Ivan Sant’Anna: Arbitragens lucrativas
Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite
Caro leitor,
Durante muitos anos, assisti a operações de arbitragens no mercado. Inclusive, participei diretamente, ou através de minha corretora, Fator, de várias delas.
Bolsa de Valores do Rio de Janeiro/Bovespa:no fim dos anos 1960 e início dos 1970, a Bolsa do Rio era a mais importante, mas São Paulo já tinha uma liquidez bem razoável. Então, destacamos dois operadores de pregão, um no Rio e outro em SP, para captar e tirar partido de pequenas distorções nos preços.
Digamos que as ações do Banco do Brasil tinham compradores no Rio a 8,18 cruzeiros e vendedores a 8,20. No mesmo instante, em São Paulo, oferecia-se a 8,16, talvez porque houvesse um grande lote à venda por lá.
Os dois floor traders, o carioca e o paulista, fechavam um mesmo lote simultaneamente. Compravam BB a 8,16 na Bovespa e vendiam no Rio a R$ 8,18.
Isso contribuía para equilibrar o mercado e nos dava um lucrinho já que, como corretora, não pagávamos corretagem, apenas emolumentos. Após a queda de meados de 1971, e a perda de liquidez nas duas bolsas, essa boquinha acabou.
Luxemburgo/Rio de Janeiro: as ações da Cia. Siderúrgica Belgo Mineira eram negociadas nas bolsas do Rio e de Luxemburgo, sendo aqui em cruzeiros e lá em francos luxemburgueses. Às vezes, havia grandes diferenças de preços.
Era preciso considerar o câmbio, o tempo que se levava para completar a transação e as despesas de viagem. A liquidação, tanto lá como cá, se dava através de cautelas contra cheques.
Fizemos essa operação umas dez vezes, ganhando numas oito e perdendo em duas. Mas deu uma boa graninha de lucro. Depois, outros concorrentes descobriram o trade, os spreads se encolheram e já não valia mais a pena.
Deutsche Mark/Ostmark: Ostmark era a moeda da Alemanha Oriental, Deutsche Mark (marco alemão), a da Ocidental. No câmbio oficial da República Democrática Alemã, do leste, a cotação era um por um.
No câmbio negro da parte oriental, a cotação era de aproximadamente 10 por 1, já que havia risco de o cambista ser preso pela temível Stasi, uma versão comunista da Gestapo. No lado ocidental de Berlim, as transações eram livres e a cotação, cinco por um.
Alemão não podia atravessar da parte Oriental para a Ocidental, já que havia o Muro de Berlim. Mas estrangeiros, inclusive nós, brasileiros, passavam à vontade através do Checkpoint Charlie.
Como os lotes que conseguíamos eram limitados, a arbitragem através da chamada Cortina de Ferro valia mais pela aventura, e pela sensação de estarmos protagonizando um filme de espionagem, do que pelos lucros, irrisórios, fora o custo da passagem aérea do Brasil até lá.
Brent/WTI: como todo mundo sabe, no mercado futuro de Londres negocia-se o petróleo Brent. Em Nova York, o tipo WTI (Western Texas Intermediate). Por causa de especificações químicas, o Brent tem melhor cotação, numa diferença que varia entre US$ 2,50 e US$ 4,00.
Quando esse spread passa de US$ 4,00, vale a pena ficar comprado em WTI e vendido em Brent. Se desce abaixo de US$ 2,50, faz-se o contrário. Esse trade é uma arbitragem quase infalível.
S&P500/Nasdaq: O Standard & Poor’s 500 compreende, tal como diz o nome, 500 ações de todos os tipos. Já o Nasdaq reúne 2.800 companhias, a maior parte da área de tecnologia e informática.
Por ocasião da bolha das ponto com (1994/2000), foi uma arbitragem excepcional ficar comprado no Nasdaq e vendido no S&P. Quando a bolha estourou, a partir de março de 2000, o spread contrário enriqueceu os traders que atuavam no sentido inverso.
Há diversos outros exemplos de arbitragens que podem ser lucrativas. Entre elas, operar cacau ou cobre em libras esterlinas no mercado de Londres, contra essas duas mesmas commodities, em dólares, na C. S. C. E. e na Nymex em Nova York.
Hoje em dia, com a rapidez das comunicações, e trades online, essas arbitragens são mais difíceis, embora não impossíveis. Logo, robôs serão programados para aproveitar distorções por menores que sejam.