Matheus Spiess: Quem tem medo do Ibovespa em 2022?
Dezembro é a tradicional época de publicar as projeções de diferentes indicadores para o ano seguinte. Quando se trata da Bolsa brasileira, especificamente, depois de um ano como este, as projeções para o Ibovespa (IBOV) são bastante interessantes.
Entendo, com isso, que eu possa estabelecer cinco pontos favoráveis para a exposição em ações nacionais no ano que vem, sobre os quais me debruçarei nas próximas linhas.
⦁ A performance dos emergentes
Comecemos com uma abordagem partindo do exterior, em que tivemos em 2021 um ano pouco atrativo para ativos emergentes. Com exceção do primeiro trimestre, quando o fluxo ajudou muito os ativos, a soma de imbróglios internacionais que se seguiu foi bastante prejudicial.
Revisão de expectativas na China, com ruídos regulatórios e de liquidez no mercado imobiliário chinês, alta da inflação no mundo desenvolvido, se provando menos transitória do que pensávamos, e novas ondas de Covid prejudicaram também a visibilidade de uma retomada saudável.
Tudo isso provocou uma pressão vendedora na qual os ativos emergentes já precificaram muito dos ruídos negativos possíveis. Observe a seguir a performance relativa dos ativos americanos (laranja), emergentes (verde) e chineses (azul).
Consequentemente, os mercados emergentes ficaram muito baratos relativamente ao histórico de desconto já existente contra os países desenvolvidos.
Em um contexto no qual a reabertura da economia seguirá acontecendo, a demanda de commodities ainda se mostrará presente e o ambiente chinês será menos impeditivo (estímulos anunciados pelo Banco Central e pelo governo), há espaço para um catch-up de valuation.
⦁ Barato em dólares
O Brasil tenderia a ganhar fluxo nessa dinâmica positiva para emergentes. E um dos motivos que nos deixam tão atrativos, entre outras coisas, é que a nossa moeda perdeu muito valor nos últimos meses. Agora, em dólares, é ainda mais barato comprar no Brasil do que era no passado.
Note abaixo como estamos no mesmo patamar do Ibovespa em dólares que durante o final do governo Dilma, no pré-crise de 2015 e 16.
⦁ Os lucros para os próximos 12 meses
Tal desconto, contudo, não se verifica somente em termos cambiais.
Considerando o patamar de preço sobre lucros projetados para os próximos 12 meses, também nos deparamos com ativos demasiadamente baratos frente ao histórico. Para ilustrar, sob esta ótica, o Ibovespa (excluindo Petrobras e Vale) negocia hoje por volta de 10 vezes frente uma média dos últimos 15 anos de 12,7 vezes.
Meu entendimento é de que, para que voltássemos para a média, esperando que o Banco Central consiga ancorar a inflação de volta aos 3,5% ao ano e que o país tenha um crescimento real de PIB estrutural de longo prazo na casa do 2% a.a., teríamos um Ibovespa rodando ao redor de 130 mil pontos, ou com aproximadamente 20% de alta para os próximos 12 meses.
⦁ O prêmio de risco da Bolsa
Além disso, se observarmos o prêmio de risco das ações (equity risk premium), que se traduz no inverso do preço sobre lucro projetado para os próximos 12 meses subtraindo os juros reais de 10 anos, o posicionamento é igualmente favorável.
Tivemos duas temporadas de resultados positivos que não se traduziram fidedignamente aos preços. Desta forma, mesmo que o ano que vem seja de pouco ou nenhum crescimento, o carrego de tal prêmio de risco ainda se mostra vantajoso.
⦁ Uma simulação assimétrica
Em simulação recente da brilhante equipe do Wealth High Governance, levando a consideração a curva longa de juros corrente, no patamar de atual (11%) há um alvo de 135 mil pontos para o Ibovespa, 5 mil pontos acima da simples projeção que traçamos com base no preço sobre lucro projetado para os próximos 12 meses.
Conclusão
Naturalmente, não estou dando certeza aqui que vai subir 20%, muito menos que este cenário, caso aconteça, se dará em linha reta. Há muita volatilidade e risco no radar.
Previsões certeiras são para os charlatões. Trabalhamos com probabilidades e cenários. Com isso em mente, há hoje uma grande chance de que o desfecho para o ano que vem seja positivo, por mais turbulenta que possa ser a trajetória.
Os riscos, por sua vez, ainda permanecem no radar.
No aspecto doméstico, temos uma eleição geral em 2022, que se mostra mais aquecida do que nunca. A tendência, porém, apesar de toda a retórica eleitoral, é que os polos convirjam para o centro; caso contrário, a terceira via ganhará cada vez mais espaço.
O evento enseja volatilidade, mas o quadro final, pós-eleição, pode ser positivo – o mercado não teme um Bolsonaro moderado, um Lula com Alckmin de vice ou uma terceira via reformista. Outra questão é o quadro de inflação e de pouco crescimento que nos aflige.
O aperto monetário, claro, não é exclusividade brasileira e nos acompanhará também por meio de outros países, com a devida atenção para o universo dos mercados desenvolvidos, em especial nos EUA.
Uma alta dos juros por lá, mais rápida do que o mercado precifica, pode gerar pressão no curto prazo para ativos emergentes.
Contudo, se o gradualismo verificado até aqui perseverar, podemos ter um ruído deste risco menos agressivo – a reunião de política monetária do Fed, marcada para ser concluída amanhã (15), será muito importante para nos dar um melhor norteamento sobre este ponto.
Tudo considerado, é possível ser construtivo para o Ibovespa em 2022. Com base no patamar de desconto e na possibilidade de fluxo para países emergentes, a exposição em ativos locais parece bastante assimétrica.
Ou seja, o valuation hoje é assimetricamente favoravelmente para uma exposição em bolsa. Tudo isso, claro, feito sob o devido dimensionamento das posições, conforme seu perfil de risco, e a devida diversificação de carteira, com as respectivas proteções associadas.
Vale sempre lembrar que o tamanho da posição deve variar em função de seu perfil de investidor, mas entendo que por menor que seja a posição, ela pode ser bem-vinda, desde que feita com a devida diversificação e responsabilidade, sabendo que há riscos, como os comentados, e a volatilidade fará parte do jogo.