Inversa

Ivan Sant’Anna: Orgia de Carnaval

04 mar 2019, 19:34 - atualizado em 04 mar 2019, 19:34

Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite

Caro Leitor,

Durante quase vinte anos eu folguei nos feriados americanos e trabalhei nos brasileiros, mesmo quando estava aqui no Rio. Memorial Day (última segunda-feira de maio), Labor Day (primeira segunda-feira de setembro),Thanksgiving Day (a quarta quinta-feira de novembro), entre outras, eram datas nas quais eu não ia trabalhar.

Embora tivesse cadeira cativa em um escritório de Chicago (20 South Wacker Drive) e em outro de Nova York (Four World Trade Center 5th floor), a maior parte do tempo eu ficava numa mesa de operações de um banco situado no 17º andar de um prédio na esquina de av. Presidente Vargas com Rio Branco, bem no Centro. De lá, não tinha como não assistir o desfile militar de 7 de setembro, nem os desfiles de escola de samba do terceiro grupo, no Carnaval, nem diversas passeatas no dia de Corpus Christi.

Nessas datas, eu trabalhava sozinho na mesa de operações e almoçava uma marmita que levava de casa. Como ninguém iria ligar a central de ar-condicionado de todo um prédio só por minha causa, costumava abrir todas as janelas da enorme sala. E por elas entravam as marchas militares na Independência, os sambas-enredos no Carnaval e a música gospel no Corpus Christi.

Não sei se inspirado pela diversidade musical, ou contagiado pela festança lá embaixo, ou encorajado pela minha solidão, o certo é que nessas ocasiões eu arriscava muito mais do que nos dias comuns. E vejam que sempre gostei de riscos (não é à toa que fui rico e pobre três vezes, antes de estacionar na classe média), de alavancagens e de mercados exóticos. Já operei feijão vermelho na bolsa de Tóquio, azeite de dendê futuro (não na Bahia, mas na Malásia) e barriga de porco (pork belly) em Chicago.

O auge de minha orgia operacional solitária acontecia no Carnaval. Certa vez, resolvi operar em todos os mercados de moedas, de instrumentos financeiros, de commodities e de índices de ações. Um contrato de marco alemão, um de libra esterlina, um de Treasury Bonds, um de S&P 500, um de ouro, um de prata, um de milho, um de soja e assim por diante. Comprei ou vendi de tudo. Sempre um. Usei como estratégia comprar os que estavam em alta e “shortear” os que estavam em baixa.

E não é que deu certo? Entrei nas posições na segunda-feira e zerei tudo na terça. Com pouquíssimas exceções, os ativos que estavam subindo continuaram subindo e os que caíam permaneceram em baixa. Não ganhei nenhuma fortuna, mas pus no bolso uns quatro ou cinco mil dólares, nada mal para um Carnaval despretensioso. Tudo na física, bem entendido. O risco foi meu, o lucro foi meu. E ninguém soube de nada porque maluquice, esquisitice e outros “ices” têm de ser sigilosos, caso contrário os clientes (eu era broker também) somem.

Um desastre

A brincadeira acabou na segunda-feira de Carnaval de 1994, que caiu em 14 de fevereiro. Nesse dia, o primeiro-ministro japonês Morihiro Hosokawa se encontrou com o presidente Bill Clinton no salão Oval da Casa Branca numa reunião de trabalho. Clinton queria que o governo do Japão forçasse uma desvalorização do iene, tese com a qual Hosokawa não concordava, preferindo o câmbio livre.

Após a reunião os dois chefes de estado participariam de uma coletiva, dando conta de seus acertos, ou desacertos. O mercado futuro de iene, negociado em Chicago, estava num impasse. Se Clinton convencesse o japonês, o iene despencaria. Caso o primeiro-ministro não concordasse com o colega americano, a moeda japonesa faria um novo high de umbull market que já durava anos.

Eu apostei em Clinton, “shorteando” pesadamente o iene. E deu Japão. Nem precisei ler a notícia do resultado da reunião de cúpula. Bastou olhar a tela de cotações e ver o iene disparar feito um foguete. Faltavam poucos minutos para o encerramento do pregão e tive de ser rápido para fazer um stop.

Na brincadeirinha de Carnaval perdi quase 30 mil dólares. Vinte e nove mil e tantos. Dinheiro que, naquela ocasião, me fez muita falta.

Com o desfile de escolas de samba do terceiro grupo rolando lá na av. Presidente Vargas, fui afogar minhas mágoas numa barraquinha, com latas e mais latas de cerveja acompanhadas de shots e mais shots de cachaça. E foi nesse estado de espírito (e de spiritual) que peguei meu carro, uma Parati, para voltar para casa na Barra da Tijuca.

Quem conhece o Rio de Janeiro, sabe que a avenida Niemeyer é uma estrada costeira sinuosa que vai do Leblon a São Conrado. Tem pista simples, com mão e contramão. Uma faixa amarela central deixa claro que as ultrapassagens são proibidas ali.

Havia um carro lento à minha frente e do outro lado vinha um Escort XR3 conversível. Eu calculei que dava para passar e entrei na contramão. Só que, talvez por culpa do Clinton, do Hosokawa, da cerveja, da cachaça, ou mais certamente de minha irresponsabilidade ao volante, o certo é que bati de frente no XR3, novo em folha, no qual vinham quatro mancebos bem nutridos e vestidos de centuriões romanos com as cores da Mocidade Independente de Padre Miguel.

Os garotões eram parrudos, eu já tinha 54 anos e lutar (ainda mais contra quatro ao mesmo tempo) definitivamente não era o meu forte. Para não ser impiedosamente linchado, só me restou recorrer à minha voz da época de operador de pregão.

“Eu sou maluco, mas não sou ladrão”, foram minhas primeiras palavras, trovejantes. “Vou pagar agora, em cheque, o prejuízo que vocês calcularem, seja quanto for (complemento de frase do qual me arrependi). Dou em garantia minha carteira de identidade e meus cartões de crédito.” Uma patrulhinha da PM chegou pouco mais tarde, relevou meu estado etílico e providenciou dois reboques (pagos por mim, é claro).

Bem, não vou terminar esta história com um clichê politicamente correto do tipo: “Se beber, não dirija.”

Prefiro uma dica de trader que já levou muita porrada, embora não física e muito menos de sambista. Não tome decisões só por tomar. Do estilo: “Pra não dizer que não fiz nada”. Na dúvida, fique quieto, ouvindo um cantor gospel sertanejo, se necessário.

E como recado final, deixo uma sugestão inteligente: se você pensa em começar a investir, está começando agora ou até mesmo já começou, mas ainda acumula uma lista de dúvidas sobre o assunto, deixo minha sincera recomendação de que siga a Olivia no novo projeto dela chamado Investidor Completo. Esse vai ser o melhor caminho para você se transformar num investidor bem-sucedido. Veja aqui o vídeo dela.

Fundador do Money Times | Editor
Fundador do Money Times. Antes, foi repórter de O Financista, Editor e colunista de Exame.com, repórter do Brasil Econômico, Invest News e InfoMoney.
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