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Ivan Sant’Anna: Geleira nos trópicos

10 jul 2019, 14:14 - atualizado em 10 jul 2019, 14:14

Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite

Caro leitor,

Na página 226 de meu livro Os mercadores da noite, edição da Inversa, falo sobre a reação das pessoas a medidas de austeridade impostas pelos líderes das nações ricas para conter uma crise econômica de grande magnitude:

“Os governantes retornaram a seus países para implantar o novo sistema”.

O presidente Michel Dale (dos Estados Unidos) remeteu ao Congresso, para votação em regime de urgência, um severo programa de aumento de impostos e diminuição dos gastos públicos. O Comitê de Mercado Aberto do Banco da Reserva Federal aumentou as taxas de juros para fortalecer o dólar. O Tesouro emitiu duas novas séries de obrigações, uma indexada à cotação do iene japonês e a outra lastreada nas reservas de ouro de Fort Knox

Em Estrasburgo, o Parlamento Europeu recebeu poderes dos países membros da Comunidade Europeia para adotar medidas amargas. Cortou benefícios sociais, aumentou a idade para aposentadorias dos cidadãos (o grifo não existe no original) , elevou os impostos e eliminou subsídios agrícolas.

As decisões não foram bem aceitas. Multidões enfurecidas protestaram nos Champs-Elysées, em Trafalgar Square e nas ruas de Milão, Madri e Frankfurt. Agricultores bloquearam as estradas da França, os tratores invadiram Paris. Um plantador de beterrabas jogou uma bomba no túmulo de Bonaparte, nos Invalides, danificando severamente o mármore vermelho do mausoléu. Em Hamburgo, neonazistas incendiaram uma sinagoga.

Em Moscou, o presidente Aleksei Samusev determinou a aceleração do programa de privatização e mandou reduzir em um quarto os efetivos do exército convencional. O rublo foi desvalorizado em 50%.
Os japoneses e os chineses relutaram, mas acabaram concordando em valorizar o iene e o renminbi e taxar as exportações, a fim de reduzir os superávits comerciais dos dois países.

 “Iniciou-se a depressão econômica.”

O que está acontecendo no Brasil é raríssimo, e talvez inédito, no mundo. Segundo o instituto de pesquisas Datafolha, 47% dos entrevistados são a favor e 43% contra a reforma da Previdência. Ou seja, a maioria topa se sacrificar para salvar o Tesouro.

Poucas coisas poderiam ser tão bullish para a Bolsa e tão bearish para o dólar.

Estou arriscando meu pescoço nesse vaticínio, mas a PEC vai passar fácil.

Mudando completamente de assunto, a CEG, companhia de gás do Rio de Janeiro, está alterando totalmente o sistema de aquecimento d’água das residências.

Já fizeram o serviço aqui, estão cobrando uma fortuna, e ficou uma bosta.

O usuário está debaixo do chuveiro; a água, fervendo, de repente se transforma numa ducha gelada.

Ontem a mínima do Rio foi de 16º. Isso é clima ártico para os cariocas. Eu tomava meu banho quando a fervura se transformou numa geleira.

Resultado: estou com 39º de febre, o que não acontecia há décadas.

É nestas condições que escrevo este texto. Talvez por isso tenha “colado” nele parte de meu livro Os mercadores…

Eu poderia ter pedido à Inversa para abrir mão de minha coluna. Tenho certeza de que não haveria problema. Só que sou viciado em trabalho e compromissos.

Não tive como não me lembrar de um episódio ocorrido em 1971, época em que eu era floor trader na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.

Naquela ocasião, minha temperatura subiu para 41º. Chamei o médico em casa e ele diagnosticou tifo. Mas como tinha diversas ordens de clientes para executar, fui para o pregão.

Cheguei lá parecendo um White Walker de Game of Thrones. Quando revelei minha doença, abriu-se uma roda em torno de mim. Executei minhas ordens rapidinho e voltei para casa.

Não estou aqui sugerindo que os profissionais de mercado trabalhem com tifo ou febre alta.

Só que nós, mercadores, somos assim. Sabemos que a Bolsa e o câmbio não vão ficar parados esperando nossa convalescência.

Todos os dias úteis, na hora marcada, as telas dos monitores vão se iluminar.

Ah, teve uma ocasião em que operei, por telefone, do CTI de um hospital, com o abdômen recém costurado, resultado de uma peritonite.

Só que estourei o espaço deste artigo e isso fica para outra vez.

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Um abraço,

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