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‘Nova’ MP da Eletrobras anima mercado, mas gera preocupação no setor de energia

19 maio 2021, 14:47 - atualizado em 19 maio 2021, 14:47
Elmar Nascimento
o relatório divulgado na terça-feira pelo deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) foi mal recebido entre especialistas do setor elétrico e associações que representam empresas do segmento, que criticaram diversos mecanismos incluídos na MP (Imagem: Maryanna Oliveira/Câmara dos Deputados)

Mudanças propostas à medida provisória (MP) de privatização da Eletrobras (ELET3) pelo relator do texto na Câmara geraram animação entre investidores e analistas de mercado e levavam as ações da estatal a operarem em máximas históricas nesta quarta-feira, ao ampliarem expectativas de aprovação da matéria.

Mas o relatório divulgado na terça-feira pelo deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) foi mal recebido entre especialistas do setor elétrico e associações que representam empresas do segmento, que criticaram diversos mecanismos incluídos na MP.

Entre os pontos que acenderam sinal de alerta está a previsão de que a desestatização ficará sujeita a uma contratação prévia pelo governo de novas termelétricas a gás e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs).

Também gerou reação negativa a ideia do relator de definir uma divisão para um superávit futuro esperado para após 2023 na hidrelétrica binacional de Itaipu, que não será privatizada. Nascimento pretende direcionar 25% desses recursos para uso pelo governo federal em um programa de distribuição de renda.

O Fórum das Associações do Setor Elétrico (FASE), com entidades representantes de investidores em áreas da indústria como geração, transmissão, distribuição e comercialização, escreveu carta em que diz que mudanças do relator “distorcem o mercado e trazem efeitos de curto, médio e longo prazo que aumentarão o custo da energia elétrica no Brasil”.

“No nosso entendimento, as alterações propostas, tais como anunciadas na mídia, tornam o projeto desequilibrado, portanto merecem ser reavaliadas com o devido cuidado”, afirmaram no documento, dirigido a lideranças políticas e visto pela Reuters.

O presidente do FASE, Mário Menel, disse à Reuters ser a favor da privatização, mas de acordo com o modelo originalmente proposto pelo governo ao Congresso, sem envolver mudanças mais amplas em políticas do setor de energia trazidas pelo relatório.

Em meio à expectativa de que o novo texto da MP possa ser submetido à Câmara ainda nesta quarta-feira, como sinalizado na véspera pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), as ações da Eletrobras subiam mais de 4%, operando em máximas históricas.

“O medo é que, passada essa euforia, a gente veja que o negócio não é sustentável”, disse Menel, com críticas principalmente à previsão de contratação obrigatória de novas usinas térmicas e PCHs.

O relator da MP disse que “99%” de suas propostas foram negociadas com o governo e atendem demandas de governadores. Procurado, o Ministério de Minas e Energia não comentou de imediato.

A ex-diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) Joísa Dutra também afirmou que viu as alterações no texto “com muita preocupação”.

Ela comentou que a redação final da MP lembra uma “árvore de Natal” , com o relator buscando atender diversos pedidos de grupos políticos com medidas que não geram valor para a Eletrobras e nem ganhos de eficiência no setor de energia.

“Entendo a legitimidade que o relator tem, pelo papel do Congresso, mas não tenho uma análise positiva… acho que o Congresso vai ter que usar sua sabedoria para converter essa MP (em lei) de forma que beneficie a sociedade, porque da forma que está aí não vejo como interessante”.

Uma das principais críticas da especialista, que é diretora da Fundação Getulio Vargas (FGV), é o estabelecimento na MP de uma contratação obrigatória de 6 gigawatts (GW) em térmicas a gás no Nordeste, Norte e Centro-Oeste, além de 2 GW em PCHs.

Um dispositivo viabilizando essas termelétricas a gás chegou a ser incluído por políticos na Lei do Gás durante sua tramitação no Congresso, mas acabou não entrando no texto final.

“Não ficou para trás o tempo de escolher tecnologia campeã? Será que não conseguimos virar a página?”, questionou Joísa.

“Talvez o que o mercado esteja olhando é simplesmente a perspectiva de aprovação, mas se você analisar o que seriam os resultados aqui, em termos de ganhos de eficiência, eu não consigo manter esse otimismo todo”.

Em relatório ainda na noite de terça-feira, analistas do Credit Suisse afirmaram que a MP tem pontos “mais positivos para a Eletrobras” e “alguns negativos para o setor”.

“A versão final exclui itens controversos que poderiam ameaçar a privatização e limitar potenciais ganhos, então nós vemos como positiva, uma vez que em nossa visão aumenta a possibilidade de aprovação (pelo Congresso)”.

Entre mecanismos retirados pelo relator do texto estava a previsão de que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) pudesse intervir no mercado livre de energia para evitar excesso de concentração de poder em algum agente, como a Eletrobras após desestatizada ou mesmo outras empresas.

A equipe de analistas do Santander apontou que o texto da MP acabou como “satisfatório” por “manter os principais elementos da proposta do governo”.

Mas mesmo eles destacaram que a matéria contou com “introdução de algumas políticas setoriais desnecessárias, que podem ter repercussão negativa para o restante do setor”.