Inflação mundial alta domina e faz gestores de fundos multimercados serem cautelosos e defensivos
A inflação alta e persistente no mundo, principalmente nos Estados Unidos e Europa, onde esse cenário não é normal, faz com que gestores de fundos multimercados adotem muita cautela em seus portfólios e tomem posições defensivas em suas carteiras em um momento em que existe até mesmo dificuldades em antecipar cenários de médio e longo prazos.
Esse foi o tom do bate-papo conduzido pelo analista de fundos da Empiricus Bruno Mérola com Bruno Cordeiro, da Kapitalo Investimentos; Felipe Guerra, da Legacy Capital, e Damont Carvalho, da Claritas Investimentos, no painel sobre fundos multimercados da Semana de Fundos de Investimento Vitreo, que até sexta-feira desta semana apresenta uma programação com painéis exclusivos com os melhores gestores do país.
“O mundo desenvolvido trabalha com uma inflação muito longe da meta e com uma taxa de desemprego muito baixa, principalmente nos Estados Unidos e Inglaterra. A gente não teve esse cenário nos últimos 20 anos”, afirma Felipe Guerra, que considera haver risco de queda de desempenho de quase todas as classes de ativos. “Por estar no Brasil, a gente sabe como é custoso trazer a inflação para a meta”, acrescenta.
“Não dá para ser herói agora. O cenário é bem desafiador”, resume de forma bastante direta Bruno Cordeiro. De acordo com o gestor responsável pelo fundo Kapitalo K10, esse cenário também obriga a ter horizontes de investimentos mais curtos, entre 6 e 12 meses.
“A guerra no longo prazo é inflacionária e o médio prazo é mais desafiador para países emergentes”, aponta Damont Carvalho. E para o Brasil, o gestor da Claritas considera que as eleições ainda podem gerar mais prêmio no risco do país. Ele se diz surpreso com a previsão de o Banco Central interromper o ciclo de aumento da Selic, pois acredita que deveria ter, pelo menos, mais uma alta. “Teria espaço por conta dessa inflação corrente”.
Alta de juros no mundo
Se no Brasil e em outros países emergentes o movimento de alta de juros começou mais cedo, os gestores de Kapitalo, Legacy e Claritas afirmam que Estados Unidos e Europa também vão usar desse expediente para tentar segurar e baixar a inflação, que está em níveis jamais vistos por várias gerações desses países.
“A Europa deve ser o primeiro lugar a entrar em estagflação. E a gente acha que os Estados Unidos vão subir mesmo seus juros não na próxima, mas na reunião seguinte. E aí abre uma avenida para que outros também puxem seus juros como União Europeia, Austrália, Inglaterra, entre outros”, afirma Felipe Guerra. Para ele, um cenário global de inflação muito alta, aperto monetário e crescimento menor da economia chinesa torna o ambiente hostil para países emergentes.
Defesa em commodities (algumas)
Na estratégia de cautela, Bruno Cordeiro, da Kapitalo, mira também um portfólio com commodities em suas carteiras, porém, analisa os produtos de forma separada, principalmente, em energia, metais e agrícolas. “Tem um desequilíbrio de oferta e demanda de commodities muito forte. Gostamos de petróleo. E estamos comprados em agrícolas, principalmente, soja, pois avaliamos que vai faltar oferta do produto no mundo”.
“As commodities ainda têm demanda crescente e oferta limitada”, diz Felipe Guerra, em análise que também é compartilhada por Damont Carvalho: “o cenário de commodities é para cima”.
O gestor da Legacy Capital, inclusive, revelou que estão com posições compradas em ouro na carteira, por entender que há uma discussão global sobre o dólar ser ainda usado como moeda de reserva, no momento em que a Rússia tinha suas economias em moeda americana e agora não tem acesso a elas.
Legacy vendida em bolsas
“Acho que vamos ter perdas em todos os bonds e bolsas”, afirma Felipe Guerra. Segundo ele, a Legacy está trabalhando esse ano com uma visão mais cautelosa com ativos de risco. O gestor revelou que estão vendidos em diversas bolsas.
“Esse ambiente é para evitar bolsa. Ficar vendido em bolsa e em dólar tem funcionado bem. Ainda vejo saídas contínuas de bolsa”, avalia Guerra.
Já o gestor da Claritas é menos enfático sobre o cenário negativo de bolsa, mas não deixa de avaliar que haverá ajustes. “Não vejo uma tendência de queda da bolsa americana. Vejo uma tendência de correção”.
Brasil eleitoral: tendência ao centro
Os gestores de Kapitalo, Legacy e Claritas acreditam que o cenário de disputa eleitoral no Brasil está quase definido entre Luís Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro. Nesse sentido, o trabalho está em colher informações, que ainda não estariam claras, para quais rumos tomariam um governo de esquerda ou de direita. Porém, eles consideram que seja quem for o vencedor, terá de caminhar mais para o centro.
“Vemos agora que ambos os lados terão que ir mais para o centro. O momento é saber qual a política econômica dos eventuais governos”, afirma Damont Carvalho.
Bruno Cordeiro também aguarda para saber mais sobre como seriam as equipes econômicas e propostas de governos dos dois candidatos mais bem posicionados nas pesquisas. Porém, ele já aponta para desafios grandes. “A discussão fiscal no Brasil é muito dura”.
E no cenário brasileiro de inflação e juros altos, Felipe Guerra prevê tempos difíceis para o PIB ainda este ano. “O processo desinflacionário no Brasil é extremamente lento e custoso. Vai levar a economia para uma recessão no ano que vem ou até mesmo no fim deste ano”, diz o gestor da Legacy, apontando uma inflação de 7,5% em 2022 e de 5% para o ano que vem.
*Reportagem de Fernando Antunes
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