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Marink Martins: Vivendo em um mundo dominado pela moeda norte-americana

30 abr 2019, 13:38 - atualizado em 30 abr 2019, 13:38

Por Marink Martins, do MyVOL e autor da newsletter Global Pass

Olá assinante MyVOL. Hoje trazemos para você o capítulo 2 do livro Clash of Empires, de Charles Gave & Louis-Vincent Gave, que estaremos disponibilizando em português, exclusivamente para você, em breve, em nossa área do assinante.

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Leia abaixo o capítulo 2: “Vivendo em um mundo dominado pela moeda norte-americana”.

“Você já pensou que fazer um discurso sobre economia é como mijar nas próprias calças? O tema é quente para aquele discursa; nem tanto para aquele que ouve.”

Lyndon B. Johnson, Presidente dos EUA

Uma das razões para a moeda americana ser tratada de uma forma um tanto especial está no fato de que, até então, os EUA aceitaram arcar, com o que pode ser descrito como, os custos associados a manter um “império”.

Tomemos o banco central americano, o FED, como exemplo. Desde 1946, a instituição desempenha dois papéis distintos. Sua função oficial é ser um provedor de liquidez para a economia americana ao mesmo tempo que mantém preços estáveis e desemprego baixo. Mas a instituição também desempenha um outro papel – este não tão oficial – que é ser um provedor de empréstimos de última instância para os outros bancos centrais durante períodos marcados por escassez de dólares. Seja através de empréstimos efetuados através do FMI ou, de forma mais direta, entrando em acordos de “swap” com os bancos centrais de outros países que mantenham boas relações comerciais com os EUA.

Até uma década atrás, países desenvolvidos que mantinham boas relações comercias com os EUA (Japão, Alemanha, o Reino Unido, a França e o Canadá) eram responsáveis por boa parte do crescimento do PIB mundial e pelos principais mercados de capitais globais. Em termos econômicos e financeiros, o resto do mundo não era tão relevante assim. Isso naturalmente mudou recentemente, abalando o poderio do FED.

Até recentemente, o FED não só exercia controle sobre os bancos comerciais americanos, mas também sobre aqueles bancos centrais que realmente “importavam”. Manter tal “controle”, de certa forma, significava ter em mãos o controle do ciclo econômico global. Assim, investidores cresceram acostumados a conviver em um mundo com um único ciclo econômico, um custo de capital preponderante, e uma taxa base para cálculos de retornos sobre investimentos (em inglês, ROIC). Tal ciclo normalmente ocorria da seguinte forma:

Passo 1: O FED reduzia a taxa básica de juros e comprava os títulos soberanos encarteirados pelos bancos comerciais. Com isso, o FED gerava “reservas” para tais bancos.

Passo 2: Crescia o estoque de dinheiro na economia ao mesmo tempo em que a taxa básica de juros era reduzida.

Passo 3: Os preços dos ativos financeiros (ações, títulos e ativos imobiliários) se valorizavam.

Passo 4: Com algum atraso, a economia norte-americana começava a reagir, liderada por mais investimentos em capital fixo e maior demanda por bens duráveis.

Passo 5: Com a elevação na demanda por tais produtos havia uma consequente deterioração na balança comercial norte-americana, gerando um déficit em conta-corrente. Assim, os EUA, aos poucos, começavam a transferir e a irrigar as outras economias com os dólares gerados nos EUA.

Passo 6: O setor privado internacional começava a acumular um excedente de dólares, que era, eventualmente, vendido ao banco central do país que, por sua vez, depositava tais recursos no FED. Assim, crescia o saldo dos recursos depositados pelos demais BCs no FED  (historicamente, 25% do déficit em conta corrente norte-americana acabava retornando como reservas depositadas por outros BCs no FED).

Passo 7: Para prevenir que suas moedas se valorizassem demais (e atrapalhasse o potencial exportador do país), os demais BCs também promoviam cortes em suas respectivas taxas básicas de juros e vendiam suas próprias moedas contra o dólar americano. Nestes casos, conforme suas reservas cresciam, o mesmo ocorria com suas respectivas bases monetárias. Por tudo isso, a métrica calculada pela Gavekal conhecida como Base Monetária Global (base monetária dos EUA mais reservas depositadas no FED em nomes dos diversos bancos centrais) começava a crescer rapidamente. Com isso, os mercados, quase sempre, entravam em um ciclo de alta (“Bull Market”).

Passo 8: Com os preços dos ativos em alta pelo mundo afora, especuladores começavam a obter dólares emprestados na expectativa de continuidade de declínio no valor da moeda americana. Esse era justamente o momento do ciclo em que livros eram publicados anunciando que o enorme déficit em conta corrente dos EUA era o prenúncio de uma derrocada do dólar e da própria economia americana. A posição vendida em dólares aumentava e as reservas dos BCs depositadas no FED aumentavam; desta vez, porém, com dólares emprestados ao invés de dólares oriundos do “trabalho”.

Passo 9: Com os preços das commodities subindo e o dólar em queda, a inflação começava a mostrar sua cara nos EUA. Com isso, o FED iniciava um ciclo de aperto monetário.

Passo 10: Com um atraso de um ou dois anos, aqueles que se alavancaram tomando empréstimos em dólares começavam a quebrar; isso ocorria tanto dentro dos EUA (como em 2008) ou fora do país (América Latina em 1982, Ásia em 1997 e Rússia em 1998).

Passo 11: O FED vinha para o resgate tanto no mercado doméstico, injetando liquidez no sistema, como no mercado internacional, através do FMI e linhas de “swap”.

E aí, iniciava-se novamente o ciclo, com a taxa básica de juros sendo reduzida, e o estoque de dinheiro nos EUA se expandindo.

Contudo, além dos fluxos descritos acima, um outro fator impactava os balanços patrimoniais pelo mundo afora; uma expansão tripla detectada por Rueff durante os anos 60.

Primeiramente, a expansão de crédito ocorrida nos EUA levava a uma expansão dos níveis de endividamento dentro do próprio EUA. Depois, a própria transferência de dólares para as outras economias através do déficit em conta corrente americano, também levava a um crescente endividamento nos países que se beneficiavam de tal transferência. Por último, o sistema se equilibrava com as reservas estrangeiras retornando aos EUA para financiar o déficit fiscal norte-americano. Tal processo era o que Rueff chamava de “the exorbitant privilege” – uma condição que eventualmente levava ao que é também chamado de a “dupla pirâmide do crédito”.

O sistema descrito era lindo, simples e, mais importante, funcionava! Agora, por diversas razões, argumentamos que tal sistema já não é mais uma descrição apropriada do que realmente ocorre.

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