Cultura

Livro revela trajetória turbulenta e de sucesso de Steve Madden

12 set 2020, 9:03 - atualizado em 09 set 2020, 12:32
O livro é um valioso manual, muitas vezes fascinante, da ascensão de um homem à riqueza (Imagem: Divulgação/Amazon.com)

Às 6h do dia 20 de junho de 2000, a polícia e agentes federais com equipamento antimotim entraram no apartamento do designer de calçados Steve Madden, na Mercer Street, em Nova York, com um mandado de prisão.

Madden, então com 40 e poucos anos, foi implicado no escândalo financeiro da corretora Stratton Oakmont, que será familiar para qualquer pessoa que tenha assistido ao filme “O Lobo de Wall Street“, de Martin Scorsese. Quando perguntaram, explica Madden, ficou “contente” em comprar e vender ações no dia da oferta pública inicial de uma empresa, estratégia conhecida pelo jargão “flip”, e ganhar rapidamente de US$ 20 mil a US$ 40 mil para investir no negócio, escreve Madden em suas memórias a serem publicadas no livro “The Cobbler: How I Disrupted an Industry, Fell from Grace & Came Back Stronger Than Ever” (Radius Book Group, US$ 27; 13 de outubro), que ele escreveu com Jodi Lipper.

Em uma das muitas reviravoltas do destino que apimentam seu livro, Madden não estava realmente em seu apartamento no dia em que o FBI foi prendê-lo. Ele estava alguns andares acima, em um segundo apartamento que estava alugando no mesmo prédio, e dormiu durante todo o drama. “Foi provavelmente a melhor noite de sono que eu teria por vários anos”, escreve.

“The Cobbler”, que significa sapateiro e, na verdade, é um apelido que o fundador da Stratton Oakmont, Jordan Belfort, deu a Madden, é uma combinação ocasionalmente dissonante de um livro de autoajuda, um mea culpa no estilo de 12 passos e uma narrativa triunfante do tipo “eu construí isso”.

Embora muitas das lições introspectivas de Madden não sejam esclarecidas, na melhor das hipóteses, a lição de seus 2 anos e meio de prisão, sim: “Eu estraguei tudo, paguei meu preço e acho que tive que seguir esse caminho para chegar onde estou agora”.

O livro é um valioso manual, muitas vezes fascinante, da ascensão de um homem à riqueza. Se Horatio Alger fosse transportado para a década de 1990 e desse a seus personagens um vício em opioides, essa também poderia ser sua história.

Inspiração

A carreira de Madden começou de forma nada auspiciosa.

Madden, o caçula de três irmãos em uma família infeliz de classe média, a caminho do alcoolismo quando deixou a faculdade, conseguiu emprego como vendedor porta a porta para uma empresa atacadista de calçados chamada L.J. Simone, fundada por um de seus amigos de infância. “Havia um problema”, escreveu.

“Eu havia tirado minha carteira de motorista aos 16 anos, mas a perdi bem na época em que comecei a trabalhar na L.J. Simone porque tinha muitos DUIs”, escreve em referência às multas por dirigir embriagado.

Além disso, continua, “dirigia mal para começar, mas tenho vergonha de dizer que também estava chapado quase o tempo todo, mesmo quando estava dirigindo”.

Em um dos muitos feitos inexplicáveis de charme, ousadia ou força de vontade, Madden não só teve sucesso como vendedor porta a porta sem carteira de motorista, como também foi capaz de usar suas conexões para abrir sua própria empresa de calçados alguns anos depois.

Madden ficou sóbrio em 1989 (com várias recaídas na década seguinte) e rapidamente demonstrou uma aptidão que beirava a genialidade para criar sapatos para o espírito da época. “Meus poros estavam sempre abertos”, escreveu, “e eu recebia minha inspiração de tudo ao meu redor”.

No início da década de 1990, “havia marcas de luxo e de alto padrão e marcas de descontos mais baratas”, diz Madden no livro. “As duas eram totalmente separadas, e parecia que não havia nada entre elas. Meus sapatos ocupavam aquele espaço e atraíam garotas da Geração X que não podiam pagar ou não queriam usar os estilos que viam nas revistas de moda.”

Quantia “ridícula”

Ele abriu sua primeira loja independente em 1993, quando tinha 30 e poucos anos, o que nos leva de volta à Stratton Oakmont.

Madden foi apresentado a Belfort por meio de outro amigo de infância e recebeu US$ 500 mil de “alguns caras da Stratton“ como investimento inicial.

Em seguida, a Stratton levou a empresa de Madden à bolsa com 3 milhões de ações “avaliadas em US$ 15 milhões, uma quantia verdadeiramente ridícula para uma empresa com uma loja e alguns pares de sapatos populares”, escreve Madden. E ainda, continua, “se você comprasse ações da Steve Madden naquele dia, mesmo com o preço inflado, e ficasse com elas, seria muito rico hoje”.

Além de mencionar que seus novos milhões eram como “ganhar na loteria”, Madden não reflete sobre as vantagens do sucesso.

Ele alega que nunca gastou dinheiro em nada além da empresa; os leitores descobrem que ele tem uma casa nos Hamptons apenas quando menciona, como um aparte, que a colocou como garantia para cobrir sua fiança de US$ 750 mil quando foi preso.

Em 2001, ele se confessou culpado de acusações de fraude em valores mobiliários e lavagem de dinheiro relacionadas a operações irregulares com duas firmas financeiras distintas.

Até então, Madden teve recaídas várias vezes, embora tenha substituído o álcool por Vicodin. Mas, embora Steve Madden estivesse desmoronando como pessoa, a empresa Steve Madden mostrava melhor desempenho do que nunca. No final de 2005, ano em que Madden saiu da prisão, a empresa tinha mais de 100 lojas apenas nos Estados Unidos.

Modelo

Madden dá crédito a seus funcionários e, por extensão, a seu talento como executivo, pelas realizações da empresa. “As reuniões de maior sucesso são aquelas em que uma grande decisão é tomada e cinco pessoas diferentes saem da sala pensando que foi ideia delas”, diz. “A empresa ganha quando a equipe detém a propriedade.”

E assim, apesar de relatos segundo os quais ele grita com funcionários, joga o telefone na parede repetidamente e “testa” um possível novo contratado exigindo que ele retorne mais cedo das férias para uma entrevista, Madden aparece como um gerente de nível executivo improvavelmente eficaz.

No final do livro, porém, o quanto de suas realizações pode ser creditado à sorte é uma questão em aberto.

Mesmo quando o filme “O Lobo de Wall Street“ foi lançado, Madden conseguiu tirar vantagem. “O filme também aumentou o conhecimento da nossa marca entre homens jovens e elevou o reconhecimento do nosso nome”, escreveu. “Ninguém pareceu usar meus erros contra mim.”