Ivan Sant’Anna: O desafio de Boris
Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite
Caro leitor,
Tal como era esperado, o exótico político inglês Boris Johnson, ex-prefeito de Londres e ex-ministro das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, foi escolhido para ser o novo líder do Partido Conservador.
Isso significa que ele será o novo primeiro-ministro, em substituição a Theresa May, que renunciou ao cargo em 24 de maio, por não conseguir aprovação do Parlamento para suas tratativas com a Comunidade Europeia a respeito do Brexit.
Johnson entrega hoje suas credenciais à rainha Elizabeth II no Palácio de Buckingham.
De sua parte, a soberana solicita a Boris que forme um novo gabinete.
Tudo como estabelece a tradição.
Como se trata de uma transição de conservador para conservador, boa parte dos ministros permanecerá. Outros, que não aprovam a maneira como Johnson lida com a saída do Reino Unido do bloco europeu (com ou sem acordo com os até então parceiros comerciais do continente), já renunciaram a seus cargos.
Praticamente metade dos britânicos é a favor do Brexit. A outra metade, obviamente, contra. Os dois lados radicalizam em suas manifestações.
Os que abominam o Brexit traçam um cenário de horrores.
A divisa internacional entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda (Eire) se tornará uma fronteira seca, com 500 quilômetros de comprimento e praticamente nenhuma fiscalização aduaneira, entre a Comunidade Europeia (CE) e a nova Grã-Bretanha “independente”.
Na Escócia, a situação é ainda mais complicada. No referendo do Brexit, 62% dos escoceses preferiam continuar na CE, contra 38% que foram contra. Se compararmos este dado com os do plebiscito no qual os eleitores das Highlands votaram contra a independência do Reino Unido (55% a 45%), poderemos chegar à conclusão de que, se houver nova consulta popular, pode ser que a Escócia opte pela independência para permanecer na Comunidade Europeia.
Nesta última hipótese, aos 500 quilômetros de fronteira entre as duas Irlandas temos de acrescentar mais 154 da divisa anglo-escocesa, totalizando uma linha de 654 quilômetros sem controle algum. Ou melhor, de controle que ainda terá de ser implantado.
Como se as complicações acima não bastassem, as empresas inglesas estão acumulando estoques de produtos do continente, que passarão a pagar tarifas aduaneiras tão logo o Brexit se materialize (a data limite é 31 de outubro).
Produtos ingleses custarão mais à leste da Mancha. Em contrapartida, queijos e vinhos franceses, carros alemães, massas italianas, presunto espanhol, etc., terão seus preços majorados na Inglaterra.
“Mas pera aí, Ivan. É só você que sabe disso?”, pode estar perguntando o caro amigo leitor.
Todo mundo sabe. E os fatos já estão embutidos nos preços do mercado.
Ontem, o Dia Zero de Boris, a libra esterlina caiu míseros 0,0031% frente ao dólar. E a Bolsa de Valores de Londres, representada pelo índice FTSE 100, subiu 0,53%.
A Grã-Bretanha é uma monarquia parlamentarista. À primeira mancada de Boris Johnson, o Parlamento tasca-lhe uma moção de desconfiança e lá estará ele de volta ao Palácio de Buckingham, desta vez para devolver suas credenciais à rainha.
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