O futuro da economia mundial está nas moedas digitais emitidas por bancos centrais?
Segundo o Decrypt, moedas digitais emitidas por bancos centrais (ou “CBDCs”, na sigla em inglês) são versões digitais de moedas fiduciárias nacionais.
Você pode estar se perguntando: qual é o propósito dessas moedas? Por que os governos teriam interesse nelas? E o que as diferem das moedas tradicionais?
Este artigo da série Bê-a-bá Cripto foi elaborado justamente com esse propósito, para que você possa saber tudo sobre esse tipo de moeda que já foi aderida por alguns governos pelo mundo.
CBDCs são semelhantes a stablecoins, que são criptomoedas com lastro e paridade a alguma moeda fiduciária, como o dólar, por exemplo.
Além disso, algumas stablecoins, como a Tether (USDT) e a U.S. Dollar Coin (USDC), são centralizadas, ou seja, são controladas por entidades, no caso a Tether e a Centre, respectivamente.
Essas entidades detêm dinheiro físico ou investimentos de liquidez imediata, como uma forma de garantir que suas stablecoins reflitam o valor exato da moeda fiduciária na qual tem lastro.
Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), CBDCs correspondem a uma nova forma de dinheiro e apresentam as seguintes características: existem no formato digital, são emitidas pelo banco central de um país e servem como uma moeda corrente legal.
Se pensarmos na maior criptomoeda do mundo – o bitcoin (BTC) –, notamos que ela possui somente duas das três características mencionadas anteriormente: é digital e também considerada uma moeda corrente em El Salvador.
No entanto, o bitcoin não apresenta o principal aspecto para ser considerado uma CBDC: ser emitido por um banco central.
A maior criptomoeda do mundo é descentralizada, o que significa que nenhuma autoridade – seja empresa ou governo – tem poder sobre ela. Em junho de 2021, o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, indicou que o país iria adotar o bitcoin como moeda corrente. Nesse caso, o Banco Central de Reserva salvadorenho não emite nem emitirá a criptomoeda.
De acordo com a fala de um ex-conselheiro do Serviço Interno de Receitas dos Estados Unidos (IRS) ao Decrypt, mesmo se o banco salvadorenho realizasse a mineração do bitcoin em massa, isso não seria considerado uma “emissão monetária”.
Como funcionam as CBDCs?
Apesar de alguns governos indicarem o blockchain como a tecnologia por trás da moeda digital nacional, os bancos centrais ainda são os detentores da autoridade sobre o livro-razão, em que são registrados e detalhados dados de transações.
O controle sobre a CBDC pelo banco central a torna uma moeda digital centralizada, diferentemente de algumas criptomoedas, como o bitcoin, conforme apontado anteriormente, e o ether (ETH).
Há diferentes modos que uma CBDC pode ser implementada por um Estado. As moedas digitais geralmente funcionam de modo semelhante a carteiras digitais móveis, como Apple Pay e Google Pay, por exemplo.
No caso das Bahamas, a CBDC do país, chamada “Sand Dollar”, foi implementada em outubro do ano passado, e o banco central emite a moeda digital do mesmo modo que o dólar bahamense (BSD), a moeda fiduciária do país.
Além disso, a instituição financeira também mantém um livro-razão, com os registros dos sand dollars em circulação.
O princípio do sand dollar é o mesmo de qualquer projeto de CBDC: escanear o código de barras pela câmera do celular e realizar pagamentos ou transferências para outra carteira digital, sem a necessidade de intermediários, como bancos.
Por que governos têm interesse em CBDC?
Segundo o Decrypt, o Banco de Compensações Internacionais (BIS) listou três motivos que podem ter impulsionado as CBDCs nos últimos tempos: a atenção voltada ao bitcoin e às criptomoedas, o debate sobre stablecoins e a inserção das grandes empresas de tecnologia (“Big Techs”) no setor das finanças, como é o caso stablecoin Diem, criada pelo Facebook.
Este último motivo, porém, tem gerado preocupações em instituições financeiras, como o Banco Central Europeu (ECB), o qual, em um relatório, disse que governos que recusarem CBDCs poderão enfrentar problemas no futuro ligados aos sistemas financeiros e à autonomia monetária, devido à possível oferta de moedas artificiais por grandes companhias de tecnologia.
Mas existem também outros benefícios que as CBDCs podem proporcionar, como facilitar o acesso a dinheiro em tempos críticos.
Um importante benefício indicado pelo FMI é a possibilidade de não precisar de uma conta bancária para usar a CBDC, o que se mostra muito vantajoso em países em que a população tem baixo acesso a finanças tradicionais.
Já do ponto de vista institucional, as CBDCs auxiliam na redução de custos. Conforme apontado pelo Decrypt, a MasterCard indicou que a gestão de dinheiro físico pode representar 1,5% do produto interno bruto (PIB) de um país. Portanto, a digitalização da moeda nacional pode proporcionar uma economia significativa para governos.
Quais países estão desenvolvendo sua CBDC?
Talvez você se surpreenda com esta informação: em agosto de 2021, havia 81 países envolvidos com seus projetos de CBDCs, nos mais diversos estágios.
Apesar de a quantidade total ser considerável, somente cinco nações lançaram suas CBDCs até o momento, e todas elas estão, não na Europa nem na Ásia, mas, sim, no Caribe. São elas: Bahamas, Antígua e Barbuda, Granada, Santa Lúcia e São Cristóvão e Névis.
De acordo com o mapa elaborado pelo site Atlantic Council, os países com projetos de moedas digitais nacionais podem estar em alguma das seguintes fases: “pesquisa”, “desenvolvimento”, “teste-piloto”, “lançamento concluído”, “inativo”, “cancelado” ou “outro”.
Dentre essas categorias, a que contém a maior quantidade de países é a de pesquisa. Nesse estágio, os países decidem se desejam ou não criar sua respectiva CBDC e analisam a definição dessa moeda digital, suas possíveis aplicações e consequências.
Alguns dos países que se encontram nessa categoria são: Estados Unidos, Chile, Índia, Marrocos, Países Baixos e Austrália.
Já na fase seguinte, a de desenvolvimento, as nações lançam estudos e desenvolvem provas de conceito (“proof-of-concept”). É o caso do Brasil, com o real digital, do Japão, do Canadá, da África do Sul, entre outros.
Na fase de teste-piloto, apesar de o nome estar no singular, são conduzidos diversos testes, em que são observados os casos de uso, as aplicações e o desempenho da moeda digital nacional.
A principal representante dessa fase, neste momento, é a China, que conduz testes com seu yuan digital (ou “e-CNY”) há mais de seis meses. O governo do país também já emitiu o whitepaper (documento que apresenta e explica a moeda digital) do e-CNY e integrou a CBDC totalmente ao sistema metroviário de Pequim, conforme pode ser observado no vídeo abaixo.
Nos testes realizados pelos governos de diversas províncias chinesas, milhões de yuans digitais foram distribuídos aos cidadãos, com o objetivo de testar a tecnologia e aumentar a adesão da CBDC pela população.
Alguns países que também estão conduzindo testes com sua moeda digital nacional são: Suécia, Camboja, Arábia Saudita, Coreia do Sul e Ucrânia.
Como será o futuro das CBDCs?
Enquanto o futuro de algumas CBDCs poderá levar mais tempo para ser concluído, o de outras poderá ser finalizado em breve, como é o caso da China. O yuan digital será oficialmente lançado durante os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, que acontecerão em Pequim.
Porém, o e-CNY ainda nem foi lançado oficialmente e já deu o que falar, pelo menos para alguns senadores americanos. A principal questão apontada por eles diz respeito ao possível comprometimento da privacidade de atletas dos Estados Unidos com o uso da moeda digital chinesa.
Segundo eles, o recebimento ou o uso do yuan digital durante os jogos por atletas americanos pode ser usado para monitorar os visitantes do país.
O tópico da privacidade e preocupações ligadas a ela tendem a crescer conforme a adesão de governos às moedas digitais nacionais.
Se alguns defendem que as CBDCs são uma solução para o quesito da privacidade, alegando que não há interesse comercial para armazenar ou comercializar dados da população, outros acreditam que as moedas digitais nacionais podem ser um meio para governos monitorarem fluxos monetários em uma escala nacional ou individual.