Sustentabilidade

Jovem indígena do Amazonas luta para proteger floresta da “ganância”

12 out 2020, 16:00 - atualizado em 09 out 2020, 13:08
Amazônia Desmatamento Meio Ambiente
A ameaça recente ao bioma, estimulou Samela a ampliar seu escopo de atuação (Imagem: Reuters/Ueslei Marcelino)

Precisamos defender o que é nosso, o que é natural, porque o indígena é uma extensão da natureza e ela é uma extensão da gente, afirma a ativista ambiental e indígena Samela Sateré-Mawé, uma jovem estudante de biologia que se juntou ao movimento internacional Fridays for Future em sua luta pela preservação da floresta amazônica.

Com 24 anos e nascida em Manaus, Samela diz que como indígena a questão ambiental sempre esteve muito viva na sua história. “Ativismo ambiental é só um nome diferente para o que a gente já fazia há muito tempo. Então, as minhas raízes enquanto indígena, enquanto Sateré-Mawé, enquanto mulher só acentuaram essa questão”, disse ela à Reuters.

A ameaça recente ao bioma, em evidência especialmente desde o ano passado, quando os registros de queimadas e incêndios florestais na região dispararam, estimulou Samela a ampliar seu escopo de atuação.

Agora, além dos estudos e do trabalho como artesã –impulsionado pela confecção de máscaras em meio à pandemia de Covid-19–, ela também apresenta vídeos em um canal no YouTube e atua no Fridays for Future (FFF; em português, Sextas-Feiras pelo Futuro), projeto iniciado pela adolescente e ativista sueca Greta Thunberg.

Greta, de 17 anos, ficou conhecida internacionalmente desde que decidiu promover greves escolares, em 2018, em frente ao Parlamento da Suécia para exigir ações em defesa do meio ambiente, e desde então tem espalhado sua ideia pelo mundo.

Para Samela, a adolescente sueca é uma inspiração por se preocupar com todo o planeta mesmo sendo tão jovem, mas as principais influências da estudante brasileira são suas próprias raízes indígenas, que ela vê como a base de sua atuação no movimento ambiental.

Samela vê os indígenas como os principais defensores das causas ambientais (Imagem: Reuters/Bruno Kelly)

Samela vive em comunidade com seis famílias no bairro de Compensa, na periferia de Manaus (AM), onde está localizada a Associação de Mulheres Indígenas Sateré-Mawé. A etnia, segundo o Instituo Socioambiental (ISA), contava em 2014 com 13.350 integrantes.

A jovem indígena se preocupa com efeitos negativos da política ambiental brasileira à preservação da Amazônia, afirmando que medidas recentes do governo também contribuíram para que sua atuação em prol do meio ambiente aumentasse.

Desde a campanha eleitoral de 2018, o presidente Jair Bolsonaro defende o fim da demarcação de terras indígenas no Brasil, apoiando o desenvolvimento da região amazônica com mineração e agricultura.

Já Samela vê a questão de outra forma, afirmando que os indígenas devem ser reconhecidos como os principais defensores das causas ambientais. Para ela, os territórios indígenas são uma das maiores garantias de preservação no país.

“Tem muitas pessoas, ainda, que aceitam, respeitam os povos indígenas, e acreditam que nós temos a solução para o futuro. Porque nós somos os principais defensores da floresta”, disse.

Terras indígenas, no entanto, têm visto o avanço das queimadas e desmatamento. Segundo dados publicados pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), foram registradas 17 mil queimadas em 345 áreas de terras indígenas no Brasil em 2019, alta de 87% na comparação anual.

Na Amazônia, o mês passado teve as piores queimadas em uma década, com 31.017 focos, avanço de 61% (Imagem: Reuters/Bruno Kelly)

Apenas na Amazônia, foram mais de 6 mil incêndios em terras indígenas, avanço de 67% em relação a 2018.

“As queimadas me deixam muito triste, porque nós estamos perdendo grande parte do nosso território. Não falo só enquanto Amazônia, mas território brasileiro em si –outros biomas, como o Pantanal”, afirmou Samela.

O último mês de setembro foi o pior desde 1998 em termos de queimadas no Pantanal, com 18.259 focos de incêndio, alta de 201% no ano a ano, segundo números do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Já na Amazônia, o mês passado teve as piores queimadas em uma década, com 31.017 focos, avanço de 61%.

Em seu discurso na abertura da última Assembleia-Geral das Nações Unidas, o presidente Bolsonaro voltou a defender as políticas ambientais de seu governo, afirmando que grande parte dos incêndios registrados na Amazônia ocorre no entorno da floresta e é causada por índios e “caboclos” em áreas já desmatadas.

Mas na contramão, a futura bióloga Samela diz que o principal empecilho na luta contra o desmatamento é a ganância.

“A gente está perdendo o que a gente tem de melhor. O principal empecilho na defesa da floresta é a ganância. A ganância das pessoas em lucrar sempre –que é um pensamento não indígena, que não tem o pensamento de juntar riquezas… Para nós, a natureza sempre vai estar. Só que isso está ameaçado agora”, disse.

“Se a gente perder isso, consequentemente a gente vai morrer… Nós precisamos da floresta, nós precisamos da Amazônia, nós precisamos do meio ambiente para que as coisas não entrem em colapso.”