Internacional

Madonna é bem-vinda, mas Portugal quer mesmo mais imigrantes

30 jul 2019, 12:23 - atualizado em 30 jul 2019, 12:23
Portugal quer imigrantes para ajudar a impulsionar a economia, diante do envelhecimento e baixa taxa de natalidade da população (Imagem: Mario Proenca/Bloomberg)

Portugal não quer atrair apenas celebridades como Madonna e o príncipe Aga Khan.

Ao contrário de muitos governos na Europa, Portugal quer imigrantes para ajudar a impulsionar a economia, diante do envelhecimento e baixa taxa de natalidade da população. Embora tenha seduzido os ricos — Madonna procurava uma casa em Lisboa em 2017, e Aga Khan recebeu nacionalidade portuguesa este ano –, o país agora quer de volta os cidadãos que fugiram da crise da zona do euro e atrair imigrantes que possam ocupar postos de trabalho fundamentais.

“A questão não é apenas receber imigração. É receber imigrantes qualificados para as necessidades da economia portuguesa”, afirmou Jorge Bravo, professor de economia da Universidade Nova de Lisboa. “Sobretudo em salários, nós somos pouco competitivos. Se tivéssemos um campeonato dos países mais procurados como destinos para a imigração, Portugal não estaria na Champions League.”

Portugal se prepara para eleições gerais em outubro, e a falta de imigrantes, não sua presença, pode ser tema de campanha dos políticos. Ao contrário da Itália e da Hungria, onde os partidos anti-imigração de Matteo Salvini e Viktor Orban estão no comando, e da França, onde o partido de Marine Le Pen liderou a votação do Parlamento Europeu em maio, Portugal não tem forças populistas na liderança. Na verdade, algumas empresas portuguesas querem que os políticos apresentem planos coerentes para atrair imigrantes.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Mercado de trabalho

“É urgente a introdução de melhorias substanciais nas políticas de acolhimento de trabalhadores estrangeiros”, disse José Theotonio, presidente do Pestana Hotel Group, a maior operadora hoteleira de Portugal. “A falta de profissionais já causa preocupação no presente e tem um forte impacto futuro.”

O setor de turismo e hospitalidade está entre os que mais sentem a falta de mão de obra. Encontrar pessoal de “housekeeping” e cozinha adequadamente qualificados tem sido o “mais complicado”, disse Theotonio. Ele quer que o governo torne as regras trabalhistas mais flexíveis para a contratação de trabalhadores temporários e sazonais.

O turismo representa cerca de 14% do PIB de Portugal e tem impulsionado a economia, que se expandiu pelo quinto ano consecutivo em 2018. A expansão econômica ajudou o governo socialista de minoria do primeiro-ministro António Costa a reduzir o desemprego e administrar o déficit orçamentário. A taxa de desemprego de Portugal, de 6,6% em maio, era menos da metade dos 13,6% da Espanha e abaixo da média da zona do euro, de 7,5%.

Falta de mão de obra

Ainda assim, a relação dívida/PIB de Portugal continua a ser a terceira mais alta da zona do euro, atrás da Grécia e da Itália, e, para manter o motor de crescimento funcionando, o país precisa de mais mãos.

O Banco de Portugal alertou em relatório de 12 de junho que “alguns indicadores sugerem a existência de dificuldades nas empresas portuguesas para a contratação de trabalhadores, em particular, com maiores níveis de qualificação”.

O número de imigrantes em Portugal aumentou 14% em 2018, para 480,3 mil, o maior desde pelo menos 1976, segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Esse número não foi suficiente para compensar o encolhimento da população, que vem diminuindo desde 2010 e somava cerca de 10,3 milhões no fim de 2018. Projeções apontam que o número de habitantes pode cair para 7,9 milhões em 2080.

Braços abertos

“O país está de braços abertos para os portugueses que querem voltar”, disse José Luis Carneiro, secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, em uma apresentação de medidas em 22 de julho para que cidadãos voltem. O governo está oferecendo até 6.536 euros (US$ 7.276) para os que quiserem voltar.

Portugal foi de certa forma bem-sucedido em atrair os chamados residentes não habituais. Atraídos pelas praias, clima agradável, vida descontraída e, fundamentalmente, benefícios fiscais, quase 30 mil pessoas agora chamam Portugal de lar. Um terço deles recebe pensões no exterior.

O governo tem sido criticado por isenções fiscais para ricos. Críticos também dizem que a presença de estrangeiros abastados aumentou os valores dos imóveis e expulsou moradores locais, devido aos preços altos. O regime permite que expatriados paguem apenas 20% do imposto de renda durante uma década e isenta completamente alguns aposentados de impostos.

Cingapura

“Os aposentados dinamizam localmente alguns setores ligados sobretudo ao turismo e ao lazer, como se registra no Algarve, ou nas cidades de Lisboa e Porto, e em pequenas zonas do interior”, disse Bravo. “Mas não é a solução.”

Em 23 de julho, o governo ampliou o regime para incluir agricultores e operadores de máquinas à lista de profissões qualificadas, citando dificuldades na contratação de trabalhadores.

Portugal precisa de uma “política de imigração inteligente”, como em países como Cingapura e Canadá, que não seja baseada apenas em incentivos fiscais, disse António Horta Osório, presidente do Lloyds Banking Group e cidadão português, em conferência realizada nos arredores de Lisboa, em 17 de maio.

“Temos um problema de demografia extraordinário comparado com o resto da Europa”, disse. Portugal deve trabalhar para atrair “pessoas com as qualificações e as competências que as nossas empresas e a sociedade necessitam”, acrescentou.