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Maísa Oliveira: Há um descasamento momentâneo entre ativo e passivo?

03 nov 2021, 6:29 - atualizado em 04 nov 2021, 13:33
Maísa Oliveira
“Momentos difíceis na Bolsa exigem que os objetivos sejam adaptados a uma nova realidade”, disse a colunista (Imagem: Devant Asset/Divulgação)

O mercado financeiro de maneira geral vive um momento intenso de ajustes devido ao cenário que se desenhou e às expectativas – ou falta delas – sobre os rumos econômicos e políticos que o Brasil seguirá nesse e no próximo ano. Momentos como esse exigem que os objetivos sejam adaptados a uma nova realidade.

Quem acompanha esse mercado de perto, como eu faço há aproximadamente quinze anos, percebe como os movimentos acontecem de maneira cíclica. Os motivos variam entre uma questão ou outra, mas existe uma similaridade de comportamento dentro de uma volatilidade típica de Brasil – sim, nós brasileiros somos guerreiros em muitos sentidos, por que com relação aos investimentos seria diferente?

Dentro desse contexto, existem produtos financeiros que são um pouco mais influenciados por esses fatores do que outros. Os ativos que dependem de mais de uma variável, como é o caso das operações estruturadas, podem sentir essas influências de forma mais acentuada.

A alta da Selic torna o crédito mais caro e acaba fechando algumas portas. O mercado financeiro se ajusta, os prêmios de risco de crédito são revistos e as possibilidades tornam-se mais escassas. Se, por um lado, isso acaba atrapalhando as expectativas de muitas empresas, por outro, pode beneficiar o investidor do crédito privado.

Desde o início de 2021, o destino da taxa básica de juros já estava traçado, só não era possível prever em qual velocidade aconteceriam os ajustes. Acompanhando a evolução da inflação, era totalmente previsível que a taxa Selic encerrasse o ano em um patamar muito diferente dos 2% ao ano com que fechamos 2020.

Com o crédito mais difícil, o incorporador precisará buscar meios para financiar seus projetos e o mercado de capitais ficará ainda mais em evidência. Esse incorporador agora terá um poder de negociação menor e alguns ativos usados para levantar recursos, como os CRIs, exigirão remuneração mais alta para o mesmo pacote de garantias.

Dados da Anbima mostram que as emissões de CRI permanecem aquecidas: até setembro desse ano, o volume emitido já superou o montante total anual dos últimos sete anos. Somente no último mês foram emitidos R$ 3,5 bilhões em CRI. E a expectativa é de que esse ritmo se mantenha, afinal de contas, um cenário de juros altos beneficia os ativos de renda fixa e, com isso, o apetite do investidor aumenta.

Então nos encontramos em um momento curioso. O principal passivo do CRI atualmente são os fundos imobiliários, ativo de renda variável que acaba sendo penalizado pelo mesmo motivo que beneficia seu principal ativo investido. O apetite do investidor do FII diminui e o do investidor do CRI, aumenta: seria esse um descasamento de expectativas momentâneo e já esperado para o FII de CRI?

É razoável esperar que o momento traga alguns desafios e desconfortos, afinal, para os FIIs pode ser um momento singular para agregar melhores ativos à carteira em termos de taxas e garantias. E é óbvio que o gestor do fundo espera poder contar com tais ativos para manter a carteira diversificada e, consequentemente, mais segura e rentável para o investidor. Ao mesmo tempo, o investidor do FII pode se sentir receoso, principalmente aquele que por não avaliar a coerência entre preço versus remuneração e expectativas macroeconômicas acabou pagando um alto preço pelos ativos.

O que é preciso deixar claro para ambos os lados é que o momento exige ponderação. O gestor do seu FII não é um mau gestor por querer agregar bons ativos ao portfólio, pelo contrário, ele está olhando muito mais à frente do que você imagina. Já o investidor também não é obrigado a se sentir confortável em um momento de mercado em baixa, no qual possivelmente ele está vendo seu patrimônio ser reduzido.

Por isso, para enfrentar esse cenário, separei quatro dicas que aplico no meu dia a dia, com relação aos meus investimentos pessoais:

  • Sabe aquela frase dita por Warren Buffett que já lemos possivelmente mil vezes? “O mercado de ações transfere dinheiro dos impacientes para os pacientes.” O mesmo princípio se aplica aos demais investimentos. Dê um tempo para o mercado mostrar mais previsibilidade, tenha paciência. Visão de curto prazo para os investimentos não funciona.
  • Ouça somente quem entende do assunto com propriedade. Você tem dado ouvidos a qual tipo de opinião? Quando o assunto é CRI, um dos ativos mais complexos do mercado, qual é o nível de conhecimento dessa pessoa? Tem experiência com a complexidade das operações estruturadas? Procura entender do assunto em níveis técnicos? Cuidado com quem te influencia. No final, não será essa pessoa que colherá seus prejuízos, será você mesmo. Procure seriedade, responsabilidade e conhecimento técnico nas opiniões que considera.
  • Serei eterna defensora da diversificação. Busque ter várias classes de ativos em sua carteira, com isso vocês sentirá a volatilidade do mercado com menos intensidade. Não é a primeira vez que o mercado de FIIs está em baixa e não será a última. Assim como em algum momento estará em alta novamente.
  • Busque enxergar valor e não somente o preço. Claro que o preço é importante, deve ser avaliado, calculado e ponderado. Mas ao considerar também o valor dos investimentos, do ativo, e da gestão no longo prazo, você perceberá que tomou decisões mais acertadas.

Por fim, este artigo tem o objetivo de reforçar que o mercado financeiro é mais complexo do que a maioria de nós, investidores recentes, estamos acostumados. Abrange vários fatores, e por isso, também é tão envolvente e apaixonante. Mas, neste momento, vamos tentar trazer mais racionalidade às nossas opiniões e decisões.

“Quando compramos porções de um negócio excelente, com gestão excelente, nosso horizonte de tempo favorito para o investimento é: para sempre.” – Warren Buffett

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