O Dragão repousa, mas não está saciado: o que está por vir na China
Esta semana, o Congresso Nacional do Povo na China serviu de palco para a administração do presidente Xi Jinping delinear suas estratégias para o avanço econômico do país em 2024.
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No final do dia, a assembleia é uma oportunidade para os dirigentes chineses redefinirem a narrativa sobre a economia do país, que se depara com desafios significativos.
A China atendeu às expectativas ao estabelecer sua meta de crescimento em cerca de 5% e sinalizar a possibilidade de incrementar a liquidez no mercado.
Esse objetivo, apesar de ambicioso, reflete uma continuidade em relação ao ano anterior, postulando novas medidas de estímulo ao crescimento.
Diante dos entraves enfrentados pelo setor imobiliário e a redução no consumo doméstico, especulava-se sobre uma meta de crescimento mais conservadora, na casa dos 4,5%, o que indicaria um pacote de estímulo mais contido, potencialmente frustrando expectativas do mercado.
Isso, entretanto, não se confirmou.
A atenção se direciona igualmente para a previsão do déficit fiscal. Com a recuperação econômica da China mostrando-se desigual — avanços na produção industrial, mas contração no consumo doméstico —, pode haver a necessidade de ampliar os estímulos fiscais e ao setor imobiliário, especialmente se a demanda externa diminuir.
Em relação à política monetária, a atenção aos detalhes será essencial, exigindo uma avaliação meticulosa para identificar possíveis mudanças futuras.
Há uma expectativa de uma inclinação para medidas mais flexíveis, apesar de a postura oficial ser ainda caracterizada por uma cautela.
Este ano promete trazer uma abordagem modificada em comparação ao anterior, que se concentrou exclusivamente no “crescimento econômico nominal”, sem dar ênfase específica aos índices de preços.
Pan Gongsheng, líder do Banco Popular da China, sinalizou a possibilidade de reduzir as taxas de reservas obrigatórias dos bancos, permitindo também às instituições financeiras manter menores reservas e fomentar o crédito.
Paralelamente, Zheng Shanjie, da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, expressou um otimismo cauteloso, vendo a meta de crescimento do PIB como alcançável com esforço e dedicação.
Essas perspectivas surgem num momento de ceticismo em relação à ambiciosa meta de crescimento, exacerbado pela impressão de falta de apoio político consistente, desencadeando preocupações sobre a perpetuação dessa dinâmica.
Expressões como “novas forças produtivas” e “crescimento de alta qualidade” destacam as áreas-alvo dos investimentos governamentais, especialmente em setores inovadores como veículos elétricos, baterias e energias renováveis, embora isso possa acentuar questões de superprodução e intensificar as tensões comerciais, especialmente com países ocidentais.
Este interesse renovado em setores inovadores ocorre em um momento em que a economia chinesa, após décadas de expansão rápida, enfrenta uma desaceleração marcante.
Essa fase é representada por uma crise imobiliária profunda, pressões deflacionárias e um aumento no desemprego, especialmente entre os jovens.
Desde 1980 até 2022, a China viu seu PIB per capita em relação aos Estados Unidos crescer de 2% para 28%, refletindo seu rápido progresso industrial e sucesso exportador.
Hoje, porém, o crescimento do PIB da China mostra sinais de abrandamento, a atração de investimentos estrangeiros desacelera preocupantemente e o mercado de ações sofre uma perda de valor expressiva, ultrapassando os US$ 6 trilhões.
Naturalmente, a atual desaceleração tem reverberações mundiais, impactando a demanda global por produtos e serviços e diminuindo os investimentos chineses no exterior, afetando desde projetos de infraestrutura na África até portos europeus.
Multinacionais, que dependiam do mercado chinês como vetor de crescimento, agora enfrentam desafios consideráveis.
Para piorar, apesar de relatórios oficiais indicarem um crescimento econômico de 5,2% em 2023, persistem dúvidas sobre a veracidade desses dados, sugerindo a possibilidade de terem sido superestimados pelas autoridades locais.
Tanto é verdade que, nos círculos políticos de Washington, debate-se a ideia de que a China possa ter alcançado seu ponto máximo de desenvolvimento, uma conjectura que reforçaria o status dos Estados Unidos como líder global.
No entanto, a desaceleração econômica da China não traduz necessariamente um declínio de sua influência geopolítica.
A China continua a demonstrar sua força industrial, superando o consumo de eletricidade dos Estados Unidos desde 2010, o que ressalta a pujança de sua base industrial.
Seu crescente poder econômico na Ásia e no Pacífico, amplamente impulsionado pela Iniciativa do Cinturão e Rota, eleva sua influência regional acima da norte-americana. Além disso, o país tem ampliado sua presença militar na Ásia-Pacífico, diversificando-se das áreas de foco dos Estados Unidos.
A China também se destaca no cenário das tecnologias sustentáveis, liderando na produção de turbinas eólicas, painéis solares e veículos elétricos, posicionando-se como uma força determinante para o futuro da energia verde global.
Apesar dos obstáculos econômicos, a estatura geopolítica da China e seu protagonismo na transição para tecnologias verdes continuam em trajetória ascendente.
Com isso, em um contexto global marcado por incertezas e volatilidades, seria precipitado concluir que a China já atingiu seu apogeu. Para Xi Jinping, o desafio iminente é assegurar que as dificuldades econômicas não desencadeiem um mal-estar generalizado entre os cidadãos.
As estratégias recém-anunciadas pelo governo chinês, goste-se ou não, indicam importantes avanços, notadamente o aumento dos investimentos militares, que agora ocupam uma proporção maior da economia.
A estratégia adotada, inclusive, reflete o compromisso do presidente Xi Jinping em garantir que as forças militares, orientadas diretamente pelo Partido Comunista em detrimento da gestão civil, estejam aptas para eventuais confrontos.
Com isso, o orçamento destinado à defesa será incrementado em 7,2% neste ano, atingindo o valor de US$ 232 bilhões — o aumento mais significativo observado nos últimos cinco anos.
Paralelamente, haverá um investimento considerável em tecnologia, com o governo elevando os aportes em pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico em 10%, alcançando um montante de US$ 51,5 bilhões em 2024.
Esse investimento sinaliza o interesse da China em se posicionar na vanguarda das inovações tecnológicas.
Esses movimentos ilustram a maneira pela qual Xi Jinping lidera o país, seguindo uma visão cada vez mais proativa.
Diante deste cenário, para o governo chinês, é crucial intensificar as iniciativas para atualizar sua infraestrutura industrial e fomentar o surgimento de novas dinâmicas produtivas, com o objetivo de contornar a letargia econômica que tem caracterizado modelos econômicos similares na Ásia.