Moedas de commodities podem ser uma opção melhor do que stablecoins
Enquanto as stablecoins baseadas em fiduciárias são a antítese do princípio dos criptoativos de serem imunes às forças inflacionárias e políticas que desvalorizam as fiduciárias, criptoativos baseados em commodities podem ser uma grande inovação como uma proteção contra a inflação e, de fato, contra as fiduciárias.
Bitcoin foi definido legalmente como commodity pela Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CTFC, na sigla em inglês) desde 2015, considerado como uma “commodity virtual” na categoria de “commodities isentas”, juntamente com o ouro, petróleo, outros metais e commodities de energia.
As características de commodity dos criptoativos são uma das maiores proposições de valor sobre as moedas fiduciárias ou até mesmo sobre as stablecoins baseadas em fiduciárias.
No futuro, é provável que vejamos muito mais criptoativos baseados por commodities reais, como café, comida, água, além de recursos naturais como ar puro, minerais e energia elétrica.
Como as contrapartes do mundo real, criptoativos fixados ou baseados em commodities têm uma demanda medíocre até agora, mas isso pode mudar com o aumento dos preços de commodities e demanda, que vai fornecer proteção contra a desvalorização do dólar e volatilidade do mercado.
Associação de Commodities Virtuais
Os irmãos Winklevoss da corretora Gemini se empenharam em criar a VCA, Associação de Commodities Virtuais, que é uma organização autorregulatória (SRO) e patrocinada pela indústria para o câmbio e custodiantes de commodities virtuais.
A compra e venda de commodities reais e virtuais foram isentas da jurisdição da CFTC porque supõem que seus mercados à vista, diferentemente dos mercados derivativos, são usados para propósitos operacionais (como um fazendeiro comprando grãos) e não para especulação.
O propósito da VCA é de ser (1) uma organização regulatória independente e sem fins lucrativos que não opera nenhum mercado, (2) não vai ser uma associação de negociação, (3) não vai fornecer programas regulatórios para security tokens ou plataformas de security tokens, e (4) vai cumprir com os padrões globais e as melhores práticas para SROs.
Preços de commodities refletindo as baixas de décadas
Há uma preocupação sobre a proporção crescente dos metais preciosos físicos e seus derivativos em papel e quão baixo o juro no mercado de papel diminuiu os preços à vista do ouro e da prata.
Os preços de commodities estão estagnados há mais de uma década desde que a crise financeira global enfraqueceu a demanda, suprimiu a inflação e fortaleceu o dólar.
Após uma época de baixa volatilidade recorde, é possível que o futuro aconteça de forma diferente. Tensões geopolíticas estão aumentando, assim como as taxas de juros, além da oscilação dos mercados de ações e da montanha de endividamento global em US$ 260 trilhões.
Atualmente, ativos reais estão em sua valoração relativa mais barata para ativos financeiros em décadas, senão no século, e as proteções tradicionais contra a inflação (ouro e prata) estão pairando há décadas em baixa.
Isso se deve ao ambiente de baixa inflação em que estamos (que estimula as ações e suprime os ativos reais), mas, com as taxas crescentes de juros, parece que a demanda por commodities pode atingir o fundo do poço.
Commodities também são negativamente correlacionadas com o dólar americano (e positivamente correlacionado com o mercado emergente de moedas e ações) porque uma baixa no dólar encoraja mais compra de commodities precificadas em dólar.
Tiberius Coin: “democratizando” metais de commodity
A suíça Tiberius, gestora global de ativos de commodities e negociadora de metais, opera desde 2005. É baseada em Zug, agora conhecida como “Vale do Silício Cripto”.
Sua empreitada de ativo digital, Tiberius Coin, é um criptoativo de “proof-of-concept” (prova de conceito) que representa uma cesta de sete metais industriais mais essenciais para a produção de futuras tecnologias, desde robótica à exploração espacial.
O foco na Tiberius é na emissão e venda de metais físicos, não na venda da Tiberius Coin, que vai ser apenas um recebimento de entrega digital para recuperar o metal subjacente.
De acordo com seu whitepaper, conduziu uma “venda inicial de metais” (IMS, na sigla em inglês), e não uma oferta inicial de moeda (ICO), pois, diferente de uma ICO, já tem produto: metais.
Tiberius Coins foram emitidas como ERC-20, e farão a migração do blockchain da Ethereum para o da Zilliqa, para serem criadas quando um cliente comprar os metais físicos.
De acordo com o whitepaper: “o paralelo do mundo antigo seria a aquisição de metais de uma fundição, e depois pedir que um almoxarifado emitisse um papel de identificação sobre o produto subjacente, como um recibo”.
Cada Tiberius Coin tem uma reivindicação sobre os metais industriais subjacentes:
– metais para tecnologia: 25g de cobre, 5g de latão
– metais para veículos elétricos: 25g de alumínio, 6g de níquel, 1g de cobalto
– metais para estabilidade: 3mg de ouro, 1,5 mg de platina
Usando commodities para proteção contra criptoativos e fiduciárias
A proposição de valor da Tiberius é não ter correlação com cripto e seu valor não poder atingir zero devido aos incentivos de arbitragem para comprar Tiberius Coins quando a moeda estiver abaixo do preço do ativo subjacente, recuperá-la para os metais físicos e revendê-la.
Isso parece um mecanismo de estabilidade exagerado e pretensioso, mas Tiberius prevê que só os investidores vão aderir a essa prática, não as pessoas.
Já que os metais são altamente líquidos e negociáveis em todas as moedas fiduciárias (apesar de serem equiparados com o dólar) e, como a maioria das commodities, se valoriza durante uma época de inflação, Tiberius propõe que a Tiberius Coin pode ser uma proteção útil para as pessoas em mercados emergentes cuja moeda nacional está depreciando por conta da inflação, como a lira turca, o peso argentino e o bolívar venezuelano.
O que faz uma moeda de commodity se destacar como uma proteção de longo prazo é o valor de utilidade intrínseco dos metais e a demanda natural que, de acordo com a previsão, vai aumentar.
Essa é uma melhoria sobre as stablecoins de dólar, já que o dólar não tem mais valor intrínseco, apenas nominal, como um padrão de referência de preço global para câmbio, que pode mudar ou ser eliminada pelos competidores.
Como uma empresa suíça, a Tiberius também possui reservas de dinheiro em francos suíços, o que já é uma proteção contra o dólar, já que é negativamente correlacionado com o índice do dólar norte-americano (DXY) e é uma fuga para uma moeda segura em épocas turbulentas.
Os perigos de um ETF de ouro
Todos os ETFs (fundos negociados em bolsa) têm de rebalancear diariamente o valor patrimonial líquido (NAV, na sigla em inglês) de suas unidades excepcionadas, o que significa que devem comprar ou vender o ativo subjacente para realinhá-lo com o preço de cada uma das suas unidades.
É mais fácil de fazer isso com ETFs de ações que podem obter as ações mais facilmente do que o metal físico, preso em cofres.
Com qualquer ETF, incluindo metais preciosos, você nunca realmente possui um ativo subjacente mesmo se ele for um ETF físico (em contraste com contratos futuros).
Para ETFs físicos baseados em ouro, como as ações de ouro (GLD, na sigla em inglês) da SPDR, que são as maiores, com US$ 30 bilhões em ativos sob gestão (AUM), se a demanda surgir para ouro verdadeiro, além da demanda por ETFs de ouro, existe a possibilidade de que o fornecedor do fundo tenha dificuldade ao comprar ouro suficiente e rapidamente para atender a demanda e perder sua indexação.
A estratégia de investimento passivo, impulsionada pela proliferação de ETFs nos últimos anos, ainda precisa ser testada em um ambiente de mercado volátil. Existem US$ 5 trilhões investidos em ETFs no mundo inteiro, mas isso é uma ameaça à estabilidade.
Quando houver uma grande oferta nos mercados de ações, ações e metais preciosos se correlacionam e entram em pânico: essa oferta vai ser composta por ETFs já que existe uma duplicação na exposição dos investidores (e gestores de fundo) na posse de ações completa e diretamente por meio de investimentos em fundos de índice passivos e ponderado pelo mercado (como o SPY, ETF da S&P 500).
Quando acionistas começam a vender muito em uma ação, isso faz com que gestores e fornecedores de fundos componham a venda para rebalancear suas ponderações de ETF, o que poderia gerar pânico e afetar os ETFs de ouro e de ações.
No caso de um cisne negro (do qual o ouro é protegido), ter um ETF de ouro derivativo de papel não é tão valioso ou seguro quanto ter a posse do ouro físico. De forma semelhante aos acionistas subordinados de uma empresa a ser liquidada, eles só vão receber depois dos detentores de títulos e acionistas seniores.
Agora, as moedas baseadas em ouro, incluindo as stablecoins, estão no estágio inicial, mas fornecem uma alternativa interessante para os ETFs de ouro.
Criptoativos baseados em ouro
Digix Gold é uma das primeiras propostas de criptomoedas baseadas em ouro para começar a ser negociada, atualmente na Bitfinex e na Kryptono, corretora de Cingapura.
1 token de Digix Gold (DGX) representa 1g de ouro na Ethereum, que é apoiada por ouro pelos refinadores certificados da London Bullion Market Association (LBMA).
Parecidas com as stablecoins fixadas em dólar, essas criptomoedas só são criadas quando alguém quer comprar ouro em seu mercado ao enviar a quantidade necessária ao endereço de contrato inteligente (100g de ouro = 100 DGX e US$ 39 = US$ 3,900).
No entanto, o resgate físico é um processo muito complicado, já que o ouro só pode ser retirado dos cofres em Cingapura.
O whitepaper da Digix não fornece muitos detalhes técnicos, mas, considerando que o token tem seu preço originado do preço do ouro por grama (cujo preço à vista é valorado por onça), então o preço atual do token de US$ 39 por grama é “subvalorizado” em comparação ao preço à vista do ouro, de US$ 1,224 por onça (cerca de US$ 43 por grama).
Existem cerca de 83 mil DGX em circulação, com um mercado de capitalização de US$ 3,3 milhões.
Digix também tem o DGD, token de governança de DAO (empresa autônoma descentralizada), que dá acesso à plataforma para a tokenização de qualquer ativo real.
DigixDAO é uma organização auto-organizadora na Ethereum (é basicamente um contrato inteligente) que os detentores de DGX podem participar por meio de votação na governança e direção da plataforma ou por meio de propaganda e promoção.
Digix não é uma empresa completamente descentralizada, pois ainda requer custodiais externos em barras e, como stablecoins baseadas em fiduciárias, publica seus relatórios de posse auditados para garantir a confiança.
Alternativas para proteção contra o dólar
Enquanto é possível que a força do dólar a curto prazo continue, já que existem poucas alternativas seguras, é recomendado se proteger do dólar a longo prazo. Isso pode ser feito por meio de commodities que são correlacionadas com as moedas de mercados emergentes ou mesmo pelo direito especial de saque (SDR) do FMI.
SDR é um token conversível emitido pelo FMI ligado a uma cesta subjacente de moedas, incluindo o dólar, o euro, o yuan, o iene e a libra. Seu preço é ajustado diariamente e pode ser convertido em qualquer uma das moedas da cesta.
Apesar de o dólar ter a maior ponderação na cesta, os direitos especiais de saque têm uma correlação negativa com ele e, de forma contrária, se move em correlação com o franco suíço, mais seguro, em uma época de incerteza do mercado. Saga é um projeto de criptoativo que fixa seu valor ao SDR.
A demonstração do blockchain era de criar uma reserva de valor e autonomia de dados de governos e terceiros para reintroduzi-lo na forma de ativos virtuais parece algo contraditório.
Apesar disso, a narrativa de “cálice sagrado de cripto” é impulsionada pelos apoiadores de empreendimentos capitalistas e corretoras que emitem stablecoins de fiduciárias já que é “a baixa volatilidade de cripto pela qual todos nós estávamos esperando”.
Também se perde um grau de descentralização nas moedas baseadas em commodities, já que dependem inevitavelmente em terceiros para armazenamento físico.
Mas a detenção de uma moeda de commodity poderia ser uma proteção melhor contra a inflação a longo prazo do que as stablecoins de fiduciárias, já que ela vem para beneficiar o prêmio no ativo subjacente quando os preços das commodities se recuperam.
Além disso, as moedas de commodity dão o direito de um investidor recuperar ouro físico, diferentemente de um ETF que, em tempos turbulentos, vai correlacionar com outros produtos de ETF e pode ter menos valor nominal se não puder ser rebalanceado com as commodities subjacentes durante um cisne negro.