Economia

‘Um balde de água fria’: Como as políticas de Trump podem impactar a economia do Brasil?

20 jan 2025, 7:30 - atualizado em 20 jan 2025, 8:55
donald trump eua Brasil economia
(Imagem: REUTERS/Brendan Mcdermid)

As potenciais políticas de Donald Trump nos Estados Unidos (EUA) podem resultar em câmbio mais elevado, Selic alta por um período prolongado, pressão inflacionária e redução do saldo da balança comercial no Brasil, afirma a economista do Insper, Juliana Inhasz. Trump toma posse como presidente do país nesta segunda-feira (20).

“Temos um caminho inegável de inflação mais alta durante esse ano”, disse em entrevista ao Money Times.

De acordo com Inhasz, medidas protecionistas e renúncias fiscais nos EUA podem fortalecer o dólar e pressionar os juros brasileiros, enquanto a desglobalização representa um desafio crescente para o Brasil.

Além disso, sanções comerciais aplicadas à China, por exemplo, podem abrir pequenas oportunidades para o Brasil, mas a capacidade produtiva limitada do país impede que os benefícios sejam significativos.

Veja os destaques da entrevista com a economista do Insper

Money Times: Durante a campanha, Trump apresentou diversas propostas. Você acredita que ele vai seguir com elas ou haverá uma moderação ao longo do mandato?

Juliana Inhasz: O Trump é uma figura, em alguns aspectos, muito controversa. É provável que ele siga com boa parte das políticas, mas talvez não todas, porque ele vai precisar de apoio no Congresso.

Mas ele também tem um objetivo claro de concluir o mandato. Por isso, talvez algumas coisas mais radicais sejam amenizadas. Mas boa parte das políticas deve sair, sim.

Money Times: Como as políticas de Trump podem impactar o Brasil?

Inhasz: Acho que temos impactos diretos e indiretos. Diretamente, a política de restringir importações de outros países pode nos atingir. Medidas como sobretaxas e dificuldades para a entrada de mercadorias de outros países serão um balde de água fria, pois exportamos muito para eles. Mesmo com o real desvalorizado, que torna nossos produtos muito baratos e competitivos, a sobretaxa reduz essa atratividade. Isso pode levar a uma queda nas exportações, piorando a balança comercial e reduzindo a entrada de dólares, o que pressiona o câmbio.

Indiretamente, políticas inflacionárias também dele impactam o Brasil. Com a renúncia fiscal nos EUA, há um aumento de inflação por lá, juros altos e fortalecimento do dólar. Isso pode causar saída de recursos do Brasil e dificultar a redução dos juros por aqui, mesmo que façamos tudo certo no âmbito doméstico.

Money Times: Nesse cenário, como a inflação brasileira deve se comportar?

Inhasz: Apenas com o efeito direto de Trump, teríamos pressão inflacionária maior, pois os produtos importados ficam mais caros. Isso aumenta o custo de vida, dado que importamos muitos produtos.

Por outro lado, juros mais altos desestimulam o consumo, o que poderia conter a inflação. No entanto, como a economia brasileira está aquecida, mesmo com juros elevados, a demanda não tem caído tanto. Minha percepção é de que teremos uma inflação mais alta, especialmente considerando outros fatores, como La Niña, reajustes de combustíveis e reforma tributária. Temos um caminho inegável de inflação mais alta durante esse ano.

Money Times: O câmbio pode chegar a patamares ainda maiores que os atuais?

Inhasz: O câmbio é muito volátil, influenciado tanto por fatores internos quanto externos. Hoje, parece que o patamar de R$ 6, ou pouco mais, deve se manter. No entanto, qualquer conflito — seja guerra, tensão com a China ou incógnitas sobre BRICS — pode levar a especulações que elevem o dólar.

Este ano, teremos incertezas nos EUA, com o novo mandato de Trump, e no Brasil, com o cenário eleitoral. Isso pode gerar oscilações cambiais ao longo de 2024.

Money Times: O que esperar da Selic se os juros, de fato, se mantiverem mais juros altos nos EUA?

Inhasz: A taxa de juros brasileira deve ficar mais alta. Mesmo que hoje o governo consiga fazer tudo o que precisa ser feito na economia doméstica para garantir estabilidade fiscal, o fato de os juros lá fora estarem mais elevados fará com que os investidores entendam que é mais vantajoso colocar o dinheiro lá do que aqui. Juros americanos mais altos significam perda de competitividade dos títulos brasileiros.

Quando analisamos o cenário interno, onde as coisas também não vão muito bem, a conclusão é de que os juros aqui talvez precisem permanecer mais altos do que estão atualmente. Na verdade, já sabemos que há dois aumentos de 1 ponto percentual contratados. O mercado, inclusive, projeta aumentos ainda maiores, e já estima que podemos fechar o ano com a Selic em 15%

Money Times: Existe alguma chance de o Brasil se beneficiar de sanções ou tarifas aplicadas pelos EUA à China?

Inhasz: O Brasil pode se beneficiar em alguns aspectos. Se houver guerras comerciais ou sanções contra a China, o Brasil talvez consiga preencher parte do mercado deixado por eles. No entanto, nossos principais produtos exportados para os EUA — soja, milho, carne bovina, minério — não têm uma grande produção ou sobra. O investimento no Brasil tem sido muito baixo nas últimas décadas e nossa capacidade produtiva cresceu pouco em relação ao resto do mundo. Qualquer benefício será pontual e pequeno.

Para que conseguíssemos aproveitar qualquer espaço deixado nessa história, teríamos que ter produção sobressalente. Não é o que acontece hoje.

Money Times: O Brasil está preparado para os movimentos de desglobalização?

Inhasz: Teremos que nos adaptar como todos os outros. O Brasil se beneficiou de um ambiente mais globalizado em alguns aspectos, mas agora enfrentamos um movimento de fechamento de portas por parte de grandes economias. Isso trará desafios, mas também oportunidades para países abertos à cooperação. Se estivermos formos espertos, podemos aproveitar essas chances ao longo do tempo.

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Editora-assistente
Editora-assistente no Money Times e graduada em Jornalismo pela Unesp - Universidade Estadual Paulista. Entrou para a área de finanças e investimentos em 2021.
giovana.leal@moneytimes.com.br
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Editora-assistente no Money Times e graduada em Jornalismo pela Unesp - Universidade Estadual Paulista. Entrou para a área de finanças e investimentos em 2021.
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