Mercado de moto elétrica vive ‘boom’, mas espera por produto passa de 1 ano
Entusiasta de novas tecnologias, o jornalista Victor Coelho, de 35 anos, viu na motocicleta elétrica da empresa brasileira Voltz uma forma de reduzir seu custo de deslocamento diário para o trabalho. Com o litro da gasolina vendido em São Paulo atualmente a quase R$ 7, o gasto para abastecer uma moto com tanque de 16 litros chega a R$ 116. Já o custo para um carregamento completo para a versão com duas baterias da moto elétrica EVS, da Voltz, sai por volta de R$ 2.
O caminho do jornalista até essa economia, no entanto, foi longo. Entre a compra da motocicleta e a entrega pela montadora, Coelho esperou 1 ano e 3 meses pelo veículo. E precisou ter paciência para relevar vários adiamentos. Enquanto isso, foi obrigado a manter sua motocicleta a combustão, tendo de renovar o seguro dela na virada de 2021 para 2022.
“Fiquei extremamente chateado com toda essa situação, porque realmente acreditava na empresa. Havia comprado mais do que uma moto, era uma crença em um projeto – tanto que também adquiri um capacete para vestir a marca por aí. Eu perdi totalmente essa paixão e entendo quem desistiu da compra e pediu ressarcimento”, afirma Coelho.
De acordo com a Voltz, empresa criada em Recife, problemas como o de Coelho ocorreram porque a empresa foi surpreendida com um grande interesse dos consumidores. Na pré-venda, iniciada em 2020, foram vendidas 2 mil motos em 15 dias.
Porém, a demanda e a oferta não estavam alinhadas. Então, os atrasos começaram. “Tivemos problemas como falta de matéria-prima, frete marítimo, entre outros desafios”, informou a empresa em e-mail enviado à reportagem.
Para amenizar os problemas, a companhia ofereceu “vouchers” de desconto em aplicativos de transporte para quem tinha comprado uma moto EVS.
Além da falta de peças e desafios produtivos, o preço das motos elétricas ainda é mais alto do que o de motos a combustão – elas chegam a custar o dobro, ou cerca de R$ 25 mil. Fora isso, há o tempo necessário para recarregar as baterias, de cerca de cinco horas.
A autonomia da moto elétrica também é menor do que a de uma moto a combustão, 180 km ante 640 km, mas o preço final ainda é mais baixo para o consumidor. Em um trajeto de 20 km, o gasto com combustível é de R$ 3,63 ante R$ 0,30 em uma elétrica – uma diferença de 1.000%.
O Estadão apurou que a empresa vendeu mais motocicletas do que teve capacidade de entregar aos consumidores. Entre outros componentes, a Voltz lida com escassez das baterias para as motos. Em grupos no aplicativo de mensagens Telegram, as críticas aos atrasos nas entregas são constantes em todas as publicações da empresa neste ano.
Mais capacidade
A companhia trabalha para ampliar a capacidade produtiva. Com uma nova fábrica em Manaus, a empresa planeja produzir, com montagem em dois turnos por dia, 2 mil motos ao mês. A fábrica deve começar a funcionar nos próximos dias.
A Voltz recebeu um aporte de R$ 100 milhões no ano passado para ampliar seus negócios no País. Além de ser voltada para consumidores finais, a startup vende os veículos em parceria com aplicativos de delivery, como o iFood. Outras companhias de entregas, como Loggi e Shippify, também estão no radar para novas parcerias.
Ignorado por líderes, segmento é disputado pelas startups
Enquanto as tradicionais líderes do setor ainda engatinham na eletrificação – a Honda só planeja lançar esse produto no País em 2024, e a Yamaha apenas anunciou sua entrada no segmento de scooters elétricas -, o setor está ganhando a atenção de startups, incluindo algumas que são apoiadas por negócios tradicionais.
De olho nessa tendência, a fabricante de eletroeletrônicos Multilaser fechou um acordo de aquisição da novata Watts, por R$ 10,5 milhões, em março. Com 22 concessionárias espalhadas pelas cinco regiões do País, a Watts é focada em veículos elétricos, como scooters e patinetes.
Mas a empresa já está indo além. Sua primeira motocicleta, chamada W125, é equivalente a um veículo de 125 cilindradas a combustão. Com autonomia de até 110 km e cinco horas de tempo total de recarga da bateria, a E-125 atinge até 100 km/h e tem preço de tabela a partir de R$ 20 mil.
“Queremos trazer a realidade mundial da mobilidade elétrica para o Brasil. Muito se fala sobre carro elétrico, mas há uma oportunidade nos veículos mais leves”, afirma Rodrigo Gomes, diretor comercial e cofundador da Watts.
Para crescer, a companhia vai apostar nas vendas para consumidores, empresas e governos. “Somos entusiastas da mobilidade elétrica. Na Ásia, vemos essa tendência urbana oferecendo praticidade às pessoas e reduzindo a emissão de gases poluentes no meio ambiente”, diz André Poroger, vice-presidente de produtos da Multilaser.
‘Virada verde’
Segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), no ano passado foram vendidos 1.424 veículos elétricos de duas rodas, entre motocicletas, scooters e triciclos – salto de 56% na comparação com 2020. Apesar de crescente, a parcela é apenas uma fração do mercado. Mais de 1,1 milhão de motocicletas foram vendidas no País em 2021.
Em dez anos, de 2010 para 2020, as motocicletas movidas a gasolina e etanol passaram de uma média de emissão de CO2 de 61 gramas por quilômetro rodado para 46 gramas, uma queda de 32,6%, de acordo com dados da Promot, programa de controle da poluição do ar do segmento. Considerando os dados de 2003 a 2020, a redução de emissões de CO2 das motocicletas no País chega a 57,3%.
Apesar do avanço, as motocicletas elétricas estão mais alinhadas à agenda de sustentabilidade das empresas, pois a emissão de poluentes por esses modelos é zero.
Entre para o nosso Telegram!
Faça parte do grupo do Money Times no Telegram. Você acessa as notícias em tempo real e ainda pode participar de discussões relacionadas aos principais temas do Brasil e mundo. Entre agora para o nosso grupo no Telegram!