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O pacote fiscal e o agronegócio: Como nos livrar do ‘Feitiço do Tempo’ para embarcarmos em 2025?

04 dez 2024, 14:19 - atualizado em 04 dez 2024, 14:28
pacote fiscal agronegócio
(iStock.com/Vronja_Photon)

Havia prometido a mim mesmo que para esse final de ano não faria mais, nessa nossa coluna, análises de cenários e de fatos relevantes que vêm impactando o agronegócio brasileiro ao longo de 2024.

Jurei de dedos cruzados e pés juntos que no final desse ano me dedicaria a olhar as perspectivas para o ano de 2025, mas as autoridades e os caloteiros de plantão, infelizmente, não têm deixado a agonia de 2024 passar, impressionante!

Parece que no agronegócio brasileiro estamos vivendo as cenas daquele filme famoso, de 1993: “O Feitiço do Tempo” em que o personagem principal, um repórter que vai a uma pequena cidade fazer a cobertura do “Dia da Marmota” e se vê repetindo diuturnamente os mesmos fatos do dia anterior em sua vida – e assim vai todos os dias até o desenrolar do enredo do filme – como se fosse impossível alterar o curso da própria história.

 O pacote fiscal do Haddad e o “Feitiço do Tempo” nas contas públicas

Acreditávamos que após as eleições no Brasil e EUA as peças do “tabuleiro político” se moveriam e o governo voltaria a “governar”, afinal foi eleito para isso, não?

Infelizmente, o Governo Federal eleito tem muita dificuldade de fazer ajustes na despesa pública, mesmo em um cenário em que a economia cresce, a arrecadação cresce junto, mas a população e os empreendedores no campo e na cidade continuam a sofrer com o câmbio nas alturas, a inflação sem perder a força e as expectativas altistas em torno das taxas básicas de juros no Brasil.

O pacote fiscal do governo teria o objetivo de “dar sobrevida ao arcabouço fiscal em vigor desde o ano passado” anunciando cortes de gastos obrigatórios da ordem de R$ 70 bilhões em dois anos (R$ 30 bilhões em 2025 e R$ 40 bilhões em 2026).

Junto com o “corte”, claro, e, como sempre, de forma enviesada, os ministros da fazenda e do planejamento e da casa civil, anunciaram pacotes de “bondades fiscais”, como a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem recebe até R$ 5.000 – que até agora não explicaram como será implementada – por mês, dentre outras platitudes.

E, claro, propuseram pela enésima vez – entra governo e sai governo é a mesma coisa – a prorrogação da DRU (Desvinculação de Receitas da União) até 2032, para que o governo federal possa continuar a gastar livremente e sem qualquer vinculação a despesas obrigatórias até 30% das receitas públicas auferidas.

O fato é que em um “pacote de contenção de gastos” o mercado (e a sociedade como um todo também) só viram a expressão “gastos”, “despesas públicas”, no aumentativo e no plural nos textos divulgados pelo próprio governo, sem conseguir divisar qualquer ajuste real nas contas públicas, o que fez o câmbio disparar e as expectativas de juros futuros, idem.

Assim, sem qualquer solução fiscal real para o próprio arcabouço criado pelo governo federal que, por sua vez, parece completamente sem rumo a viver um “dia da marmota” eterno, nos obriga a vivenciar com eles a mesma realidade que impacta negativamente as contas públicas para os próximos anos e que não nos deixa antever qualquer melhora de cenários nesse sentido no curto ou médio prazos.

Um pouco mais de dificuldades à vista para o setor produtivo

No agronegócio, por sua vez, apesar da retomada da produtividade e das expectativas para a próxima safra por conta das chuvas abundantes em todo o país, as taxas de juros estruturalmente altas continuam a castigar o setor que precisa de abundância de recursos financeiros disponíveis para produzir e cumprir com os seus compromissos.

Nesse cenário, o produtor rural ainda enfrenta restrições de crédito e incertezas de preços, conforme já tratamos nas nossas últimas colunas e a própria execução do Plano Safra 24/25 – que recuou cerca de R$ 50 bilhões nos últimos meses do ano, como tem atestado a grande imprensa – pode causar algum impacto negativo numa hora de necessária retomada por conta das expectativas de aumento de produção e até do câmbio depreciado que pode favorecer muitos de nossos produtos da pauta de exportação que também estão recuperando preços.

Em nada ajudou, nesse sentido, a divulgação do primeiro rascunho do PRJ – Plano de Recuperação Judicial da AgroGalaxy (AGXY3) no último dia 02 de dezembro, sinalizando com um calote de absurdos 85% do valor de face dos créditos de muitos de seus fornecedores que não aceitarem aumentar a exposição indevida à dívida estratosférica de cerca de R$ 4,7 bilhões da companhia.

Por óbvio que o cenário fiscal, também não ajuda nas expectativas e nos faz antever, junto com calotes como o da AgroGalaxy e demais processos congêneres, mais aperto de crédito e taxas de financiamento menos atraentes para o ano que vem, sem solução de curto e médio prazos.

Fiagro repaginado, sanção dos PLs dos bioinsumos e dos créditos de carbono podem dar o tom para 2025

Talvez a solução para começarmos a pensar em “estourar o espumante” para brindarmos 2025, seja olharmos para algumas novas ferramentas que o agronegócio terá ao seu dispor para ajudar o empreendedor no campo já em 2025.

A nova regulação do Fiagro tem sido bem aceita no mercado e tem animado novos players a entrarem no financiamento privado ao agronegócio brasileiro, principalmente em se considerando a permissão para investimentos em CPR-Verdes, créditos de carbono e outros ativos ambientais.

A aprovação pelo Senado do PL 658/2021 que trata do marco regulatório para os bioinsumos também deve representar um avanço e mais oportunidades de negócios e inovação para os empreendedores na cadeia do agronegócio para o ano que vem, com mais sustentabilidade e segurança jurídica nas operações com esses produtos.

A sanção do PL 182/2024 que criou o mercado regulado de créditos de carbono no Brasil, objeto de nossa última coluna, também deve contribuir bastante com a melhora de expectativas para o setor em 2025 já que temos tudo para nos tornarmos também o maior fornecedor de produtos agroambientais ao mundo.

Enfim, produzir com abundância e qualidade no campo dá muito trabalho, envolve capital intensivo, tomada de muitos riscos de negócios, mas com empreendedorismo do homem do campo e políticas de estado firmes para o agronegócio temos surpreendido o mundo a cada ano, em verdade há muitos anos, aumentando a nossa capacidade de produção e fornecendo alimentos, energia limpa e fibras sustentáveis a todo o planeta. A ideia é continuar a fazer isso com competência, consciência e responsabilidade por anos e anos a fio. Que venha 2025!

 

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André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
andre.passos@moneytimes.com.br
André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
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