BNY Mellon

MPF quer que BNY Mellon pague R$ 8,2 bi ao Postalis como reparação por perdas em fundos

19 jan 2018, 8:01 - atualizado em 19 jan 2018, 0:15

Por Angelo Pavini, da Arena do Pavini

O Ministério Público Federal em São Paulo ajuizou ação civil pública contra o BNY Mellon Serviços Financeiros Distribuidora de Títulos e Valores para que sejam ressarcidos prejuízos estimados em mais de R$ 8,2 bilhões causados ao Instituto de Seguridade Social dos Correios e Telégrafos (Postalis) e seus beneficiários. Segundo o MPF, como única administradora dos recursos financeiros da entidade, “a ré praticou atos irregulares que dilapidaram o patrimônio do Postalis e obrigaram os participantes a arcar com uma contribuição extraordinária de 25,98% (além da ordinária de 9%) durante 180 meses.” Na ação, o MPF praticamente isenta a direção do Postalis, cuja participação em irregularidades e desvios está sendo investigada e chegou a ser confirmada no Brasil e no Exterior em pelo menos um dos casos, nas perdas do fundo.

O BNY Mellon foi contratado pelo Postalis para administrar diversos fundos de investimentos da fundação. Como administrador, o banco americano tinha a obrigação de controlar as contas dos fundos e o trabalho dos gestores de cada carteira, para verificar se eles estavam cumprindo o mandato definido com a fundação e se estavam agindo corretamente. Apesar de as regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) definirem que o administrador do fundo é quem contrata o gestor, na prática muitos gestores eram escolhidos pela própria fundação, que depois contratava o BNY Mellon como administrador. Mas quem faz a escolha dos ativos do fundo, compra e vende os papéis, é o gestor, não o administrador.

Na visão do Ministério Público Federal de São Paulo, porém, “ao administrar as carteiras próprias e terceirizadas da entidade de previdência privada, o banco podia escolher os investimentos, comprar e vender, administrar os valores investidos, bem como tinha a obrigação de vetar operações temerárias que pudessem causar prejuízos”. No entanto, diz o MPF, ao longo dos últimos anos, apurações da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), responsável pela fiscalização de entidades de previdência privada, resultaram em autuações contra o Postalis que “demonstram a responsabilidade da ré pelos prejuízos ao descumprir diversas regras da legislação vigente”.

O MPF cita a  Resolução do Conselho Monetário Nacional nº 3.792, que  estabelece que uma entidade fechada de previdência complementar (EFPC) deve identificar, avaliar, controlar e monitorar os riscos, incluídos os de crédito, de mercado, liquidez, operacional, legal, sistêmico, e a segregação das funções de gestão, administração e custódia. Também define que deve ser estabelecido um limite de alocação de recursos dependendo da classificação do investimento e seu grau de risco.

Segundo o MPF, a fiscalização realizada pela Previc “constatou que diversos investimentos realizados pelo BNY extrapolavam os limites fixados pela Resolução”. Em alguns casos, os recursos do Postalis em alguns fundos de investimentos passavam de 49% do patrimônio do fundo, quando o limite legal seria 25%. “E estas situações não eram circunstanciais, pois a ré também não cumpria o prazo legal para eliminar o desenquadramento, deixando de observar as condições de segurança e diversificação do investimento, gerando um risco e consequentemente causando prejuízos financeiros ao Postalis.”

Além dos casos de desenquadramento, segundo o MPF, o BNY Mellon também descumpriu o artigo 30 da Resolução CMN nº 3.792, que estabelece que a aquisição de títulos e valores mobiliários nos segmentos de renda fixa e variável, assim como a prestação de garantias em investimento de Sociedades de Propósito Específico (SPE), devem ser precedidas de análise de risco.

O MPF defende que o banco americano “tinha liberdade e poder de decidir onde seriam aportados valores”. “Os investimentos passavam por um processo de aprovação dentro do Postalis apenas para atender exigência de forma”, diz o MPF, que continua: “Raramente era feita análise de risco ou quando feita não era avaliada”. Diversos investimentos foram adquiridos por preço superior ao que valiam, há casos em que o Postalis pagou três ou quatro vezes mais que os outros cotistas e ficou com somente um quinto das cotas, ou seja, o valor pago não correspondia ao valor que deveria receber de cotas, afirma a ação. Para o MPF, fica claro que o BNY não desempenhou com lisura seu papel de administrador dos fundos, novamente causando danos ao patrimônio da entidade.

Taxas em sobreposição

Ao assumir contratualmente o papel de administradora fiduciária da carteira do Postalis, afirma o MPF, a ré condicionou a aplicação de recursos em fundos exclusivos administrados por ela. “Essa situação enseja sobreposição de obrigações de deveres que pode gerar conflito de interesses, na medida em que uma das funções do administrador fiduciário é justamente fiscalizar o gestor e o administrador do fundo de investimento”, diz o MPF.

Além disso, esta situação criava a sobreposição de taxas administrativas. Em várias situações, o BNY aplicou recursos do Postalis em fundos de investimentos tipo FIC, que concentravam investimentos em um terceiro fundo, também administrado pelo BNY. Isto levava ao pagamento de taxas de administração em sobreposição, “visto que a ré poderia ter aplicado o recurso diretamente no fundo de investimento de destino final, sem passar pelos intermediários”. Esta atuação caracteriza o abuso de direito praticado pelo BNY, segundo o MPF.

Para o Ministério Público Federal, os investimentos e atos irregulares realizados pela ré em nome do Postalis são a causa da situação deficitária e de verdadeira calamidade financeira em que se encontra o fundo de pensão. As transações realizadas pelo BNY nem ao menos tiveram rendimento equivalente ao de poupança e são, em muitos casos, deficitárias. E o impacto dessa administração desastrosa para os cerca de 130 mil participantes do fundo é a incerteza no futuro e no destino de suas economias de uma vida toda visando a segurança financeira na posteridade. Em razão do déficit causado pela ré ao Postalis, os participantes foram obrigados a pagar uma contribuição extraordinária durante 15 anos.

Com essa tese, o MPF quer que o BNY recompre as cotas de investimento do Postalis pelos valores informados pelo próprio banco, num total de R$ 6,2 bilhões. A ré também deve devolver R$ 1,2 milhões indevidamente cobrados do fundo como taxas de administração em sobreposição. E devido ao grave dano moral causado aos participantes, a ação pede o pagamento de R$ 20 mil a cada um, num valor total mínimo de R$ 1,9 bilhões, que deverá ser revertido ao Postalis, que identificará os participantes e repassará os valores.

O número da ação, de autoria do procurador da República Luiz Costa, é 5001172.70.2018.403.6100.