Opinião

Luciana Gualda: taxar grandes fortunas é a melhor saída para a pandemia?

24 jun 2021, 20:44 - atualizado em 24 jun 2021, 20:46
Luciana Gualda
“O imposto sobre grandes fortunas está previsto desde a promulgação da Constituição de 1988”, comenta a colunista (Imagem: Luciana Gualda/Divulgação)

O imposto sobre grandes fortunas, de competência da União, previsto desde a promulgação da Constituição de 1988, ainda não foi regulamentado.

Motivo pelo qual o PSOL ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 55, cuja relatoria é do ministro Marco Aurélio Mello.

O que se requer é a declaração de omissão inconstitucional do Congresso Nacional, uma vez que já se vão mais de 30 anos e não houve a regulamentação, a qual deve ser realizada por meio de lei complementar.

O PSOL argumenta que, tributar as grandes fortunas é ir de encontro aos fundamentos da República na construção de uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.

Como relator, o ministro Marco Aurélio Mello já proferiu seu voto acatando a tese do PSOL, a fim de declarar a omissão do Congresso Nacional em criar imposto sobre grandes fortunas, entretanto, sem fixar data limite para que o Congresso Nacional supra a omissão.

O voto do Ministro Marco Aurélio Mello aponta que a regulamentação do imposto sobre as grandes fortunas teria o condão de “promover a justiça social e moralização das fortunas”, além de ir de encontro ao princípio da capacidade contributiva, bem como aponta sua importância como mecanismo necessário ao incremento da arrecadação, para fazer frente a perda de receita e aos gastos gerados pela grave crise econômica dos entes federados, agravada em decorrência da pandemia da Covid-19.

O voto do Ministro Marco Aurélio Mello aponta que a regulamentação do imposto sobre as grandes fortunas teria o condão de “promover a justiça social e moralização das fortunas” (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)

Entretanto, paradoxalmente a progressividade e a busca da justiça fiscal esperadas, a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas pode ter o efeito contrário ao previsto, uma vez que as grandes fortunas são bastante voláteis, possuindo a maleabilidade de optarem por domicílios fiscais atraentes, caso o atual deixe de sê-lo.

Fato já vivenciado em muitos países que regulamentaram tal imposto, sem sucesso. Ou seja, as bases tributáveis são voláteis e os contribuintes são nômades e, em suma, parafraseando José Eduardo Faria: “a riqueza é que escolhe onde quer ser tributada”.

Assim, a arrecadação pode, ao invés de aumentar, reduzir significativamente, principalmente quanto aos bens e artigos de luxo que são consumidos por esse seguimento, bem como, invariavelmente, traria impactos negativos na economia.

Dessa forma, não me parece que a tese do PSOL e o entendimento do ministro Marco Aurélio Mello, pautados pelo clamor do momento, na urgência de suprir os gastos decorrentes da pandemia da COVID-19, que apenas acirrou ainda mais o déficit nas contas públicas, seria o caminho viável para que efetivamente houvesse incremento da arrecadação e a distribuição de justiça social.

Longe disso, enquanto a preocupação for superficial quanto a se tributar grandes fortunas, que repita-se – jamais serão oneradas, sem que se enfrente as questões tributárias, dentre outras, que tornam nosso país pouco atraente aos investidores nacionais e estrangeiros, isso, aliado à gastança generalizada, desmensurada, descabida e imoral do setor público, estaremos sempre remando contra à maré.

Texto escrito por Luciana Gualda: Advogada, Mestre em Direito Internacional Econômico e Tributário, Especialista em Direito Tributário e em Planeamento Tributário, Membro do GETRIC (Grupo de Estudos sobre os Sistemas Tributários Contemporâneos), Mentora do Tributação em Pauta, sócia do Montezuma & Conde Advogados Associados.