Comprar ou vender?

No Brasil, economia é pura política

30 maio 2017, 11:53 - atualizado em 05 nov 2017, 14:02

Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.

Os mais recentes passos do presidente Michel Temer, trocando cargos em ministérios e substituindo peças no BNDES, deixou o mercado financeiro confuso quanto aos prognósticos de uma solução rápida para a crise política, ampliando a incerteza no cenário econômico. Ao mesmo tempo, as estratégias políticas e jurídicas para defender o mandato mostram a habilidade de organização do governo no ápice da turbulência.

Em entrevista ontem a jornais estrangeiros, Temer reiterou que não irá renunciar e avaliou ter apoio do Congresso para aprovar as propostas de austeridade fiscal nos próximos meses, o que significaria que ele tem habilidade para governar e permanecer no cargo. Ele admitiu não ter os 308 votos necessários para aprovar a reforma da Previdência na Câmara e admitiu que um fracasso nessa pauta não seria um “desastre”.

Enquanto o governo lança uma ofensiva, os aliados não se entendem em relação a um nome de consenso para assumir um eventual governo tampão, caso a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seja pela cassação da chapa eleita em 2014. O julgamento é considerado fundamental para a decisão dos partidos governistas em manter o apoio ao presidente e avançarem com a agenda de reformas.

Mas o presidente da Corte, o ministro Gilmar Mendes, frisou que o TSE não faz parte de um “joguete do governo” para dar “sobrevida” a Temer, reconhecendo a possibilidade de pedido de vista ao processo, o que delongaria a incerteza que pesa sobre o governo e a economia. Segundo ele, a Corte tampouco é um “instrumento de solução da crise política” e o processo exige um grande esforço de todos os envolvidos.

De qualquer forma, Temer já adiantou que se for cassado pelo TSE, irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), o que garantiria a permanência dele no poder por mais alguns meses. A estratégia dele é de sobreviver um dia de cada vez e usar as informações positivas da economia a seu favor para criar um ar de governabilidade. Mas a verdade é que o apoio do Congresso ao governo está fragmentado.  

Hoje, aliás, o presidente participa de um fórum sobre investimentos, que reunirá também os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo Oliveira (Planejamento), os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Eunício Oliveira, além de representantes do poder Executivo de São Paulo e empresários de vários setores econômicos.  

No evento, a equipe tentará convencer os investidores que o Brasil segue no caminho certo. Mas a profunda crise política que engoliu o governo Temer desde que ele foi acusado de aceitar propinas em esquemas de corrupção ainda aponta uma solução rápida via TSE para destituir o presidente como a melhor saída para atrair os recursos – estrangeiros, principalmente.

Com isso, a agenda doméstica segue em segundo plano. O destaque do dia é o IGP-M de maio (8h), que deve reduzir a queda de 1,10% registrada em abril e recuar 0,85% neste mês, com a variação em 12 meses acumulando uma pequena alta de 1,7%.

A queda nos preços calculados pelos IGPs ainda reflete a deflação nos produtos agropecuários e também no minério de ferro. No mesmo horário, sai a sondagem do setor de serviços. No Senado, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) vota o parecer sobre a reforma trabalhista, mas a oposição tentará obstruir a análise.

Também merece atenção o início da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que anuncia amanhã a decisão sobre a taxa básica de juros. A expectativa é que por mais que a recente crise política influencie na decisão, o Banco Central deve repetir a dose e reduzir a Selic em um ponto percentual (pp), por causa da dobradinha “inflação e atividade” – ambos em trajetória de queda.

No exterior, o dia começa com indicadores de confiança na zona do euro e termina com dados de atividade na China, em maio. Pela manhã, serão conhecidos os números sobre a renda pessoal e os gastos com consumo nos Estados Unidos em abril (9h30), além de indicadores sobre os preços de imóveis em março (10h) e sobre o sentimento econômico neste mês (11h).

Mal a semana começa para valer para os mercados internacionais e o mês vai chegando ao fim. Os investidores aproveitam a sessão de hoje e de amanhã para ajustarem as posições, antes que maio acabe, dando início às férias de verão (no Hemisfério Norte). Por ora, no exterior, o sinal negativo prevalece nas bolsas do Ocidente, após um dia positiva apenas para as praças na China.

Entre as moedas, o euro segue fragilizado pelos comentários suaves (“dovish”) da véspera do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mário Draghi, que afirmou que a região da moeda única ainda precisa de estímulos monetários. O dólar, por sua vez, é fortalecido pela perspectiva de aumento da taxa de juros norte-americana pelo Federal Reserve no próximo mês, o que também penaliza as commodities.

Nesse ambiente, o principal desafio para os investidores continua sendo avaliar a capacidade da economia mundial em garantir o crescimento em meio às atuações dos bancos centrais. É o comportamento desigual dos mercados sugere uma postura cautelosa, pois a habilidade do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de passar suas políticas pró-crescimento, reduzindo o papel dos BCs, também continua sendo um problema.

Em algum momento, Washington terá de entregar alguma coisa…Assim como Brasília.  

Leia mais sobre: