred (DCR), mas Zcash (ZEC) é o “cavalo de troia” que se adequa a esse modelo de privacidade, por puro pragmatismo de seus principais desenvolvedores e defensores.

Zcash foi lançada no fim de 2016 por alguns dos melhores criptógrafos do mundo, com o objetivo de criar os “https” para o dinheiro cripto (“cibermoedas”, como Zooko, o fundador, as chama).

A principal inovação do protocolo foi a incorporação da criptografia de “provas de conhecimento zero” (ZKP) à sua rede nativa de pagamentos, que fornece garantias mais robustas de privacidade do que típicas transações de blockchain.

A equipe também foi pioneira com o conceito de armazenar ativos em pools “protegidos” (“shielded”) em vez de apenas anonimizar transações.

Mais de 90% das transações do blockchain Zcash são operadas por meio de endereços de carteira visualizáveis e pseudônimos, mas o restante é armazenado no “shielded pool” completamente anônimo da rede. Isso parece bobo, mas é algo muito importante.

O fundo cripto Multicoin Capital (apesar de ser um grande crítico a esses ativos) falou muito bem sobre as criptomoedas de privacidade.

Sua conclusão é diferente em relação aos méritos desses ativos, mas o que você vai perceber, no gráfico abaixo, é que Zcash foi sabiamente criado.

Zcash traz a tecnologia de privacidade ao mercado de forma gradual mas, quando os ativos são anonimizados, são basicamente impossíveis de rastrear no pool protegido.

A gama de privacidade para transações com criptomoedas (Imagem: Multicoin Capital)

O balanço de anonimidade e a ponte ininterrupta entre “z-addresses” (endereços anônimos”) e “t-addresses” (endereços pseudônimos, como o do BTC e ETH) não é pouca coisa.

Reguladores sul-coreanos e japoneses dificultaram o suporte de corretoras locais a qualquer tipo de ativo que facilite transações anônimas.

Reguladores americanos fizeram orientações parecidas (e não tão sutis) de que “moedas que permitem a privacidade” podem ser impossíveis de corretoras listarem devido sua falta de rastreabilidade.

Mas quando o assunto é dinheiro realmente criptografado, ZEC definiu claramente a linha para ajudar a atrair alguns dos principais defensores e apoiadores empresariais.

Algumas empresas ocidentais podem deslistar moedas de privacidade como Zcash para limitar seus riscos regulatórios. Outras podem fornecer suporte a todas as moedas de privacidade e combater as restrições no tribunal.

Coinbase e Gemini — consideradas como as melhores do mercado, a partir de uma perspectiva de compliance — são duas corretoras a se prestar atenção.

Historicamente, se esquivaram de monero — que fornece privacidade por padrão por meio de uma solução privada, porém imperfeita chamada de “ring signatures”, que permite que transações se “escondam” dentre várias —, mas forneceram suporte ao Zcash por conta dos endereços transparente (pseudônimos) por padrão e a privacidade opcional do protocolo.

Isso ajuda o Zcash, pois suas entidades parceiras foram assertivas na educação e na defesa, apoiando grupos como Coin Center e a Blockchain Association, além da colaboração com instituições como JPMorgan.

Mas Zcash ainda está à sombra do Bitcoin e pretende desenvolver cada vez mais o seu pool de proteção ao longo do tempo.

ZEC possui uma comunidade resiliente de investidores (é preciso ser forte para investir em ZEC, apesar da incessante pressão de venda que enfrentou por sua alta inflação inicial) e seu (primeiro) halving em novembro foi material.

Também forneceu mais financiamento para que os desenvolvedores principais continuem apresentando atualizações.

Cada vez mais pontes estão sendo construídas para outros protocolos e contratos autônomos (Ren, Keep e Wrapped.com) para facilitar a alavancagem de ZEC enquanto fundos são armazenados em um pool privado.

Outros protocolos podem incorporar as transações de conhecimento zero, mas não irão necessariamente solucionar o padrão de armazenamento privado da riqueza assim como o Zcash.

E você? É otimista pelo futuro do Zcash ou não o considera como um ativo de investimento?