Ivan Sant’Anna: Lei das estradas
Caro leitor,
Depois de 20 vezes seguidas revisando para baixo a previsão do PIB brasileiro, o boletim Focus divulgado pelo Banco Central nesta segunda-feira estimou um crescimento da economia este ano em 0,82%, contra os 0,81% da previsão anterior.
“Zero vírgula um, Ivan?, pode estar indagando o leitor. “Você não acha este aumento pífio?”
É verdade que não se trata de grande coisa. Mas é importante notar que a série de quedas consecutivas foi quebrada e isso pode significar que atingimos o fundo do poço.
Uma das pautas do noticiário nos últimos dias é a ameaça de outra greve dos caminhoneiros. Motivo: descontentamento com a nova tabela de fretes.
Para evitar a paralisação, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, deve se reunir com lideranças da categoria. Acho que Sua Excelência vai perder seu tempo.
Essa tabela é uma excrescência numa economia liberal. Fretamentos devem ser regidos por uma lei simples, mas volta e meia esquecida pelos brasileiros: a da oferta e da procura.
Estradas, caminhões e caminhoneiros, por sinal, são umas de minhas praias. Além de já ter publicado uma ficção sobre o assunto, Carga Perigosa(Editora Objetiva, 2002), fui roteirista da série Carga Pesada, exibida pela Rede Globo.
Durante 40 dias, em janeiro e fevereiro de 2001, percorri uns 15 mil quilômetros a bordo de uma carreta Scania 112 HV, de propriedade do caminhoneiro José Inácio da Silva, eu, é claro, no banco do carona.
Todo ano, entre janeiro e abril, durante a colheita da safra de grãos, falta caminhão. O frete sobe. Depois, o movimento cai. Os caminhoneiros recebem menos.
Lei da… da oferta e da procura
No quarto trimestre de 2010, no auge do boom das commodities, o PIB brasileiro cresceu 7,5% (em bases anualizadas). Faltou caminhão no pátio das revendedoras. Os caminhoneiros renovaram suas carretas, treminhões (34 rodas) e rodotrens (42).
Cinco anos e meio mais tarde, no segundo trimestre de 2016, a economia encolheu 4,5%. As montadoras de veículos pesados deram férias coletivas. As empresas transportadoras e os motoristas autônomos se lascaram.
O preço do frete, como não podia deixar de ser, acompanhou o sobe e desce. Descendo, é claro! Até que o presidente Michel Temer, sob pressão de uma greve que paralisou o fluxo de cargas no país, instituiu um preço mínimo.
Não funciona.
Se um fretador tem uma carga, e três pretendentes, ele a entrega para o que topar fazer o serviço por menos. Havendo um tabelamento, o motorista selecionado devolve a diferença por fora.
Há outros artifícios. Um deles, que testemunhei pessoalmente, é pagar o frete em vale-combustível. Que só é aceito por uma cadeia de postos de abastecimento que cobra mais caro pelo diesel, para quem os compra com o tal vale, e repassa um rebate para o fretador.
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